Injustiças sobre Dilma. Por Erich Vallim Vicente

Posted on 19 de março de 2015 por

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Na atual conjuntura de sentimentos republicanos, dizer que a sociedade está sendo injusta com a presidente Dilma Rousseff (PT) pode até parecer uma cômoda leniência com a mandatária da Nação. Mas há diversos aspectos neste emaranhado de discursos difusos, agressivos e, em grande medida insano, especialmente quando flerta com intervencionismo militar, que não dá para esconder o fato de que a ex-guerrilheira, sempre na trincheira por Democracia, não tem sido ouvida no que propõe.

Quando as manifestações eclodiram de maneira inesperada e violenta, em Junho de 2013, a presidente teve a coragem, pouco comum em muitos homens, sobretudo na política, de colocar cara a tapa, apresentando uma pauta, se não consensual, ao menos programática do que precisa acontecer no Brasil. Na ocasião, ela sugeriu uma Reforma Política a partir de uma Assembleia Constituinte, onde inevitavelmente estaria o fim do financiamento privado de campanhas eleitorais.

Às vésperas de uma eleição presidencial, somente Dilma Rousseff teve a “hombridade” de um servidor público com cargo eletivo de vir a público e dizer o que propunha. Tudo bem, como presidente é o dever dela. Mas o vice-presidente Michel Temer, os congressistas da época e, também, a oposição – se esta estivesse a fim de um pacto em torno de mudanças profundas no Estado Democrático nacional – tinham o deve de vir a público em busca desta convergência pluripartidária. Ninguém o fez.

Durante o embate eleitoral, em Outubro de 2014, a presidente foi acuada de todas as formas cabíveis e possíveis, ora de maneira legítima, mas por vezes tendo as características de uma mulher e senhora sendo desrespeitadas acintosamente, em claras demonstrações machistas. Mas para quem, ainda na juventude, foi inquirida pelo tribunal dos militares de então, tudo foi tratado como parte do tabuleiro da disputa e, fazendo valer o “coração valente”, Dilma Rousseff aguentou o tranco e saiu vitoriosa.

Em menos de 100 dias do novo governo, novamente a presidente volta a ser atacada, seja pela Esquerda, com até críticas sobre os governos petistas desde os tempos de Lula, mas principalmente pela direita e extrema-direita, por onde saem impropérios pouco usuais de famílias matriarcais. A grande manifestação deste domingo (15) é legítima, embora tenha nela fortes indícios de uma arquitetura voltada mais ao poder do que a defender bandeiras de desenvolvimento institucional e político do País.

E aí, neste aspecto, tem ainda mais injustiça contra Dilma Rousseff. As mudanças na política econômica, com a troca de ministro, deveriam render mais críticas à Esquerda do que à Direita. Como bem escreveu o economista Antonio Delfim Netto, “a presidente teve a coragem de rever os rumos e foi capaz de mudar”. O discurso foi outro na eleição, de fato, mas o governador Geraldo Alckmin (PSDB) também disse que não faria racionamento de água e anunciou três dias depois de eleito. Dilma apenas jogou de acordo com as possibilidades que existem neste tabuleiro.

Um dia depois da maior manifestação desde a Diretas Já, ganha força a proposta do fim do financiamento privado de campanhas eleitorais, conforme sugeriram os ministros Miguel Rossetto e José Eduardo Cardozo na coletiva após os eventos de domingo, materializada num pacote anticorrupção a ser enviado ao Congresso Nacional. É novamente a presidente ditando um caminho civilizado, como fez em 2013, mas foi abafada por conta do medo pré-eleitoral daquele momento.

Resta saber agora se a base aliada e a oposição (o que inclui a mídia, principal responsável pelo chamamento de domingo) abraçarão a causa que está claramente sinalizada pela Presidência. Ou se encobrirão no comodismo de uma Democracia que, embora em amadurecimento, ainda muito ingênua em cobrar o estadismo da classe política. Resta saber se a presidente será ouvida ou se continuarão as injustiças sobre ela.

Erich Vallim Vicente, 33, jornalista, editor-chefe de A Tribuna Piracicabana. Texto originalmente publicado em www.tribunatp.com.br.

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