Budismo V – As Quatro Nobres Verdades. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 1 de julho de 2012 por

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Como vimos no último artigo, o Senhor Buda, após atingir o Nirvana, devido à grande compaixão que sentia por todos os seres vivos, passou a ensinar a um grupo de discípulos o Caminho espiritual que trilhara para sua própria iluminação. Na busca por sistematizar esse caminho, cunhou o conceito das Quatro Nobres Verdades, às quais se admite para iniciar o Caminho.

A Primeira Nobre Verdade, é a “Verdade da Existência do Sofrimento” Ou seja, a admissão de que esse mundo é Imperfeito, Impessoal e Impermanente. Por mais que tenhamos uma boa situação de vida, estamos sempre sujeitos às mudanças e ao sofrimento. O próprio princípio dos “três maiores males da humanidade”(velhice, doença e morte) comprovam esse fato.

A Segunda Nobre Verdade, é a “Da Origem do Sofrimento”. Para o Budismo, uma vez que percebemos a imperfeição desse mundo, passamos a desejar profundamente fugir ao sofrimento. Ora, é exatamente esse desejo, que se manifesta de milhares de formas diferentes (busca desenfreada do prazer, busca do acúmulo de bens materiais, fuga de fatos que nos incomodam etc.) que faz com que o nosso sofrimento aumente.  Em outras palavras, quanto mais nos esforçamos para preservar uma vida que consideramos “boa”,  ou “agradável”, mais sofremos.  Mas o que é uma “boa vida”? O que é uma “existência agradável”? Seria ter muito dinheiro? Porém, mesmo o homem mais rico da face da terra não escapará da morte e da doença, e nem mesmo de tragédias pessoais e familiares, como as vezes vemos na vida de pessoas muito ricas e famosas. Logo, o nosso desejo de uma boa vida é errôneo, porque o que desejamos são exatamente coisas mutáveis, que se transformam o tempo todo. Os anos passam, a vida passa, as pessoas envelhecem, adoecem, morrem. As amizades começam e se acabam. Enfim, nada é perfeito ou permanente. Mas se desejamos com todo ardor que essas coisas sejam permanentes e perfeitas aqui, estaremos sofrendo mais, pois estaremos somando ao sofrimento concreto, o sofrimento psicológico profundo. E essa soma traz males muito maiores. Se, ao contrário, formos capazes de renunciar ao apego e aceitar a imperfeição do mundo, sem desejar que ele seja o que nós queremos que seja mas aceitá-lo como ele é,  então a nossa carga de sofrimento diminui imensamente. Esse é o fundamento da “Terceira Nobre Verdade”

“A Verdade da Extinção do Sofrimento”, também conhecida como a Terceira Nobre Verdade, nos aponta para o fim do sofrimento pelo fim do apego, do desejo. Se formos, como foi dito acima, capazes de nos livrarmos dos apegos desse mundo, inclusive do apego à própria vida aqui, então estaremos começando a erradicar a dor de nossas vidas.  A primeira vista, essa parece ser uma forma descabida de parar de sofrer, pois parece significar também abdicar do prazer, da alegria e mesmo da própria vida. Porém, o Senhor Buda observa que não é bem assim. Se nos livramos do desejo, do apego, então passamos viver realmente, livre das ansiedades e inseguranças. Nossa vida se torna profundamente serena e podemos realmente perceber o milagre que é estar vivo.

Para o leitor, tudo isso pode parecer muito contraditório. Mas, pensemos quantas vezes realmente aproveitamos um belo dia de sol, um pequeno prazer (ou até mesmo um grande), uma companhia agradável e tantos outros fatos bons da existência? Via de regra, não aproveitamos bem nada disso. Não aproveitamos, por exemplo,  nada do “milagre” de sentir o cheiro da terra depois de uma chuva. E por quê? Porque nossas mentes estão ocupadas demais com o “ontem” e o “amanhã”. Estamos por demais atarefados ganhando dinheiro ou prestígio e poder, para vermos um pôr do sol. Estamos muito cansados, ao fim de um dia de trabalho e preocupações, para brincarmos com nossos filhos, conversarmos com nossas famílias e amigos. Estamos preocupados demais com a morte para podermos viver…

Se, porém, deixarmos de lado os apegos e os desejos impossíveis, então poderemos perceber todas essas coisas que não vivemos realmente. E daí o sofrimento começa a desaparecer e a dar lugar a grande alegria de estar vivo. Sem, porém, nos apegarmos demais a essa vida, temendo a morte. Ela chegará para todos, é inevitável, mas, como foi dito por um grande filósofo (não budista, por sinal) “O medo da morte não nos impede de morrer. Nos impede de viver”. O desapego significa perder este medo, e, em conseqüência, vivermos de verdade.

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