Entre os que acompanham a polêmica do aumento do salário dos vereadores poucos sabem que até 1967 os membros eleitos para um cargo na Câmara Municipal de Piracicaba não recebiam qualquer remuneração. Havia consenso em torno da idéia de que “servir o povo não é emprego”. Vereadores de várias legislaturas desejaram mudar este estado de coisas.
Em um texto publicado em 10 de dezembro de 1959 no extinto jornal Diário de Piracicaba, o jornalista Izidoro Polacow contava que sessões da Câmara estavam deixando de ocorrer porque havia edis que se recusavam a comparecer a fim de evitar a discussão pretendida por alguns, a “apresentação de projeto estabelecendo subsídios para os futuros vereadores”. Ainda que a lei previsse o direito a tais subsídios havia vereadores que temiam perder votos nas próximas eleições: “(…) difícil ao povo entender que homens – e mulheres também – pleiteassem votos buscando ‘emprego’, em que, em última análise, se transformaria o honroso cargo de vereador (…) Reconhecemos, como todos, que o exercício do cargo demanda certo sacrifício de ordem pessoal. Mas os que a ele concorrem sabem, de antemão, quais sejam e o que os espera”.
A discussão, entretanto, foi à frente. Em novembro do ano seguinte a proposta foi rejeitada, após longa discussão e tentativas de realizar a votação em sessão secreta, o que acabou não ocorrendo. Segundo matéria do Jornal de Piracicaba de 8 de novembro de 1960, o “projeto dos subsídios” fora rejeitado, tendo sido necessário o “voto de Minerva” do então presidente da Câmara, Manoel Rodrigues Lourenço, que assim “traduziu a opinião geral do povo”.
Em seu artigo publicado naquele dia, o jornalista Fortunato Losso Netto, diretor do JP, escreveu: “Há (…) quem argumente que o exercício da função (…) gratuitamente, é antidemocrático, pois pode afastar aqueles que (…) não possuem a necessária independência econômica para deixar seus afazeres e dedicar algumas horas ao serviço da comunidade. Mas nós diríamos que, sempre é possível conciliar o interesse particular com o espírito público, e disso temos exemplos os mais dignificantes em Piracicaba. Há muita gente modesta com folha de serviços altamente enobrecedora, ao lado de grandes fortunas, que permanecem olhando para si mesmas (…) Felizmente, Minerva, a ‘Deusa da Sabedoria’ (…) salvou a cidade de uma resolução indesejável, que viria ferir fundo os nossos foros de cult ura e de civismo. (…) Piracicaba não merecia isso de seus edis, e Minerva (…) ‘baixou’ sobre o plenário da Câmara, afastando o cálice amargo da vergonha, dos lábios da nossa sempre ‘Noiva’…”
Anos depois, em 20 de dezembro de 1967, a resolução número 6 da Câmara Municipal criou e fixou a remuneração para os vereadores de Piracicaba. De lá para cá, de aumento em aumento, apagou-se da memória coletiva o ideário deste tempo em que o cargo de vereador ainda não se prestava à comparação com, citando Losso Netto, “vulgar título de renda”.
Patrícia Ozores Polacow é Jornalista
andregorga
8 de setembro de 2012
Patrícia, você, como sempre, trazendo à tona importantes documentos esquecidos nas profundezas de velhos arquivos. Parabéns pelo texto! Eu não sabia que apenas em 1967 nossos vereadores passaram a ser remunerados.
Sou da opinião de que o cargo deva ser remunerado, sim, e com salário compatível com a importância do mesmo, afinal, um vereador trabalha para a comunidade, ou assim deveria ser. Deveria trabalhar para o bem do município, propondo leis que melhorassem a vida dos cidadãos, que preservassem o meio ambiente, protegessem animais, que visassem a resolução de problemas estruturais em bairros de periferia… Além disso, deveriam fiscalizar o executivo, constatar se o governo municipal está agindo de forma correta, se as verbas estão devidamente encaminhadas para cada área.
Opa… espere aí… Será que é isso mesmo? Será que estamos vendo a maioria de nossos vereadores agirem assim? Será que prestam certos serviços à comunidade por idealismo ou para agradar seus eleitores mais diretos, visando apenas manterem-se nos cargos? Será que entregar moções de aplausos conta como serviços à comunidade?
E será que existem vereadores de oposição? Pois praticamente todos os “santinhos” que eu vi dos vereadores atuais candidatos à reeleição trazem no verso a foto do atual prefeito e do seu candidato à sucessão. Logo abaixo da foto do candidato a vereador vemos um brasão dizendo que o atual prefeito “apóia” esse candidato. E traz grafado os dez partidos da coligação à qual pertence o candidato.
Acho que alguma coisa está errada!!! Coligação de dez (10) partidos? Não existe mais oposição? Está todo mundo no mesmo barco?
Mas vamos voltar ao assunto: salário de vereador! Acho que não remunerar o cargo de vereador realmente pode ser algo anti-democrático, já que possibilitaria apenas a quem tivesse uma fonte de renda razoável dedicar-se à função, o que seria possível apenas para candidatos de classes sociais mais abastadas, diminuindo a representatividade das classes menos favorecidas na câmara. Contudo, não posso concordar com um aumento de salário de mais de 60% numa tacada só, com o qual os atuais vereadores se “presentearam”, apostando na reeleição.
Já propus num outro comentário e proponho novamente: Vamos votar em gente nova e cobrar deles o que os vereadores atuais não foram capazes de fazer!
Se eu fosse candidato a vereador, colocaria entre minhas propostas “lutar pela redução do aumento de 60% no salário dos vereadores”. Acho que eu teria grandes chances de me eleger…embora depois de eleito tivesse que enfrentar o ódio dos outros eleitos ao levar adiante minha proposta!…rsrs.
Patrícia Polacow
10 de setembro de 2012
Oi, André! Obrigada! Você sabe, desenterrar documentos é com a gente mesmo!
Sobre os salários… Está fora de questão que os vereadores deixem de receber remuneração. Mas eu não acho antidemocrático o exercício do cargo sem receber. Antidemocrático é o processo pelo qual uma pessoa, dada sua condição de classe, é capaz de estabelecer ligações até chegar a se eleger. Antidemocrático é, também, um grupo que deveria estar ocupado tratando dos assuntos da cidade se preocupar em aumentar seu salário, que já era até bem alto, à revelia do desejo da população.
Vamos ver o que estas eleições trarão.
Abraços!!