Todo mundo já foi vizinho de um chato. E provavelmente todo mundo já foi também um vizinho chato. São contingências da vida e da convivência. Ora alguém faz uma festa muito barulhenta, ora somos nós. E por aí vai. Mas eu tive um vizinho que em matéria de “chatice” era excepcional. Antes de nos mudarmos, já havíamos sido alertados sobre o cidadão e suas neuroses. E, como a voz do povo é a voz de Deus, não tardou para que descobríssemos que era verdade. O cara é insuportável (não é mais meu vizinho, mas continua de mal com o mundo e com a vida). Não vou contar, até porque não vale o papel gasto, tudo o que ele mostrou de si. Mas o fato é em frente nossa nova casa havia uma grande árvore. Uma Sibipiruna, nada incomum, porém bonita, frondosa e que fazia uma sombra maravilhosa em nosso jardim, na parte da tarde. Melhor ainda, ela impedia que os raios do sol poente batessem no quintal e refletissem casa adentro pelos quartos.
Passados dois dias da nossa mudança, o chato nos procurou e pediu que requerêssemos junto a Secretaria de Meio Ambiente o corte da árvore. Argumentou que, a noite, ficava tudo muito escuro e, portanto, perigoso. Nós nos negamos, mas sendo verdade a questão da segurança, prometemos tomar outra medida. E tomamos. Instalamos um grande holofote com controle automático em nosso jardim, dirigido de tal maneira que iluminava toda a sombra noturna da árvore, inclusive a que se estendia para a casa do vizinho.
Pouco depois outra “visita”. O cidadão voltava à carga. Desta vez reclamava que a árvore podia cair. Bem, a rigor todas podem. Mas aquela não estava com a aparência de doente, com galhos secos ou com raízes expostas. Desta vez nos negamos sem oferecer algo. Se ele quisesse que chamasse um agrônomo capaz de nos provar que havia perigo. O chato foi embora “fumegando” e, por mais de um mês, ficou quieto. Uma manhã, acordamos com um caminhão da Secretaria de Meio Ambiente. Haviam tido ordem de derrubar a árvore e já o estavam fazendo. Pedi para ver o laudo que atestava a necessidade mas não havia. Os operários tinham somente a ordem e uma grande rapidez na motosserra. Confesso que poderia ter ido a Secretaria e levado o caso para frente, mas não o fiz porque os trabalhadores garantiam que uma nova árvore seria plantada no lugar. E foi. Uma pequena “espirradeira”, árvore arbustiva incapaz de alguma sombra. Aliás, incapaz de sobreviver muito também. Logo sucumbiu, não me perguntem por que. A casa virou uma estufa, com sol pela manhã e tarde. O pior veio depois. Passados alguns meses, outra vizinha nos confidenciou que a derrubada da árvore era exigência da esposa do chato (por trás de todo grande chato existe sempre uma grande chata..) que se incomodava era com as folhas que caiam sobre seu abrigo de carros. Com que contato privilegiado ele conseguiu o corte eu não sei, mas a chata e o chato venceram, nossa árvore caiu e o calor nos tomou de assalto.
Mas, malgrado minha indignação pessoal, vamos pensar um pouco. De fato árvores tornam as ruas mais escuras a noite, soltam folhas e, no limite, podem cair se estiverem doentes ou mal fundadas. Mas nós podemos viver sem elas? Na década de noventa, pesquisando uma publicação antiga sobre agricultura, na biblioteca da ESALQ, descobri inúmeros artigos defendendo a arborização urbana, tanto pelos benefícios em conforto térmico quanto pela possibilidade de se ter frutos e beleza para a população. A revista era do século XIX e os autores já defendiam o “reflorestamento urbano”. Hoje eu poderia indicar muitos outros artigos, bem mais precisos, com medições de temperatura e análise sobre o micro clima. Alguns são da ESALQ ou de teses lá defendidas. Ou seja, desde o século XIX já sabemos desta necessidade.
