Caia a tarde. O lugar era deserto. Vendo a multidão que o seguia desde longe, Jesus levantou uma impertinente questão: “Onde compraremos pão para alimentar toda essa gente” (Jo 6 5). Os discípulos ficaram alvoroçados; fizeram uma reunião, calcularam mais ou menos o custo e a viabilidade da questão; sugeriram que o Mestre não inventasse moda, fosse mais realista e dispensasse o povo para que se virasse com seus próprios meios. Contudo, a resposta foi mais perturbadora ainda: “Não é preciso que vão embora. Dai-lhes vos mesmos de comer”. (Mt 14, 16).
Com uma batata quente dessas nas mãos foram rápidos em se esquivar: “Só temos aqui cinco pães e dois peixes”. Querendo desestimular Jesus de uma idéia tão absurda, que certamente os exporia ao ridículo e, para encerrar logo o assunto, emendaram: “Mas o que é isso para tanta gente?”
Jesus, compreendendo-lhes a estreiteza da mentalidade, pegou os pães e os peixes, deu graças, abençoou-os e repartindo-os, começou a distribuí-los entre os presentes. Provavelmente os que tinham pão consigo fizeram o mesmo. Todos comeram a ponto de sobrar.
Se existe fome no mundo – só no Brasil são 16 milhões de miseráveis, em Piracicaba entre 12 e 15 mil – não é porque falta o pão, pois o Senhor nunca falha em no-lo dar todos os dias, aliás, nem das aves do céu Ele esquece. A Humanidade atingiu um grau de desenvolvimento nunca visto. Os supermercados estão tão abarrotados de produtos que toneladas deles são descartadas por passarem do tempo. Restaurantes e escolas todos os dias jogam no lixo grande quantidade de sobras de comida. E uma vergonha que num mundo opulento como o de agora existam pessoas passando fome. Portanto, o que falta não é comida, mas partilha justa dos recursos.
Porém, o texto vai muito mais longe porque o mesmo Jesus reafirmou que não só de pão vive o homem, e mandou-nos trabalhar não pelo alimento que perece, mas pelo que permanece até a vida eterna; e se apresenta como esse alimento. “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim, nunca mais terá fome e o que crê em mim nunca mais terá sede. Quem comer desse pão viverá eternamente”. (Jo 6,34).
A indústria de alimentos fatura alto. O Brasil destrói suas florestas para plantar mais e mais. Mesmo os shoppings, de templos do supérfluo estão virando enormes pastos para comilões de todos os gostos. O alimento define ou deforma o ser humano. A gente é o que a gente come. Talvez por isso doenças poderosas flagelem a humanidade. Come-se de tudo e demais porque falta às pessoas um alimento que realmente as satisfaça, que as sustente, que as faça alegres, e que lhes mate a fome de paz interior, de sentido para a vida, comensalidade, de amar e serem amadas.
Dizem que certas tribos praticavam antropofagia para que aquele que se foi continuasse vivo neles. Por isso “quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele”, completa Jesus. O mundo, obeso de corpo definha no espírito. Jesus está presente vivo e inteiro para TODOS, primeiro na Palavra e depois na Eucaristia.
Ele veio para os famintos, mas os saciados dele se apoderaram e atravancaram de regras seu acesso cometendo assim a mesma injustiça. “Não me retenhas”, disse. E ainda “Dai-lhes vós mesmos de comer”. É o que quer de sua Igreja; afinal Ele se fez pão para matar a fome que vem matando o mundo e não para ficar trancado em sacrários de templos vazios.
Antônio Carlos Danelon é Assistente Social –
Posted on 6 de junho de 2012 por blogdoamstalden
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