Desde o lançamento de “Chandelier”, carro-chefe do álbum “1000 Forms of Fear”, Sia tornou-se um ícone controverso da música pop ao se limitar a apresentar-se de costas, ou com sua face oculta por alguma coisa (como um véu ou até uma peruca com franja exagerada). Sia fez de seu inconfundível cabelo chanel louro a sua marca e, mais além, assumiu uma “persona”: a menina que usa semelhante peruca – a dançarina-mirim Maddie Ziegler, de apenas 12 anos, que dá “cara” aos videoclipes e apresentações da excêntrica cantora e compositora.
Após inventar e reinventar mil formas de medo, ops, de apresentar Chandelier ao público, Sia seguiu com a divulgação de seu álbum. Obcecada pela ideia de ser coadjuvante em seu próprio espetáculo, Lançou o single “Elastic Heart”, canção já conhecida pelo público, visto que, no ano passado, fez parte de trilha sonora de “Jogos Vorazes: Em Chamas”. Na época, foi (pouco) divulgado um vídeo, dirigido pela própria cantora, que mostrava, com um conceito artístico, o fim de um relacionamento, e terminava de forma nada convencional, com o rapaz e a moça em uma conexão à distância, levantando seu dedo médio aos céus.
Porém, até mesmo depois de ver aqueles dedos médios, simplesmente parei de respirar ao assistir a produção apresentada como “videoclipe oficial”, exatamente no dia do meu aniversário. Não me envergonho em dizer que, ainda que a própria Sai jamais saiba disso, esse foi, sim, um presente pra mim. Infelizmente, muitas pessoas não se sentiram assim. E não digo que seja pelo fato de não estarem fazendo aniversário, mas sim porque elas ficaram absurdamente chocadas.
A polêmica se deu pelo fato de a jovem Maddie Ziegler contracenar com o ator Shia LaBeouf (“Paranoia”, “Transformers”), ambos com roupa cor de pele, o que dava a impressão de estarem nus. As redes sociais logo mostraram a que vieram, e instantaneamente brotaram mensagens de repúdio a Sia, acusada da fazer menção à pedofilia. A cantora prontamente se defendeu, comunicando através do Twitter o que as mentes paranoicas não souberam entender: não havia um romance sendo narrado. Sim, havia uma relação de amor e ódio, mas entre os dois lados de uma mesma pessoa – ou seja, uma batalha travada, talvez, no interior da própria Sia.
Toda a celeuma em torno de uma concepção artística tão profunda, ainda que perturbadora, nos leva a pensar na maneira como vemos – e criamos – as nossas crianças. Será que uma dança entre uma menina e um homem deveria, aos nossos olhos, parecer mais chocante do que uma criança de oito ou nove anos tirando uma selfie para compartilhar em seu próprio perfil do Facebook?
Sim, as mesmas pessoas que banalizam a arte a e fazem parecer um atentado à moral, são as que acham normal que seu filho recém-alfabetizado (?) tenha o seu primeiro celular, e, consequentemente, um espaço no Facebook para chamar de seu. Claro, afinal é sempre útil numa emergência, não é? E dificilmente vai ter um adulto por perto para ajudar. Falando nisso, pulei aqui uma etapa da inclusão digital das crianças. Hoje, elas já nascem on line, visto que o bebê, ao nascer, já dá as caras nas fotos do perfil de seus pais. Não sou paranoico a ponto de ver nisso um problema. O que me preocupa é que a “emancipação digital” das crianças – aquele momento em que elas abrem seus próprios perfis nas redes-sociais e os pais deixam de controlá-lo – ocorre cada vez mais prematuramente.
Os pais acham fofo quando sua menina de nove anos compartilha fotos com roupas e maquiagem de mulher adulta. Não veem que sua imagem pode estar exposta a indivíduos de mentes doentias, além de a própria criança estar exposta a um sem número de conteúdos e informações, parte deles de caráter questionável (sobretudo em ums rede social). Os pequenos não estão preparados para absorver tudo o que se encontra ali, tampouco estão em condições de se defender de atos mal intencionados, ainda que virtuais.
A diferença entre o videoclipe de “Elastic Heart” e a presença das crianças nas redes sociais é que, na primeira, temos a mais pura arte, e o contato com ela não representa perigo algum. Na segunda, porém, os riscos são imensuráveis, e a esse ritmo, tudo o que podemos esperar em um futuro próximo é que nossas crianças percam de vez o pouco da inocência que lhes resta, e se tornem mais selvagens que Meddie Ziegler no vídeo antológico de Sia.
Não seria cedo demais para deixarmos as gaiolas abertas?
Nascido em Piracicaba, amador na arte da escrita, artes gráficas e fotografia.
Autor do livro “A Águia Dos Ventos: O Leão Do Mirante”. Produziu a arte de cartazes para campanhas da Prefeitura de Piracicaba. Suas fotografias ganharam a exposição temática “É Uma Límgua Portugueza, Concertesa”, mostra paralela do Salão Internacional de Humor de Piracicaba em 2010. Selecionado para a edição de 2014 do Salão.
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“É Uma Límgua Portugueza, Concertesa” no Facebook: www.facebook.com/limguaportugueza
Augusto Sousa
26 de fevereiro de 2015
Que bom ter de volta esses artigos.
Como diz acima, duvide.. pense.
Abraços