Porém, o que fazer com as folhas, a escuridão, o perigo de quedas, a interferência na fiação elétrica? Vou ser sincero. Eu não sei. Mas penso que os acadêmicos da área sabem ou podem vir a saber. O fato é que nestes tempos de rápida urbanização, precisamos de árvores nas cidades. Muitas delas, de todos os tipos possíveis. O necessário é que pesquisemos. Que destinemos recursos nas universidades para o estudo intensivo de árvores & cidades. Penso que possibilidades técnicas de “reflorestamento urbano” muito interessantes e criativas podem surgir destes estudos, se é que já não existem. Não podemos, por exemplo, começar a orientar a população para cuidar de suas árvores e detectar quando elas estão doentes e correndo risco de queda? Ou ainda começar nos bairros novos, a enterrar a fiação elétrica e telefônica? É necessário que as prefeituras procurem esta parceria com os centros de pesquisa. Tentar resolver somente na base do corte ou do plantio de arbustos não é uma atitude voltada para o futuro, para a sustentabilidade. É só uma “maquiagem verde”.
Alguns dos efeitos das árvores nas cidades, não poderemos resolver, é fato. Não é possível impedir as folhas de cair no abrigo de nossos carros. Mas neste caso é preciso ter noção do custo benefício das árvores e conviver com as folhas. Meu ex vizinho precisaria “fazer as pazes” com o mundo e com a vida, coisa que duvido que vá fazer. Já nós precisamos “fazer as pazes” com as árvores.
Marina Machado
20 de setembro de 2012
Pois eu te comento uma triste com árvore também. Minha mãe tem uma árvore linda no quintal dela. Percebeu que as folhas não estavam brotando e desconfiou da pessoa que limpava a piscina. Numa manhã, a criatura-que-limpava-a-piscina, muito descaradamente, arrancava todos os brotinhos de folhas que estavam aparecendo na árvore. Eu quase pulei da janela pra enforcar a criatura. Minha mãe, que é uma lady, desceu e conversou com a moça. A mesma disse: “É que essa árvore faz muita sujeira na piscina”. Claro, essa empresa nunca mais limpou piscina para nossa família.
blogdoamstalden
24 de setembro de 2012
Marina. Esta é a cultura de muitos de nós em relação às árvores. No norte do país, onde a floresta é sinônimo de terra improdutiva para muitos, chega-se ao ponto de não haver árvores nas praças. Enquanto não fizermos “as pazes” com as árvores não haverá solução. Bjs.
Panhoca
21 de setembro de 2012
A goiabeira da frente da minha casa em São Paulo resolveu cair as 22hs do dia 31 de dezembro de 2011 e portanto passei o reveillon ao som da motosserra e de alguns homens do corpo dem bombeiros!!! Sinto falta da goiabeira pela mesma razão- minha sala virou uma estufa!!
Me recordo de uma tarde andando pelas ruas de um bairro de Atenas na Grécia, onde a cada 15 metros de distancia me deparava com uma árvore frutífera “carregada” (laranjas). A sugeira que fazia era mero detalhe rente a tamanha exuberancia e beleza dos frutos!
Abraços ao mestre Amstalden e digníssima amiga e sua Sra. a Ju.
Panhoca
blogdoamstalden
24 de setembro de 2012
Grande Panhoca. Quando vamos nos encontrar?
Se eu bem me lembro, ainda vigora uma lei aqui que proíbe o plantio de árvores frutíferas nas vias públicas. Isso para evitar a disseminação de doenças de plantas que possam se espalhar para plantações comerciais. Louco, né? Na revista que pesquisei e cito no artigo, já havia defensores de árvores frutíferas para ajudar a alimentar o povo. Mas no nosso mundo, alimentar não é o objetivo. Vender é. Abraço, meu amigo, e entre em contato.
