O presente dos meus 15 anos. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 19 de setembro de 2019 por

2




Há exatamente quarenta anos atrás, eu, então garoto de quinze anos, já amava os livros e, sem dinheiro, “namorava” títulos nas livrarias. Quando conseguia algum dinheiro, comprava alguns, mas minha fome de ler sempre foi maior do que minhas posses e até do que meu tempo.
Em uma destas livrarias, folheei um livro de Lin Yutang, um escritor e filósofo chinês que foi muito popular nas décadas de 1950 a 1970. O livro chama-se “A importância de compreender” e é uma coletânea de textos chineses que vão da poesia à filosofia, passando pela vida cotidiana, culinária, caligrafia e religião.
Como o título diz, a ambição do autor era a de apresentar um pouco da cultura chinesa para a compreensão dos ocidentais.
Fiquei “apaixonado” pelo livro, mas faltava o dinheiro. Muitas vezes fui a livraria e o folheei, lendo partes aqui e ali.
Pouco antes do meu aniversário, comentei com uma tia, minha tia mais querida, Emília Amstalden, que vivia com suas irmãs, todas solteiras, Aparecida e Leonilda, também muito queridas, sobre o livro que eu vira.
Tia Emília, ou tia “Miloca”, como a chamávamos, era a pessoa mais doce e maravilhosa que já conheci. Bonita, inteligente, teve paralisia infantil e se locomovia com muita dificuldade. Só trabalhou perto do fim da vida, depois de ter conseguido fazer uma faculdade, mas sempre viveu muito modestamente, assim como suas irmãs.
Vida modesta em termos de posses, mas rica em amizades.
Sua casa, seu sorriso, seu abraço e suas palavras foram para mim e para muitas outras pessoas uma benção e um refúgio.
No dia 18 de setembro, dia do meu aniversário, ela me chamou em sua casa e me deu um dinheirinho dizendo, com um sorriso que guardo até hoje: “´vá comprar seu livro..”
No dia 19, quarenta anos exatos hoje, eu fui comprar o livro com o dinheiro parco cedido por tia Miloca, tia Cida e Tia Nida…
Foi mais um gesto de amor, dentre tantos, que recebi delas. E o livro está comigo até hoje. Eu o “amo” por dois motivos: seu conteúdo que me iniciou no mundo do pensamento oriental e que me fascina até hoje, e por ter sido presente da Miloca.
Eu o li tantas vezes e o manuseei tantas vezes em busca de trechos, que está quase desfeito. Mas está aqui, ao meu lado agora.
E em gratidão ao meu aniversário, às minhas tias e aos amigos e amigas que se lembraram de mim neste aniversário, publico aqui um dos trechos de que mais gosto. Um trecho do pensador chinês Cheng Chao, falecido em 1689 e chegou a mim por Yutang e Miloca.
E que agora compartilho com vocês, com o mesmo amor e gratidão que devo a eles.
Tenham a certeza de que vocês me tornam diferente.
“Uma nuvem fica multicolorida quando reflete o sol.
Um riacho de montanha transforma-se em uma catarata quando passa por um penhasco.
As coisas se tornam diferentes em razão daquilo a que se associam.
Eis porque a amizade tem tanto valor.”

Posted in: Artigos