A história do Padre Cícero Romão Batista (1844-1934)
Padre, político, proprietário e místico do Crato, interior do Ceará. Cícero é uma figura “sui generis”, protagonizou um período importantíssimo da História nordestina e brasileira.
Órfão,estudou no seminário graças ao apoio de um grande coronel. Trazia aspectos de fé sertaneja ao ser inserido no ambiente rígido e dogmático do seminário de Fortaleza que seguia a risca a ortodoxia do Concílio de Trento. Esta situação gerou estranhamento e conflito com superiores num prenúncio do que viria. Ordenado, Cícero acaba por se estabelecer no distrito de Juazeiro e realiza uma pastoral severa mas atenciosa para com as necessidades do povo. Aceita e de certa forma incorpora a figura dos beatos – leigos que orientavam a vida religiosa no sertão na ausência de Padres. Estes chegaram a ser praticamente institucionalizados (à revelia da Igreja) pelo Padre Ibirapina. É cercado de pessoas assim que começa a vivenciar os supostos milagres entre suas beatas, uma das quais além de transes místicos estigmatiza, sangra e transmuta hóstias em sangue.
A partir daí ocorrem dois fatos distintos. De um lado Cícero cria uma legião infinda de seguidores/admiradores. Do outro lado, entra em choque com a hierarquia da Igreja que acabará por excomungá-lo.
Em meio ao conflito com a Igreja, os “milagres” e fenômenos cessam. Mas Cícero é apoiado por um aventureiro de pouco escrúpulo – Floro Bartolomeu – médico baiano, e se envereda por caminhos políticos. Prefeito de Juazeiro, Vice-Presidente do Estado e Deputado Federal, Cícero articula e conjuga sertanejos e coronéis, jagunços e beatos, criminosos e honestos. Trata os sertanejos de maneira afável, o que lhe garante apoio e popularidade, mas usa este apoio no jogo político conservador etilista. Acumula propriedades recebendo donativos de romeiros, mas também instala desvalidos em casas, asilos e terras.
Apoia-se e é apoiado por Floro Bartolomeu, ajuda Pinheiro Machado (Senador mandatário da República do Governo de Floriano Peixoto) a derrubar o Governador do Ceará, Franco Rabelo que se opunha a Pinheiro. Homens (jagunços, “cabras” e beatos) são armados por Floro e Cícero e vão em direção à Fortaleza, matando, roubando e estuprando.
Enfim o sacerdote apoiava a guerra, fazia politicagem, tolerava roubos e ao mesmo tempo atendia a pobres distribuindo bênçãos e consolos, além de ajudas materiais. Uma figura ímpar misto de crente e pragmático, ambicioso e abnegado. Típico de uma sociedade que não confronta o poder, a opressão e mistifica o sofrimento aceitando a ordem social injusta e recorrendo a expediente de compra e tráfico de influência, ligações familiares e nepotismo, além de uma “flexibilidade” de conceitos e comportamentos que remete ao “jeitinho brasileiro”. A aceitação/transgressão oportunista das regras que caracteriza a vida e a época de Cícero é ainda marca registrada do Brasil. Se você quer entender o nosso povo e sua relação com o poder, a política e a religião, este é um livro fundamental.
História, Religião, Sociologia.
Recomendadíssimo.
Maria Virgínia da Penha Rizzo takeyama
8 de maio de 2012
Muito interessante estes comentários.Até fiquei interessada em ler o livro, pois a idéia que se tem do padre Cícero é bem diferente do que se vislumbra ao ler este resumo.O lado psicológico e espiritual do povo sertanejo devem pontilhar a redação do livro e isso é algo que muito me atrai.Obrigada por compartilhar coisas assim bacanas e parabéns pela iniciativa.
blogdoamstalden
8 de maio de 2012
Olá Virginia. Que bom que gostou. O livro é, ao meu ver, excelente. Vale a pena a leitura. A mediação da vida de Cícero com a cultura brasileira é minha interpretação e creio que é real. Mas a obra é muito mais rica. Um aspecto interessante é a excomunhão de Cícero e atualmente a tendência da Igreja em reabilitá-lo. Motivo: o crescimento das Igrejas Evangélicas no Brasil. Obrigado pelo seu comentário e pelo seu acesso. Por favor, fique a vontade para sugerir, criticar, comentar, “pensar e existir”. Abraços.
Antônio Celso Sturion
15 de maio de 2012
Acho que você esqueceu de abordar a farta distribuição de DNA que o Padre Cícero fez.
blogdoamstalden
15 de maio de 2012
Bem, disso o Lira Neto não fala… Só de adoções… rsrsrsrsr Por isso não citei.
Abraço e obrigado por comentar.
Wilson Nunes (@WilsonNunes5)
27 de abril de 2013
Acabei de lê-lo, muito interessante! Um grande livro de história, onde se pode compreender a relação de Padre Cícero com o Padre Ibiapina, Antonio Conselheiro, Lampião e os coronéis do sertão do Cariri, dentre outros aspectos.
blogdoamstalden
1 de maio de 2013
De fato é incrível o livro, Wilson, tomara que mais gente se anime a ler. Abs.