Kaique Rossini
21 de setembro de 2012
A Sibipiruna não é a melhor escolha entre as árvores usadas para o “reflorestamento urbano” devido justamente à questão da troca de folhas de tamanho minusculo, assim como seu porte e seu “prazo de validade”. Acontece que por algum desses milagres da politica, Piracicaba recebeu uma doação de um sem números de mudas de sibipiruna na década de 70, se não me engano por intermédio do agora então candidato a vice prefeito João Chaddad. Na questão do caso especifico, é gritante como na prefeitura só se consegue algo quando se conhece ou se tem algum “esquema” tanto em relação ao SEDEMA qto na liberação de habites, etc… está feia a coisa…. Existem sim diversas técnicas de poda para evitar os fios sem que se deformem as árvores e estas fiquem com um formato de V, existe uma diversidade de plantas que podem ser usadas satisfatoriamente nessas condições. UMA árvore pode, durante um ano, equivaler a refrigeração de 10 equipamentos de ar condicionado ligados continuamente, filtram até 28Kg de CO2, absorvem entre 2 e 3 mil litros de água… Mas… como estamos falando de cidades, de pessoas, estamos falando de politica, e bem se vê o padrão piracicabano de substituição de árvores, estamos fadados ao fracasso ecológico em nossa cidade, um inferno térmico… o projeto beira rio cortou mais de 140 árvores nas margens do RIO… (lembram das aulas de geografia? erosão, assoreamento? mudanças micro-climaticas?) prometendo plantar em substituição, 12mil mudas…. DO QUE?? AONDE??? são questões além de técnicas, politicas, pois dizem respeito à postura e ao entendimento da atual gestão em relação ao desenvolvimento sustentável de fato e não aquele da moda. Nossa cidade não efetua podas técnicas, privilegia a estética na escolha de novas mudas, à funcionalidade e mostra assim, seu apego à normatizações, para aquém do útil… o problema talvez é que tudo isso dê um pouco de trabalho….isso pq não estou falando de licitações, do padrão “comprado” e do padrão “entregue” etc, etc, etc…. dá pra ficar divagando sobre o assunto por um bom tempo
blogdoamstalden
24 de setembro de 2012
Olá Kaique. Gostei de suas observações. Que tal escrever um artigo mais extenso para o blog? Quanto a sibipiruna vc. tem razão. E não é só aqui. É chamada de “árvore de político” porque cresce rápido. Enfim, temos que reestudar isso sim, buscar alternativas e espécies adequadas. Nâo dá pra demorar mais. Escreve um artigo e manda que eu publico. Abraço.
Kaique
29 de setembro de 2012
Tentarei professor. O tempo, sempre ele, urge. Abraço.
Aline Lili Resende
21 de setembro de 2012
Tenho muitos vizinhos iguais =\ há 10 anos o visual de minha rua era outro…Presenciei o corte da árvore de frente a minha casa foi uma tarde tarde triste na qual eu chorei e pude sentir o Sol abrasando a calçada, até hoje é assim…
Por pura estética a maioria de meus vizinhos podaram suas árvores. As que existiam por aqui eram de aproximadamente 40 anos, raízes grandes, expostas na rua, isso já foi motivo para boa parte delas saírem de toda minha rua. Infelizmente não são todos que tiveram a atitude como nós tivemos de reformar a calçada para adaptar as raízes de nossa árvore. A nossa” Sibipiruna se mantém aqui para o bem de nosso ar, sombra e refresco!
blogdoamstalden
24 de setembro de 2012
É isso aí, Aline. Infelizmente o que eu relatei como minha experiência é mais comum do que se pensa. Obrigado pelo comentário. Participe sempre. Bjs.
ADRIANA ANTONIOLLI
10 de outubro de 2012
Para muitos as árvores são vistas como algo que derruba sujeira em seus quintais e calçadas. Concordo que de fato elas fazem isso mesmo, mas se fossemos para para pensar assim nós humanos não geramos nem um tipo de sujeira????
Olha mais que coisa interessante, para nós é muito fácil pois temos vasos sanitários e caminhões de lixo que passam recolhendo toda a sujeira que geramos de forma acelerada, descontrolada e crescente.
Voltando na questão árvores, elas tem uma inportância significativa tanto na sociedade (estética/cultural), na saúde (sombra, frutos, remédios, etc), para os animais (fruto, ninho, etc) e para o meio ambiente (diminuição do calor, ar mais “puro”, etc) como muitos já devem saber. E para os que ãinda não sabem deveriam buscar se informar mais antes de julgar.
Não sou especialista nesse assunto, mas em Piracicaba deveria ter um plano que melhor estruturasse o plantio de árvores na cidade, aredito que recentemente tem melhorado um pouco essa questão mas falta conscientização da população, pois não adianta ter uma árvore gigante em sua calçada, onde esta vai vir a trazer problemas no futuro. A questão é : basta ter uma árvore que melhor se adeque as condições do local, condições estas físicas e genéticas.
