Em fevereiro de 2011, o juiz João Carlos de Souza Correa foi parado em uma blitz no Rio de Janeiro. Ele dirigia um veículo sem placas e estava sem documentos. Duas infrações sérias. Ao ser avisado pela agente de trânsito Luciana Silva Tamburini de que seu carro teria que ser guinchado, o juiz protestou. Chamou a polícia e deu voz de prisão à agente. Na confusão que se seguiu, a agente afirmou que ele “era juiz, mas não era Deus”. Depois desta fala a agente foi levada a delegacia e a pouco foi condenada a pagar uma indenização de R$ 5.000,00 ao magistrado por tê-lo ofendido. O desembargador José Carlos Paes, da justiça do Rio de Janeiro, em sua sentença, afirmou que a agente além de “afrontar e enfrentar o juiz”, ainda “desafiou a magistratura e tudo o que ela representa” ao “debochar” do mesmo. O mais curioso é que o mesmo magistrado que agora irá receber os cinco mil reais, perdeu a carteira de habilitação em 2013 por se recusar a fazer o teste do bafômetro ao ser parado em outra blitz.
Não sou tolo de acreditar que a lei é igual para todos. Não é e nunca foi. Em sociedades passadas a justiça era um privilégio, hoje, via de regra, é uma mercadoria que, quem tem mais dinheiro, não compra necessariamente, mas através de bons profissionais a reverte a seu favor ou ameniza a pena a que deveria se sujeitar. O caso da agente condenada, no entanto, demonstra que, em alguns casos, a justiça parece ser ainda também um privilégio. Não mais de classe e sim de um grupo de funcionários públicos. Os membros do Judiciário são isso, funcionários públicos que devem zelar pelo cumprimento das leis. Não devem e não podem estar acima dela, mas não é essa a impressão que ficou. A começar pelo fato de estar sem placas no carro e sem habilitação, o Sr. João Carlos de Souza, estava errado e, como “meritíssimo” (cheio de mérito em bom português) deveria ter acatado a lei que defende.
Não sendo jurista e tampouco tendo o processo em mãos, não tenho como avaliar a condenação da agente e a fala do desembargador. Talvez, diante da norma pura da lei, ele tenha razão. Mesmo assim, fiquei com uma suspeita desagradável de que tenha sido um ato de corporativismo, uma interpretação dos fatos que parece visar somente manter a “intocabilidade” da magistratura. Leis são interpretadas na maioria das vezes e situações atenuantes são levadas em consideração. Talvez o desembargador tenha feito isso, mas não foi, repito, o que pareceu.
E isto, essa aparência de privilégio mantido e a situação esdrúxula de um juiz se recusando a se submeter a lei que deve preservar, vem em péssima hora. Vem em um momento em que a população parece perder a fé na democracia, que pressupõe a divisão dos poderes e lei para todos. Vem em uma época em que impunidade cria uma sensação de desemparo social, levando ao clamor por uma ditadura, um regime violento ou mesmo provocando conflitos mais duros, nos quais ofendidos buscam a reparação com as próprias mãos. E vem, por final, em uma época de profunda irritação com pessoas públicas dos três poderes, cujas atitudes dão, para o povo, a sensação de que só agem em benefício próprio. A indignação não é só uma sensação minha ou uma avaliação apressada. As repercussões da condenação da agente na imprensa, na televisão e nas redes sociais, comprovam o sentimento generalizado. Tanto que, pela internet, uma quantia maior do que a multa foi arrecadada em uma “vaquinha” e nas redes sociais pude ler afirmações nada respeitosas ao juiz, ao desembargador e ao judiciário, que o Sr. José Carlos Paes tentou preservar.
A sentença do desembargador pode ter sido legal, mas não me pareceu justa. Mas independente de minha pobre avaliação, ela não serviu para honrar a imagem do Judiciário. Ao contrário, serviu para que muitos cidadãos que são parados em blitz e punidos por infrações, se sentissem, estes sim, debochados por quem, de fato, não é Deus.
Quanto a indenização, o Sr. João Carlos de Souza Correa vai recebe-la, mas não do salário de pouco mais de três mil reais da agente. E sim das mãos da população. É um dinheiro de protesto, um dinheiro desonroso. Tomara que ele faça um uso adequado.
PS: para ilustrar como a sentença veio em má hora:
Gleison
13 de novembro de 2014
Se a preocupação do magistrado era com o “dano moral”, toda a repercussão negativa do fato está servindo para que mesmo?
Marlene Piarello
13 de novembro de 2014
Não sobrou pedra sobre pedra…não há instituição no mundo que não foi atingida pela corrupção seja de dinheiro ou de valores….chafurdamos na lama…..elogiamos a honestidade e a humildade, quando esta deveria ser a regra. Sinto tristeza….
Anônimo
14 de novembro de 2014
SOU LEIGO NO ASUNTO, JUSTIÇA, JUIZ, MENSALEIROS E CORRUPÇÃO AH ISTO É MEU
PAÍS,(O MEU POVO SE ENVERGONHA)