Parte de uma família que conheço se converteu a outra religião, e a maior parte ficou na religião original. O problema é que a conversão está causando conflitos. A parte que se converteu, está numa denominação cristã que afirma que aqueles que não pertencem ao seu grupo, não são “filhos de Deus”, mas “criaturas de Deus”. Ocorre que, então, os “filhos” não podem conviver com as “criaturas”, uma vez que estas últimas são “ímpias”, pecaminosas e, com certeza, destinadas ao inferno. A família então se divide. Não freqüenta mais as mesmas festas, não se vê nos feriados e nem mesmo se visita mais.
Eu não sou teólogo, mas conheço alguma coisa de religiões. E, no meu entender, a menos que eu tenha lido e interpretado muito erradamente os Evangelhos, esta divisão entre “filhos” e “criaturas” é uma aberração dentro da proposta ética do cristianismo. Aliás, é uma aberração frente à proposta ética de outras religiões não cristãs também. Não vou aprofundar este tema do ponto de vista religioso, porém tenho duas considerações básicas sobre o fenômeno. A primeira destas considerações é a de que, infelizmente, o que acontece com a família desta moça não é fato isolado e tampouco específico de uma religião. Ao contrário, o mais comum é encontrarmos em todas as religiões o mesmo problema: uma “distinção” entre o “salvo” e o “não salvo”, o “ímpio” e o “pio”, o “pecador” e o “puro”. Nos meus anos de adolescência, quando participava de grupos religiosos católicos, pude observar de perto este fato entre os católicos. Alguns, que ajudavam nas liturgias ou cantavam em coros, colocavam-se num grau distinto dos demais, reivindicando claramente ou veladamente, sua superioridade e sua autoridade sobre os assuntos religiosos, de administração da paróquia e até em relação a vida pessoal dos demais. Um destes “salvos” veio me repreender certa vez porque eu havia convidado um professor para fazer uma palestra ao nosso grupo de jovens. O professor não era católico, mas ele não foi nos falar sobre religião, e sim discutir profissões. Para o “santo” de minha paróquia, no entanto, o convite estava “errado”…
Se você prestar atenção, verá que em todas as religiões o fenômeno se repete, seja entre cristãos, hindus, muçulmanos e até entre grupos auto proclamados “alternativos” em termos de espiritualidade. E isto nos leva a minha segunda consideração: embora eu entenda este tipo de divisão como parte da construção da identidade social e pessoal dos membros de uma ou outra religião, considero este fenômeno algo perigoso socialmente. Ocorre que no momento em que divido as pessoas entre “filhos” e “criaturas”, por exemplo, estou criando uma situação de superioridade para os “filhos” e inferioridade para as “criaturas”. Os superiores então, podem discriminar os inferiores. Podem menosprezá-los, evitá-los e, no limite, até prejudicá-los, uma vez que as “criaturas de Deus” não têm o mesmo status dos “filhos” e nem a sua nobreza, não tendo, portanto, os mesmos direitos.
Alguém pode argumentar que não é assim. Que aqueles que são “puros” ou “salvos”, somente sentem “pena” dos “ímpios” e, diante desta pena, deste reconhecimento da inferioridade dos “pecadores”, tendem a tratá-los com paciência e tolerância, e até, talvez, trazê-los à “verdade”. Mas será que este comportamento de “paciência e tolerância” realmente ocorre? Talvez um ou outro “fiel” seja, de fato, paciente e tolerante, mas quem o é, é exceção e não regra. Quando os portugueses e espanhóis dominaram as Américas, massacraram e roubaram os povos daqui. A justificativa era o fato dos ameríndios não serem cristãos, não estarem na “graça divina”. Não eram “filhos” e sim “criaturas”, logo os cristãos conquistadores poderiam dispor dos bens e até da vida dos não cristãos. E este é somente um caso. Ao longo da História, poderíamos citar muitos outros. O resumo é que a consideração de si próprio como alguém espiritualmente correto e, em contrapartida, daqueles que não pertencem à mesma fé como “incorretos”, leva, inevitavelmente, a distinção entre os que têm direitos e os que não têm. Entre os que devem imperar porque pertencem à “verdade” e aqueles que devem se submeter porque vivem no “erro”. E a consideração de que alguns devem reinar e outros devem se submeter, é sempre o início da ditadura, da opressão e da violência.