Muitas árvores nativas ou exóticas são plantadas em lugares inadequados e por este e outros motivos acabam morrendo ou sendo cortadas futuramente.
E em troca de seu corte apenas é colocada uma outra espécia que por muitas vezes são exóticas (nada contra espécies exóticas, mas elas tem seus pontos negatios principalmente em relação ao clima) ou que não vão trazer um benefício que a anterior trazia.
Devemos incentivar sim o plantio de mudas, o reflorestamento, e principalmente o manejo desses, mas é claro que tudo isso em locais adequados. O manejo é extremamente imporatnte para que não futuramente não se tenha problemas, se o manejo é claro for feito de forma correta.
blogdoamstalden
11 de outubro de 2012
Muito bem escrito, Adriana.
Lendo seus comentários pensei em algo. Os carros também fazem sujeira e barulho. Mas parece que não reclmamos, não?
POr que você não escreve um texto mais longo para o Blog?
Obrigado por comentar.
Abs.
Sueli Amstalden Bertolini
13 de dezembro de 2012
Ola Luis Fernando, muito bom seu blog, parabens
Tenho 3 arvores sibipiruna em minha chacara, faz muita sujeira, mas absorve 90% de gas carbonico, então vamos limpando a sujeira e deixa-las em paz.
blogdoamstalden
14 de dezembro de 2012
Muito Obrigado Sueli. Quer saber uma coisa engraçada? Descobri, depois do artigo, que o ex vizinho conseguiu a derrubada da árvore porque um primo seu era vereador… legal, né? Obrigado por comentar e fique a vontade para escrever e dizer o que pensa. Abraço.
Ninfa Sampronha Barreiros
31 de janeiro de 2013
Não sou Polyana, Fernando. Agora não me lembro o título, mas o Autor é o Rubem Alves, ele fala a esse respeito e foi daí que tirei a minha “catequese”,rs. Minha vizinha não tem árvore em frente a casa dela e detesta não a árvore e sim a vassoura! As suas visitas estacionam os carros embaixo da minha árvore, nunca em frente a casa dela.É uma Pata de Vaca Branca, folhas muito boa para se fazer chá para diabetes, rins etc. Nem me atrevo e vão arranjar briga comigo se o Sedema aparecer na minha porta. Minha árvore (sou possessiva) tem um cabelereiro próprio de muitos anos. As pessoas vivem me pedindo para apanhar as suas folhas. Mesmo assim, ela implicava com a árvore. Pois bem, falei para ela varrer as folhas e largar mesmo em frente da minha casa, mas, como sugestão que ela fizesse um montinho, não varresse para baixo e nem empurrasse as folhas com o esguicho de água. Isto porque as folhas e as flores (parecem uma orquídea), voltariam para o lugar de onde vieram… da terra, serviriam de adubo. Simpático,não é. Não parei aí. Ela me disse igual ao seu vizinho para cortá-la. Então, levando as últimas consequência de que “chumbo trocado não dói”, disse a ela faça isso agora, porque vou imediatamente denunciar você no 156 sobre o desperdício de água (todo dia ela lava o quintal, corredor,garagem e calçada e a rua também) e além disso usei também aquela “os incomodados que se mudem”, porque quem gosta de cimento tem que morar no cemitério! Ficou chocada com isso. Tratamento de choque foi o que usei. Tomou consciência à forceps.Hoje ela já coloca direto as folhas e flores não só no pé da árvore, como tb na jardineira que tenho na calçada, também cheia de flores e remédios. A água ela está mais esperta, torce para que eu saia todos os dias, porque quando estou em casa nem pensar que ela disperdiça. Antes de olhar o outro, temos que nos mirar no espelho. O que resolve no mundo é a solidariedade sempre, a falta de informação etc, veja só, contemporizando, porque esse texto deve ser antigo, o caso de Santa Maria, o que salva agora não é a grana, mas as pessoas que estão ajudando dando conforto para as pessoas, informando e mostrando o que acarreta as ações dos seres humanos. Nossa, desculpa aí, parece que converso com você. Cartas ao Fernando,rs. Valeu…