A Câmara Municipal de Piracicaba e a democracia. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 9 de abril de 2014 por

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Quando ouço pessoas, inclusive mais jovens, afirmando preferirem uma ditadura à nossa democracia, sinto-me mal, incomodado. Penso que elas não têm muita clareza do que estão dizendo. Por outro lado, ao acompanhar os desmandos de nossos políticos, entendo a irritação que leva a tal simpatia pelo autoritarismo. E não é necessário nos afastarmos de nossa cidade para vermos as distorções a que me refiro. Em nossa Câmara Municipal, temos visto com muita regularidade, atitudes que desmerecem o sistema democrático. Em 2012, os vereadores aumentaram seus subsídios em 66%, causando indignação e reprovação dos eleitores, o que foi comprovado por pesquisas. Mesmo assim o aumento foi mantido. A coleta de assinaturas para um projeto de lei popular que revogava o aumento, sequer foi recebida pelos vereadores. De lá para cá, outras atitudes ocorreram. O único vereador que abriu mão do aumento teve seu chefe de gabinete exonerado ilegitimamente (e até onde entendo, ilegalmente) pela presidência da Câmara. E nesta última semana, os vereadores, com poucas exceções, votaram pela correção do seu subsídio, por um regulamento interno que impede manifestações dentro do plenário e adiou, mas não recusou, outro projeto que permite ao legislativo “caçar” o status de utilidade pública de entidades que o critiquem… Nada disse é, de fato, muito animador para quem vê este tipo de “democracia funcionando”.

Fica mais frustrante quando percebemos que a grande maioria das atitudes dos vereadores é a de prestar homenagens, conceder moções de aplauso, requerer o fechamento de buracos em vias públicas e atender, no varejo, demandas que não lhes competem. Fiscalizar o Executivo, por outro lado, uma das funções mais importantes, nem pensar. Tudo que vem “de cima” é aprovado. Não dá mesmo para ficar satisfeito com isto e este é um dos motivos pelos quais muitos acreditam que uma ditadura seria melhor.

Mas se você é um dos que pensa assim e se sente tentado a desejar um regime autoritário, permita-me uma observação. O que vemos aqui, não é uma democracia plena, mas uma distorção do processo motivado por leis feitas logo após a ditadura militar e por muitos deputados e senadores oriundos da mesma. Leis que, no fundo, mantiveram privilégios e atribuições restritos aos políticos, afastando a população da cidadania. Por exemplo, por que a Constituição diz que somente os membros do legislativo podem definir seus subsídios e impede projetos de lei populares nesta área? Não é a manutenção de um privilégio fora do jogo democrático? Outro fato, nosso sistema permite, principalmente a eleição por votos de legenda e com um número nem sempre representativo do eleitorado. Os votos que elegeram os vereadores de Piracicaba representam apenas 20,3% dos eleitores da cidade. O vereador mais votado teve 3,02% dos votos válidos (que são aqueles dos eleitores que realmente votaram e não anularam ou votaram em branco) e 2,18% dos votos do total de eleitores aptos da cidade. O presidente da Câmara obteve 1,06% dos votos válidos e somente 0,76% dos votos totais. Ou seja, os vereadores, embora eleitos legalmente, representam uma parcela muito pequena dos eleitores e infelizmente, as vezes são exatamente os eleitores pouco informados, que se beneficiaram ou se acreditaram beneficiados por favores no “varejo”.

Isto está errado. É uma falha no processo democrático e tem que ser alterado por uma reforma política e eleitoral. Claro que aos políticos isto não interessa, mas a nós sim. E se vivêssemos numa ditadura, não poderíamos nos manifestar a favor de uma mudança nas regras eleitorais. Na democracia, embora imperfeita, podemos e devemos. Antes que você deseje um regime autoritário, pense nisto, nessa sua possibilidade de se expressar, protestar e reivindicar, como estou fazendo agora. Pense também se de fato os nossos vereadores agem como democratas. Em minha opinião, se agissem teriam mais cuidado com atitudes como as que citei acima. No fundo, o que eles fazem tampouco é o que eu penso ser democracia plena. É autoritarismo em cima de um grande número de cidadãos sub-representados.

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