O tempo e os encontros. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 2 de julho de 2014 por

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O café era forte, e ela tomava sem açúcar. Eu adoçava o meu. Não me lembro se o Queda fazia o mesmo. Mas me lembro de longas visitas que eu fazia e das longas conversar que tínhamos. Falávamos um pouco de tudo, de coisas sérias, de coisas engraçadas, ríamos, ficávamos as vezes todos em silêncio, pensando no assunto do qual falávamos. Também conversávamos sobre livros, uma paixão comum, e educação, jovens, alunos e professores, já que eu era professor das duas filhas Gabriela e Carolina. Falávamos do mundo e da vida enfim e eram tardes e noites agradáveis, serenas e alegres. Tardes e noites nas quais, eu jovem professor em início de carreira, aprendia muito e me sentia apoiado, estimulado a ensinar e estimulado a aprender.

Quando me mudei para Campinas, a fim de concluir o mestrado e iniciar o doutorado, os encontros, não só com os Queda, mas também com outras famílias de amigos, ficaram mais esparsos, até rarear. Em parte, isso é o curso natural das coisas. Somos seres em movimento e os caminhos, afazeres e espaços que ocupamos nem sempre coincidem. Porém, uma outra parte é devido ao fato de que nos esquecemos, frequentemente, de que a vida é frágil, passa rápido e de que visitar as pessoas de quem realmente gostamos não é um dever, mas sempre um momento de prazer, de alegria e de acolhimento mútuo em meio ao turbilhão do dia a dia.

O contato e o apreço, porém, nunca cessaram. Mais recentemente eu “encontrava” Maria Helena nas redes sociais. Trocávamos mensagens curtas e ela eventualmente comentava artigos do meu Blog. Em abril falamos longamente pelo telefone, tentando colocar, em pouco tempo, a conversa “atrasada” em dia. Um pouco antes, tínhamos nos visto pessoalmente, mas por acaso, no Largo do Pescador. Tanto ao vivo quanto pelo telefone, reiteramos a promessa de uma reunião, um encontro, não só entre eu e o casal, mas com muitos outros amigos da época. Confesso que, esquecido da rapidez do tempo que mencionei acima, sempre protelei. Devia ter tomado a iniciativa e marcado o encontro, mas não o fiz. No fim de maio Maria Helena adoeceu e agora, na semana passada, ela se foi. Eu não cheguei a saber que ela estava doente, tão rápido foi o desfecho. Também por uma rede social, soube do que acontecera e só me restou o vazio que um amigo deixa ao partir.

Restou também a tristeza do encontro não marcado, não realizado e agora impossível.   Restou a consciência aguda de que é preciso ver aqueles de quem gostamos, aqueles que realmente nos fazem bem e que isto é mais uma questão de decisão do que de oportunidade. As oportunidades se criam conforme as buscamos, mas mesmo o tempo em que isto é possível, é limitado, daí a necessidade de realmente criar as oportunidades sempre. Minha amiga se foi, mas nossa amizade, assim como a de muitas outras pessoas, ajudou a me moldar. Isso não está perdido e nunca estará. Mas eu queria ter partilhado com ela, um último café forte, o meu adoçado, o dela, sem açúcar.

Não deixe que o mesmo lhe aconteça. Dê um tempo a si próprio e vá ver aqueles de quem gosta realmente. Compartilhe um café, uma bebida, algum tempo com eles, porque não são somente seus amigos e amigas, são também são aqueles que ajudam você a ser quem é e o ajudarão, se forem de fato seus amigos, você a ser sempre melhor.

Dedicado aos meus amigos, Oriowaldo Queda, Gabriela e Carolina Queda e em memória a minha amiga, Maria Helena da Silva Queda, que mesmo com sua ausência, tornou a me ensinar e me estimular a aprender.

 

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