Corrupção: somos vítimas ou cúmplices? Por Gleison Luiz Zambon

Posted on 23 de março de 2015 por

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O Brasil sofre há décadas, talvez há séculos, de problemas crônicos, muitos dos quais vão além da vontade dos gestores. Temos a fama de ter o “jeitinho brasileiro”, de aplicar a “lei de Gerson”, ou seja, de levar vantagem em tudo, de usar e abusar da nossa “malandragem”. E grande parte da população se encaixa nestas condições. Furar fila, dar carteirada, subornar, não devolver o troco a mais, sonegar impostos, trabalhar sem registro para receber o “seguro desemprego”, e por aí vai. E isso vale, é lógico, para a grande massa de pseudo-indignados. E grande parte dos políticos, como representantes da sociedade, carregam estas mesmas características, pois são apenas uma “amostragem” do que são seus eleitores – lembrando que políticos são eleitos pelo povo, não são como vírus ou outros micro-organismos que se reproduzem independentemente da nossa vontade.

Por outro lado, sabemos que assim como pessoas justas e honestas, existem também políticos honestos, honrados, comprometidos com o interesse público e com a legalidade. Mas infelizmente estes são pouco reconhecidos, e sempre jogados na vala comum dos canalhas, por falta de conhecimento, manipulação da mídia, enfim pela ignorância.

Assim, acredito que não veremos qualquer mudança tão cedo, pois o maior problema, na minha opinião, é cultural. Isso vale tanto para a falta de caráter quanto para a falta de conhecimento e de um envolvimento maior quando se fala da “res pública”. Infelizmente a ideia de uma política suja tem afastado muitos eleitores dos debates sobre o tema (tudo que os déspotas populistas e oportunistas querem). E não é só isso, a grande maioria o faz por puro descaso mesmo. Trata-se o estado em “terceira pessoa – ele, o estado”, quando, na minha opinião deveria ser na “primeira pessoa – nós, o estado”, uma vez que os eleitos são pessoas escolhidas por nós como nossos representantes, pagos com o nosso dinheiro, para tratar de assuntos de nosso interesse e administrar o nosso patrimônio – o erário.

Acredito, assim, em uma série de medidas necessárias para ao menos se iniciar um processo que possa desencadear, ainda que para as gerações futuras, as melhorias que almejamos, tais como a reforma política, porém ela teria que ser feita pelo atual poder legislativo. Portanto, duvido que os deputados e senadores que aí estão votariam favoráveis a propostas que julgo importantes, mas contrários aos seus interesses, como o fim do financiamento privado de campanha e o limite das reeleições, entre outros. Outro ponto importante a ser abordado é a regulação da mídia, pois sabemos do poder e influência dos meios de comunicação, financiados pela iniciativa privada e pouco ou nada comprometidos com a verdade e o interesse público, e às vezes nem com a legalidade. Por fim, julgo imperiosa uma maior participação e envolvimento da sociedade. Muitos dos eleitores, passados poucos dias da eleição, sequer se lembram em quem votaram, e sua atuação se limita ao comparecimento às urnas ou a poucas discussões abastecidas de senso comum, preconceito e desinformações repassadas pela mídia. A grande maioria não sabe sequer a atribuição de cada um dos poderes e de seus membros. Vendem-se por promessas vãs. Quando este quadro for mudado, populistas e oportunistas não terão vez.

Por outro lado, acredito que poderíamos estar vivendo uma oportunidade especial em nossa sociedade. Quem sabe seria esta a hora de canalizar toda esta indignação, adicionar conhecimento, senso crítico, informação, dúvidas, debate, ouvir o que o outro tem a dizer, respeitar as divergências, e assim começar um movimento verdadeiramente sério, organizado e com muito mais credibilidade, buscando a sociedade justa que tanto sonhamos. Muitos elogiam países europeus por sua organização, pela probidade de seus entes públicos, mas não seria isso reflexo da cultura de seus povos?

Só para lembrar: as manifestações ocorridas no último dia 15 – das quais não participei por não concordar com os fins a que se destinavam – conseguiram reunir algumas milhares de pessoas em algumas cidades. Porém, quantos desses manifestantes participam da vida política em seu município? Quantos vão à câmara de vereadores acompanhar a atuação dos seus representantes? Quantos procuram o vereador que votaram para cobrar posicionamento em temas relevantes, e não apenas para pedir para tapar buracos na rua? Quantos participam de audiências públicas? Quantos acompanham os valores e aplicação dos repasses de recursos ao município? E mais, tentem montar grupos de estudos e discussão sobre política e cidadania, com encontros quinzenais ou mensais. Dificilmente vai passar de meia dúzia de interessados – digo isso porque estou tentando há mais de um ano montar um grupo destes. A conta, mais uma vez, não fecha.

Para encerrar, gostaria de lembrar que os partidos que hoje apoiam o governo federal, cujos membros estão envolvidos no escândalo da Petrobrás, são os mesmos envolvidos no escândalo do mensalão, são os mesmos que apoiaram Sarney, Collor, Itamar e FHC e que certamente estarão ao lado do próximo governante seja lá quem for, são os mesmos protagonistas de escândalos que se repetem, financiados por desvios de dinheiro público em favor de empresas privadas, através de contratos fraudulentos, e que retornam na forma de financiamento de campanhas eleitorais. Vendem seu apoio ao executivo em troca de dinheiro para bancar as cada vez mais caras eleições. Isso só existe porque funciona. Campanhas caras, com publicitários bem pagos, atraem votos de uma população alheia aos seus interesses, independentemente do caráter, da ideologia, das propostas, do histórico do candidato, quando na minha opinião deveria ser o eleitor quem deveria se interessar, procurar se informar quem é este que pede seu voto, se é merecedor ou não, independente do “jingle” mais engraçado e da campanha mais criativa. Mas acredito que infelizmente isso é algo que talvez as gerações atuais não cheguem a presenciar. Tivemos as manifestações de 2013 e alguma demonstração de indignação durante a copa de 2014, mas não obstante elegemos o pior e mais conservador congresso nacional. Velhos caciques e oligarquias permanecem no legislativo, e provavelmente esses mesmos personagens ou seus sucessores, representando essa mesma política, sejam reconduzidos ao poder em 2016 e 2018. Porém, não podemos nos omitir e renunciar ao direito de começar as mudanças. E é este desafio que deixo a todos, manifestantes ou não, favoráveis ou contrários ao governo, defensores ou não do impeachment: que passado este momento não deixem esta indignação se esvaziar, que o movimento aqui iniciado não seja mais uma vez efêmero, que este desejo de mudança seja canalizado e transformado em algo objetivo e perene.

Gleison Luiz Zambon

Servidor Público

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