Pertencer a uma religião pode ser uma coisa extremamente positiva. Pode levar um indivíduo a viver melhor, a buscar a justiça e a harmonia. Mas se este indivíduo ou a própria religião passa a distinguir e discriminar entre aqueles que são seus “irmãos” e os que não são, então a religião perde seu efeito harmônico e leva ao conflito. Terá sido esta a intenção dos fundadores das grades religiões, como Cristo, por exemplo?
Evandro Mangueira
30 de outubro de 2013
Eu gosto de ser Criatura. Acho a vaidade (ego) o pior dos pecados, pois a vaidade é que faz com que pessoas sintam-se mais santas que outras.
Evandro Hion Novello
30 de outubro de 2013
Concordo com o meu chará ai ! hahaha
Religião não deveria se “misturar” com alguns conceitos muito comum atualmente, no fim, é só mais uma bandeira que as pessoas levantam para se chamar de “diferenciadas” E dai vem a minha vontade não me definir em termos de religião mas praticar minha espiritualidade sozinho “egoisticamente” porem sem influenciar e ser influenciado levianamente…
Mario Rodolfo Novello
30 de outubro de 2013
Olá Luis, boa tarde! Tenho como resposta a sua questão e acredito que todos tambem tem é a de que cristo de maneira alguma teve, ou melhor, tem a intenção descriminatória.
Não existe um exemplo se quer onde cristo agiu desta forma. Os problemas que tivemos na historia foram causados ou praticados pelos “outros”, e não pelo Cristo.
Esses fatos na historia fizeram com que muitos se tornassem ateus, que não quer dizer “estar seguro” apenas descrente. Pelo menos até um determinado momento da vida! Então a pergunta que faço é: Se os problemas ocorridos na historia foram gerados pelos “outros” e não por cristo, porque então não crer, porque não acreditar em Cristo ou em um Deus?
Ser ateu ou atoa não é bom em nenhum seguimento da vida, principalmente na questão espiritual, estou falando, espiritual, onde cada individuo pode e tem a liberdade de escolha para cuidar de seu espirito, seja rezando, orando ou apenas pensando em um Deus. (pensar ou apenas lembrar em um Deus já não estaríamos fora do ateismo? Muitos dizem ateus mas pensam em Deus)
Na religiosidade existem muitas coisas que realmente deixam duvidas e atrapalham muitas pessoas, seja pela má interpretação, ignorância devido as culturas e tradições. Então se buscarmos algo para praticarmos o “cuidar do espirito” de forma a não sermos egoístas, descriminatórios acho que seria legal.
Depois de muitos anos de vida e algumas experiencias, cheguei tambem a seguinte conclusão: Se eu for ateu, ou não procurar cuidar do meu espirito amparado por alguma religião, eu não estaria me considerando “o perfeito”? Não estaria deixando de ser humilde e achando que sou “melhor” que os outros que estão procurando o “cuidar do espirito”? Isso já não seria uma atitude descriminatória? Eu já não estaria me separando das pessoas ao invés de nos unirmos?
Não quero dizer que sou o certo em minha opinião…posso não ser …é apenas a minha opinião, somente prefiro assim!
Abraços aos participantes do Blog.
blogdoamstalden
6 de novembro de 2013
Rodolfo, a “crença” na inexistência de Deus, pode sim, ser tão arrogante quando o oposto. Concordo com você, também, que a religiosidade é uma base moral e filosófica, existencial importante. Porém, no fundo, o fenômeno é mais social do que religioso. As religiões acabam por se tornar grupos sociais voltados para interesses e crenças comuns, diferenciando-se pouco de outras associações de interesse. A direção das igrejas também cria, por sua vez, uma casta cujas atitudes são ditadas mais pela manutenção de uma estrutura burocrática (os sacerdotes e ministros que são mantidos economicamente pela Instituição). Esta “casta” por sua vez, precisa da divisão “salvo/perdido” para manter seus fiéis e sua renda e seu status. Isto tudo não significa, porém, que dentro das religiões e Igrejas não existam seres humanos maravilhoso. Mas, na minha opinião, a maioria deles é marginalizado e está “oculta” em meio aos demais. Alguns são louvados, mas somente após a sua morte. Abraço e obrigado por participar.
