Quando eu lecionava História para o ensino médio, ao explicar a ascensão do nazismo e do fascismo nas décadas de 1920 a 1930, fazia um exercício de imaginação com eles. Escolhia alguns alunos e pedia que eles se colocassem no lugar dos italianos e alemães depois da primeira guerra mundial. Os primeiros não receberam nada do quinhão dos espólios do Tratado de Versalhes e os segundos pagaram um alto preço econômico e territorial pela derrota.
Ambos os “personagens” estavam desempregados, como de fato boa parte da população daqueles países na época e sentiam-se injustiçados pelas circunstâncias.
Então, insistindo para que eles mentalizassem a cena, eu perguntava como eles se sentiriam se vivessem na época. Todos diziam que estariam desanimados, deprimidos e revoltados.
Daí eu “apresentava” o discurso dos fascistas e nazistas. O discurso de que o povo, que sentia-se mal e estava na pobreza, não era culpado pela sua situação. Que, ao contrário, eles eram “racialmente puros” e superiores (os alemães) e também herdeiros de um grande império, o Império Romano (no caso dos italianos) e do Sacro Império Romano Germânico (alemães).
Eu mostrava como o fascismo e o nazismo prometiam sua valorização, sua elevação e um futuro brilhante dada a sua superioridade que seria resgatada através da ordem, da disciplina e da violência que eliminaria os “inferiores” que agora os oprimiam.
Mostrava ainda a estética daqueles partidos, baseada no resgate e na reinterpretação de símbolos tais como a cruz suástica, o feixe de lictor, a águia romana e até runas nórdicas e chifres de touro (todos símbolos de força e superioridade). Mostrava como os militantes fardados pareciam representar força, ordem, disciplina e beleza em suas insígnias e agrupamentos. Mostrava coo isso resgatava a ideia de força, beleza e auto estima para quem estava fraco, deprimido e sentindo-se excluído.
Claro, eu explicava também o grande engano que isso representou e a catástrofe mundial que causou. E assim, penso eu, conseguia explicar uma parte dos motivos da ascensão dos partidos totalitários. Um parte, é lógico, uma vez que haviam outros motivos que eu também explicava.
No último dia 22 de outubro, um jovem invadiu armado a escola na qual estudava e matou uma colega além de ferir outras duas. Foi o décimo primeiro ataque deste tipo somente em 2023.
E esse jovem se considerava um nazista.
Chegou a fazer uma suástica na pele com lâminas de barbear para provar sua adesão a outros jovens que também se acreditam nazistas em fóruns da internet.
Claro que existem muitos motivos para que esse jovem, os outros e também aqueles que estão ocultos na net, se identifiquem com esse tipo de ideologia.
E cada motivo tem sua explicação particular e social, principalmente em uma sociedade de extrema competitividade, exclusão e mudanças contínuas e rápidas. Mas todos eles tem uma coisa em comum.
Todos e todas se sentem fracos, humilhados, rejeitados e injustiçados. Todos e todas se sentem perdidos e buscam por um grupo, em particular um grupo que lhes garanta que eles não são os fracassados redundantes que se sentem.
E então encontram em uma ideologia que mal conhecem, uma ideia de força, de resgate e auto estima que não encontram fora deles. Encontram uma forma de extravasar sua frustração através da violência que também sofrem.
Não, eu não estou defendendo incondicionalmente estes jovens e nem minimizando seus atos, assim como não faço isso com o nazismo e o fascismo. Eu estou tentando entender o fenômeno para que o combatamos de uma forma mais eficiente, antes que, da mesma maneira que no passado, a catástrofe se espalhe.
Eu estou afirmando que, caso não consigamos atender os jovens que estão, cada vez mais inseguros e fragilizados, eles serão seduzidos pela violência e pela estética da força e união que, ao contrário do que eles pensam, vai transformá-los em assassinos e ceifar mais vidas.
PS: se você achou que esse artigo trouxe uma boa reflexão, pode fazer uma contribuição para o autor pela chave pix lfamst@uol.com.br
Se tiver interesse em desenvolver um trabalho de prevenção junto as escolas, pode me contatar pelo mail que é o mesmo da chave do pix. E, claro, pode apenas compartilhar o artigo.
Muito obrigado.
Amstalden



Anônimo
26 de outubro de 2023
Excelente e forte análise, caro Professor, como são todas as suas postagens que nos levam a reflexões sobre tantos assuntos que permeiam nossos dias! Grande abraço e obrigada!
blogdoamstalden
26 de outubro de 2023
Eu agradeço e Espero ser digno de um compartilhamento do texto