Por sorte, durante toda minha vida de professor (vinte e seis anos), tive poucos problemas de disciplina em sala de aula. Claro, algum sempre há, mas nada que me levasse a perda do controle, fosse o meu fosse o da sala. No início deste ano porém, durante uma aula no terceiro ano do ensino médio, a classe fazia uma bagunça incrível. Por três vezes eu parei a aula e pedi silêncio, argumentei que eles estavam se preparando para o vestibular e já eram quase adultos e que, portanto, aquele comportamento não tinha o menor sentido. Aliás, não teria nem que fossem crianças de séries menores.
Depois da terceira advertência o barulho e a bagunça não pararam. E o pior é que conversava a esmagadora maioria da sala. Geralmente, quando se trata de um ou outro aluno, depois das advertências o recurso que podemos usar é o de pedir que eles deixem a sala. Mas naquele momento, eram tantos os alunos que não havia condições de retirar todos. Trata-se de uma máxima antiga: não se pode lutar contra todo um povo. Assim, depois de explicar exatamente isso, que eu não poderia retirar praticamente toda uma turma da sala, eu lhes disse que só havia um recurso. Sairia eu, uma vez que estava claro que a turma não queria assistir aula e que, portanto, minha presença na sala não era necessária. E saí, avisando o coordenador que, depois, fez mais uma reprimenda à turma.
O fato é que funcionou. No restante do ano eu não tive mais problemas coletivos. Houve sim, conversas, alunos desatentos, brincadeiras, mas nada que atrapalhasse tanto que eu tivesse que retirar algum aluno da sala ou tornar a deixá-la eu mesmo. Enfim, posso estar errado, mas penso que a maioria aprendeu que a aula é uma atividade coletiva e que tem, portanto, responsabilidades coletivas que envolvem todos nós. A maioria, claro, mas nem todos. Mas o que realmente me surpreendeu é que, dias mais tarde, houve uma reunião com os pais (da qual não pude participara porque tinha aula na faculdade a noite) e nela eu fui duramente criticado por alguns pais. Pelo que me foi dito, um deles chegou a dizer que “minha atitude não havia sido a de um professor”.
Como não pude estar presente, não sei quem era este pai e nem sua profissão. Talvez ele seja um pedagogo ou um colega e talvez tenha estratégias diferentes de lidar com uma situação como esta. Eu me propus a recebê-lo num outro horário, assim como a outros pais que porventura não tenham concordado com minha atitude. Entretanto este pai e os demais que fizeram críticas, não quiseram me encontrar. Uma pena. Eu gostaria de ter ouvido deles o que seria uma “atitude de professor”.
Enfim, como ninguém aceitou me encontrar e eu não tive a oportunidade de aprender outros pontos de vista e outros métodos, sou obrigado a ficar com a minha visão das coisas. E segundo minha visão, é preciso ensinar os jovens a diferença entre ser criança e ser adulto. Uma criança precisa ser conduzida, orientada e cuidada. Um adulto tem que orientar-se, conduzir-se e cuidar de si próprio e, muitas vezes, de outros também, inclusive de seus filhos. Isto significa responsabilidade e esta, por sua vez, significa assumir o resultado dos nossos atos, sejam eles individuais ou coletivos. Se uma turma prefere conversar, gritar e brincar a assistir aulas, mesmo que o professor se esforce por dar uma aula atraente e argumente sobre a importância da mesma, isso é uma atitude coletiva que tem um efeito: o não aprendizado, esteja o professor lá ou não. O que eu quis demonstrar foi exatamente isso: tudo o que fazemos tem uma consequência e temos que assumi-la. Mais ainda, esta consequência, dependendo de nossas ações, atinge não somente a nós, mas a muitos outros.
Não é assim em tantas coisas? Minhas atitudes individuais não atingem também minha família, meus amigos, meus parentes? Se sou incapaz de me prover, não acabo por “pesar” no bolso de outrem? Se não preservo o meio ambiente, não prejudico aqueles que vivem neste mesmo mundo que eu? Se bebo e dirijo bêbado, não arrisco além de minha vida a daqueles que estão no carro comigo e as dos demais que estão nas ruas? Não demonstrar isso para seus filhos e não deixar que eles experimentem os resultados, ainda que amargos, de seus atos, traz também consequências. Traz adultos que não crescem e não se emancipam. Que vivem à custa dos pais enquanto estes estiverem vivos e, no caminho de suas vidas, prejudicarão muitas outras pessoas ainda. Talvez minha atitude não tenha sido a melhor, mas foi a que encontrei para ensinar esta verdade aos meus alunos. Entendo que o amor nos leva a querer proteger nossos filhos, porém acredito que mais do que proteger é preciso ensiná-los a viver.
Valéria Pisauro
6 de dezembro de 2012
Grande mestre!
Concordo com você: depois de esgotadas todas as tentativas e não sem retorno – é hora de retirada.
Abraços.
Waldete ap dos santos salvaia
18 de dezembro de 2012
Luis, adorei seu texto!!! Um colega levou para minha escola e discutimos muitos sobre isso!!É importante que os pais tenham um novo olhar para a educação de seus filhos
blogdoamstalden
20 de dezembro de 2012
Muito Obrigado Waldete. Fique a vontade, você e demais colegas para comentar e mesmo escrever textos para o Blog. Feliz Natal. Abraço.