Alexandre Diniz
30 de outubro de 2013
O Professor Amstalden já compartilhou aqui reflexões budicas, e eu quero resgata-la. Sidartha Gautama (o buda mais conhecido) diz “Não questionem se há ou não deus. Isso só vai gerar conflitos.”
Camila Modanez
30 de outubro de 2013
Excelente texto professor!!!!
blogdoamstalden
6 de novembro de 2013
Obrigado, Camila. Abs.
Carla Betta
30 de outubro de 2013
Desta vez, ao invés de comentar com minhas próprias palavras, vou beber e trazer-lhes o cálice transbordando da fonte onde bebi: “A responsabilidade, portanto, não é da doutrina de Jesus, mas daqueles que a interpretaram falsamente… ”
-Não Vim Trazer A Paz, Mas A Espada-
9 – Não julgueis que vim trazer paz a Terra; não vim trazer-lhe paz, mas espada; porque vim separar o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe, e a nora contra sua sogra; e os inimigos do homem serão os seus mesmos domésticos. (Mateus, X: 34-36).
10 – Eu vim trazer fogo à Terra, e que quero eu, senão que ele se acenda? Eu, pois, tenho de ser batizado num batismo, e quão grande não é a minha angústia, até que ele se cumpra? Vós cuidais que eu vim trazer paz à Terra? Não, vos digo eu, mas separação; porque de hoje em diante haverá, numa mesma casa, cinco pessoas divididas, três contra duas e duas contra três. Estarão divididas: o pai contra o filho, e o filho contra seu pai; a mãe contra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra sua nora, e a nora contra sua sogra. (Lucas, XII: 49-53)
Comentário em “O Evangelho segundo o espiritismo”:
” Seria a culpa da doutrina do Cristo? Não, por certo, pois ela condena formalmente toda violência. Disse ele em algum momento aos seus discípulos: Ide matar, queimar, massacrar os que não acreditarem como vós? Não, pois que lhes disse o contrário: Todos os homens são irmãos, e Deus é soberanamente misericordioso; amai o vosso próximo; amai os vossos inimigos; fazei bem aos que vos perseguem. E lhes disse ainda: Quem matar com a espada perecerá pela espada. A responsabilidade, portanto, não é da doutrina de Jesus, mas daqueles que a interpretaram falsamente, transformando-a num instrumento a serviço das suas paixões, daqueles que ignoram estas palavras: O meu Reino não é deste mundo.”
Embora saibamos da imperfeição humana, é difícil compreender que as previsões acima feita pelo Cristo se concretizem, pois aqueles que pretendem seguir seus ensinamentos não se pautam pelo seu exemplo! Triste, né? 😦
blogdoamstalden
6 de novembro de 2013
Pois é, Carla. São verdades. Mas você já reparou que a tendência é a de se ler o que “interessa” das Escrituras? E mesmo fazer malabarismos de interpretação para “adequar” o que elas dizem aos interesses particulares? Infelizmente, a Bíblia é vasta o suficiente para permitir ambas as coisas. É por isto que Gandhi dizia que, se todos os livros sagrados fossem destruídos e se mantivesse somente o Sermão da Montanha, seria o suficiente para a humanidade se espiritualizar. Abs.
