(na continuação de seu artigo Body Art, Valeria Pisauro nos apresenta agora uma das artistas, Gina Pane)
2. GINA PANE(Biarritz, 1939 — Paris, 1990)
GINA estudou na escola de Belas Artes de Paris entre 1961 e 1966, durante a década de 70 tornou-se um dos expoentes máximos da Body Art, utilizando sempre o corpo como suporte para suas manifestações artísticas. Os seus atos bastante extremados no sentido da automutilação e do sofrimento pretendiam acentuar o problema da violência da vida contemporânea na sua relação com a vulnerabilidade e com a própria passividade com que o individuo enfrenta estes temas. As suas encenações, de sentido masoquista, assentavam na impassividade com que a artista produzia os cortes e na capacidade de conter e teatralizar o próprio sofrimento e de estetizar a automutilação. Aproximando-se das orientações estéticas de outras artistas femininas, a obra de GINA PANE pretendia abordar a relação entre os sexos, os tabus e os estereótipos e o problema da dominação masculina.
Na obra de GINA PANE o corpo ocupa todos os lugares. O corpo não é a sua arte, é a sua linguagem.
GINA escolheu a denominação “ação” para os seus trabalhos, por considerar que o termo performance era demasiado demonstrativo e implicava uma certa teatralização. Em sua obra o corpo torna-se o centro de todos os debates, é investido ideologicamente, reclamado pelos movimentos feministas.
Categorizar o seu trabalho enquanto BodyArt pode ser redutor, pois não se pretende meramente expor esse corpo, ou torná-lo objeto de arte, mas fazê-lo falar para além das palavras.
A sua performance“AzioneSentimentale” foi realizada em Milão, em 1973, na Galeria Diagramma.
As ações que desenvolveu foram, num primeiro momento, realizadas no seu ateliê, transferindo-se depois para galerias.
Em 1968 deixa temporariamente Paris para se isolar na natureza, espaço que funciona para Gina Pane como “força poética, lugar de memórias e energia” ( Anna Tronche). Aí desenvolve uma primeira fase do seu trabalho, em que é primordial esta ligação entre sujeito e espaço natural. Mais tarde, os contornos ritualísticos do seu trabalho começam a fixar-se em torno da “blessure”, conceito central nos trabalhos que posteriormente vem a desenvolver. Já na década de 80, este aspecto é aprofundado na figura do artista-santo, numa analogia à figura do santo mártir da iconografia católica.
A par com o seu percurso artístico, Gina Pane lecionou também na FacultédesBeauxArts de Paris e organizou workshops de formação no campo da arte performativa, que tiveram lugar no Centre Pompidou de Paris.No início da década de 80, acreditando esgotadas as potencialidades comunicativas das ações corporais e concluídas as marcas que queria deixar impressas no corpo, a artista abandonou as performances públicas e dedica-se hoje à produção de objetos escultóricos e de desenhos, de caráter minimalista, para os quais utiliza o metal, o vidro e a madeira.
GINA PANE “AzioneSentimentale ” – 1973
As imagens de “AzioneSentimentale” foram originalmente apresentadas num placard 120×100, integrando uma montagem de sete fotografias mate a cores, de tamanho 8×10.
Nelas está presente uma sensação de entrega, assim como de movimento coreografado. Para GINA PANE a fotografia é um objeto sociológico. No seu trabalho, essencialmente de caráter performativo, utiliza a imagem fotográfica como suporte formal, que fará perdurar a ação realizada. As ações, raramente repetidas, eram registradas fotograficamente e ocasionalmente filmadas, sendo este registro rigorosamente controlado pela artista. As fotografias conferem realidade à ação passada, guiam o observador pela performance, condensam o discurso. Mesmo não sendo primordial na obra da artista, a fotografia não é de modo algum negligenciada, formando um “pós” no processo artístico, em que cada ação era estudada em storyboards, realizada e registrada. Um processo completo, cujo núcleo era as longas ações, que raramente duravam menos de 50 minutos.
“AzioneSentimentale” condensa violência e doçura, características patentes ao longo do trabalho da artista. Este fragmento específico remete para uma entrega despojada; uma mão segura um buquê de rosas, enquanto que o outro braço se oferece rasgado por espinhos. A dialética interior/ exterior é amplamente explorada. Há um corpo interior que pulsa no seu exterior (o sangue), há a necessidade de um corpo que se sente provar a sua realidade (o corte). Não só o corpo é significante nesta linguagem, juntam-se outros, com significados bem inculcados na cultura ocidentalizada – o branco, as rosas, o vermelho. O corpo dá-se, viaja até a superfície da pele, dá-se na sua necessidade de entrega, mas também na de encontrar algo para lá do limite da pele.
A ferida vai ser central no trabalho de GINA PANE, catalisadora desta necessidade de inscrição, testemunha duma identidade, o corpo aberto revelador dum sofrimento. Este é um corpo social, denunciador da ferida coletiva, da fragilidade do encontro entre o Eu e o Outro, mas é também inegavelmente um corpo de mulher.
MarielleToulze chama a atenção para a ausência de análises que destaquem o caráter assumidamente feminino da obra de Gina Pane.
Os códigos parecem bastante claros, se referindo à pureza virginal, a da noiva, o buquê de rosas vermelhas significando a paixão, os espinhos, metáforas do amor que se realiza e enfim, para terminar, o corte na mão remete para a fenda da vagina que sangra, signo da virgindade da mulher, sangue sagrado em diferentes sociedades. Nada disto é abordado nas obras consultadas; falam sempre da abertura da artista aos outros, da sua vontade de encontrar o outro, da relação que estabelece entre natureza, cultura e lâmina. E vista (enfim) como uma maquiagem. Estas leituras não são forçosamente antinômicas, mas é notável que nada seja dito claramente sobre a influência dos feminismos que estavam no seu auge na época em que foi realizada a performance. (MarielleToulze, tradução de Tania Navarro Swain in: A influência dos feminismos em artistas da França e do Ultramar nos anos 70)
É ainda de notar que “AzioneSentimentale” foi realizada perante uma audiência exclusivamente feminina. A “Ação Sentimental” veicula significações partilhadas; o corpo único transporta em si a memória de outros corpos, de outras emoções, que são as mesmas, de tão cruas e essenciais. É este o caráter primitivo das performances de GINA PANE, dionisíaco, na medida em que parte dessas emoções em bruto e apela ao que há de primordial, e daí verdadeiro, no ser humano. Apela a essa linguagem comum, cujo meio não pode ser outro se não o corpo.
GINA PANE, Le Body Art ou Art Coporel
GINA PANE, “DeathContro”, 1974
GINA PANE, “Burying a Sunbeam”
GINA PANE, “Wall”
GINA PANE, Hermann Nitsch
GINA PANE, Piece
GINA PANE, Discours
GINA PANE, Marina
GINA PANE, Joseph
GINA PANE, Action
GINA PANE, Performance
Valeria Pisauro é professora de Literatura, História da Arte e compositora premiada.
Edu Pedrasse
2 de março de 2014
Olhem que link fantástico sobre o assunto!
http://valiteratura.blogspot.com.br/2010/07/body-art-ou-arte-do-corpo.html
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7 de março de 2014
Excelente !!
Evandro Mangueira
7 de março de 2014
Muito bom! Fiquei um pouco aflito com as imagens!
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16 de março de 2014
Cara belo post bem interessante !!
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16 de março de 2014
adorei o blog eo post !