SURDEZ. Por Antônio Carlos Danelon

Posted on 12 de maio de 2012 por

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Vi numa reportagem o alerta de médicos otorrinos sobre o número crescentes de jovens com perda de audição por causa da altura exagerada dos fones de ouvido, som nos carros e baladas. Alguma coisa deve estar errada para que tantos jovens prefiram ficar surdos a se abrirem ao enriquecedor desafio dos relacionamentos com as pessoas, inclusive as difíceis e complicadas.

Tudo bem que cérebros de frango queiram transformar seus ouvidos em aterro sanitário. O problema é que em breve teremos uma geração que precisará de som cada vez mais alto porque os tímpanos não se recuperam. As tragédias que acontecem entre vizinhos, por causa disso, vemos na mídia constantemente. Os pais deveriam ver essas coisas, mas como “em terreiro que não tem galo quem canta é frango e franguinha”, o poder público terá que intervir fazendo leis que inibam a fabricação e uso de aparelhos de som cuja potência ultrapasse o tolerado pelo ouvido humano.

            Falando em barulho, quando se é convidado para uma festa uma das expectativas é rever parentes distantes, amigos e colegas para botar a conversa em dia ou mesmo fazer novas amizades. Mas, quem disse que dá? Sei que festa sem música não é festa, porém o som das bandas é tão estridente e descontrolado que é impossível conversar com alguém a um palmo de distância sem ter que berrar. Ora, todo mundo gosta de escutar música, mas não na marra. Vai indo que cansa e a mudez domina a mesa. Quem não quiser ficar irritado, com ouvidos zunindo e com o saco cheio tem que pegar o boné e ir embora mais cedo.

            Continuando o assunto, é comum a gente passar frente a certas igrejas, igrejinhas e igrejolas e se assustar com o barulho ensurdecedor que produzem. Às vezes não passa de um cubículo de três por quatro metros com meia dúzia de pessoas, sem necessidade, portanto de aparelhos que amplifiquem a voz.

Mas, que nada; agarrado ao microfone quase sempre está um destemperado a berrar. Se não ele, são os hinos. O que mais me admira é a passividade do povo, não sem razão chamado de rebanho de ovelhas. Candidata à surdez pelos mesmos motivos acima citados, essa gente volta para casa achando que Deus falou com elas.

Ora, que tipo de crente é esse se sequer desconfia que um Deus que se presa não participa de uma baixaria dessas que agride os ouvidos, desassossega a alma, perturba os vizinhos e afasta ainda mais quem não acredita? Tenho a impressão que quando um grupo de histéricos desse naipe se reúne o Senhor põe tampão nos ouvidos e fecha a porta, pois essa gente prega a cara. Se “o bem não faz barulho e o barulho não faz bem” como disse São Francisco de Salles, Deus está na paz, no sossego e no silêncio; fala ao coração, não aos ouvidos.

 Acontece que microfone para muita gente, isso em todas as igrejas, significa poder, e quem o tem toma o lugar de Deus; manda, desmanda, controla e se impõem; principalmente aos mais fracos e sem instrução.

E para encerrar o papo li na imprensa que as queixas de perturbação do sossego público são as mais constantes, e não raro acabam mal; mesmo porque normalmente a polícia chega depois da tragédia. É sempre certo também que dentro de um carro com som estridente, atrás de um som que perturba o vizinho e dentro de um bar que invade calçadas e promove algazarra estão pessoas semelhantes à consumidores de drogas. Em vez de anestesiarem a alma para calar seu clamor, deveriam ter coragem e honestidade suficientes para ouvir o próprio interior e curar sua dor.

Quem não respeita a si, não respeita ninguém.

(Antônio Carlos Danelon é Assistente Social)

totodanelon@ig.com.br

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