Celso Bisson
30 de outubro de 2013
simples. Se vc segue, participa, frequenta uma deterrminada Religião e alguem vem com essa idéia ridícula, caia fora. Com que autoridade um indivíduo qualquer pode te julgar? Ignore . Certas pessoas dizem que está na Bíblia, isto é na sua interpretação da Bíblia. Não perca seu tempo com pessoas assim. Se vc sente que precisa de uma Religião, e eu te respeito e defendo esse seu direito, procure Uma em que pessoas sejam sérias. Perlo menos quando falam de Deus, mas não se sintam como Ele…
andregorga
1 de novembro de 2013
Primeiramente, parabéns pelo texto. Acho o tema muito pertinente frente ao que observo por aí. Na minha opinião, Cristo não fundou e nunca propôs uma religião… Anos depois de ter deixado a Terra seus seguidores deram origem ao que se chamou cristianismo. Também esse Cristo, se realmente passou pela Terra, não foi ele quem escreveu uma palavra que está na Bíblia, que foi escrita muito depois de sua partida, e por várias “mãos”, vamos dizer assim. Um livro que usam quase que para ditar as regras no mundo ocidental atual, mas escrito por pessoas da antiguidade e adaptado pela igreja católica conforme suas necessidades econômicas, sociais e políticas em determinadas épocas. Logicamente deve existir uma “força” ou um “algo” maior que chamamos “Deus” e que criou um universo com bilhões de galáxias, cada uma dessas com bilhões de sistemas solares e cada um desses com seus planetas, entre os quais um que possui uma estrela que chamamos Sol onde orbita uma poeirinha que chamamos Terra e que consideramos nossa casa, embora não cuidemos para mantê-la em ordem. Os físicos e astrofísicos supunham que no universo houvesse uma 4ª dimensão, depois acharam que teria uma 5º… mas atualmente já chegam a supor que existem 11 dimensões (se a 4ª já é difícil de se imaginar, o que dizer de 11?). Nossa lógica fundamentada no cartesianismo dificilmente consegue visualizar o que seriam 11 dimensões. Existe no YouTube um vídeo do falecido astrônomo Carl Segan, da série de TV Cosmos, que3 a Globo exibia na década de 80, em que ele demonstra graficamente num programa de computador em 3D o que seria uma quarta dimensão, assim como usamos uma folha de papel – 2D – para representar um cubo que tem 3 dimensões…é muito interessante). Estou tentando argumentar que não somos nada frente a esse universo e, se existem tantos bilhões e bilhões de sistemas solares, é muita pretensão nossa achar que apesar de sermos menos que um micróbio numa poeirinha que orbita um grãozinho um pouco maior de poeira chamado por nós de Sol, somos os escolhidos de Deus para termos sido criados à sua semelhança… No mínimo é ridículo. Religião para mim, hoje, é uma grande besteira, mas parece que a cada dia vemos mais e mais pessoas mudarem suas vidas para seguirem o que um “pastor” sem escrúpulos lhes ordena como sendo uma lei de um Deus que nunca se apresentou (discute-se algo que está apenas na fé, na cabeça das pessoas… nenhuma prova de existência). Acho uma coisa ridícula personificar Deus, tentar imaginar esse Deus utilizando a lógica humana, ditando regras para serem seguidas por nós, micróbios da poeirinha que orbita o grãozinho maior, que é apenas um entre outros bilhões e bilhões… É muita pretensão e ridículo a raça humana se achar a última bolachinha do pacote e que esse algo que teria criado o universo estaria preocupado com o que ela faz ou deixa de fazer. “Vaidade, vaidade, vaidade… É tudo vaidade”. Aqui um vídeo com imagens ruins mas legendas em português de uma apresentação do polêmico e já falecido comediante americano George Carlin, discorrendo sobre religião… http://www.youtube.com/watch?v=F6fl5fq6qLs
andregorga
3 de novembro de 2013
Permitam-me fazer uma observação ao comentário que escrevi anteriormente. Ao dizer que Cristo não escreveu uma palavra do que está na Bíblia, referi-me ao novo testamento, que incluem palavras atribuídas a Jesus mas não escritas por ele ou ditadas por ele para que fossem escritas. Quanto ao velho testamento, logicamente ele não teve participação alguma (outros homens escreveram insinuando que transcreviam a palavra de Deus).