Tomando as ruas todas, eles se sentem poderosos. Melhor do que isso, se sentem vivos, como há muito tempo não se sentiam. A multidão que os envolve faz com que eles se sintam parte e cada vez que ela se move em conjunto, berra num imenso coro, reage a algum estímulo, a adrenalina parece dar um novo ânimo a cada um.
Pesquisas do Data Folha indicaram que nas manifestações do último dia 15, em São Paulo, a grande maioria, ou 74% dos que ali estavam, participavam de um protesto pela primeira vez na vida. E ao se olhar os registros fotográficos ou televisivos da manifestação, facilmente se identificava grande número de adultos nas ruas, muitos deles provavelmente acima dos 50 anos. Ao contrário das manifestações contra o ex-presidente Collor de Mello, nos início da década de 1990, as mais recentes não se caracterizaram por vozes majoritariamente jovens.
Quem lida com pessoas que estão envelhecendo sabe o quanto é familiar a elas mecanismos que envolvem sentimentos de exclusão, de menor auto-estima, de se considerarem sem espaço e devidamente valorizados. E, de repente, eis que este grupo descobre o universo das manifestações: nelas eles se igualam, se fazem ouvir em suas reclamações, se sentem revalorizados porque, afinal, se forem milhões, talvez consigam mudar o governo, talvez consigam afastar aqueles que julgam corruptos, talvez retomem benefícios que acreditam lhes tenham sido tirados indevidamente, no processo de envelhecimento e de aposentadorias precoces, mesmo que feitas por vontade própria.
Certamente não são apenas questões ideológicas ou posturas políticas firmes, consistentes – que poderiam ter eleito outro governo se fossem assim tão amplas como parecem ser quando se vê multidões pelas ruas – que motivaram as manifestações da última semana.
É preciso se ter olhares mais amplos, que envolvem novos mecanismos de comunicação, de interesses de mídia, de manipulação de grupos políticos – itens cuja reflexão já vem sendo amplamente divulgada. Mas, em minha opinião, há que se considerar também, em parcela significativa do grupo dos que protestam, a descoberta tardia da paixão. Quem, numa etapa de vida caracterizada pelo envelhecimento, nunca esteve anteriormente envolvido em movimentos populares, quem nunca se empenhou em alguma luta onde é necessário se jogar por inteiro, de repente descobriu a adrenalina que dá poder berrar nas ruas, ser ouvido como se importante fosse, ganhar atenção. Ou seja, descobriu como funciona o mecanismo da paixão. Num perfil conservador, como se declara boa parcela dos manifestantes, o normal é manter o status quo, não querer mudanças, se preservar a qualquer custo sem se arriscar a muita coisa ao longo da vida. E, então, de repente, eles descobrem que ser oposição também pode ser bom.
Paixões nos levam a atitudes impensadas, deliciosas, que dão prazer. Em geral, depois que passam, a gente considera o quanto, objetivamente, fora daquele momento, agiria de outra maneira. Talvez, daqui a alguns anos, muitos destes manifestantes possam reconsiderar suas posturas, que misturam tantos sentimentos estranhos. Quem sabe, até descubram outras paixões, mais pessoais e menos influenciadas pelas multidões que não têm rosto e nem identidade. E, então, não misturem tanto alhos com bugalhos.
Beatriz Vicentini é jornalista e organizadora do livro Piracicaba 1964 – O Golpe Militar no Interior. Ed. Unimep. 2014
Daisy Costa
26 de março de 2015
muito bom!!!
graça ribeiro
26 de março de 2015
Pois é, os velhinhos, foram os mesmos que saíram as ruas nas Diretas Já e depois no Fora Collor. Como continuam sendo enganados pela classe política, resolveram manifestar-se novamente. Quem sabe os políticos, que envelheceram junto com esses “velhinhos manifestantes” tomem vergonha na cara e façam aquilo que prometeram desde as Diretas Já – ÉTICA NA POLITICA. Para desespero desses safados, a população está envelhecendo e o aumento da expectativa de vida dos brasileiros, indicam que esses POLÍTICOS CORRUPTOS ainda verão muitas manifestações da velharada