Ramayana. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 11 de maio de 2012 por

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Em 1955, aos vinte e dois anos, o americano Willian Buck encontrou na biblioteca de sua cidade uma bela edição do Bhagavad-Gita, clássico indiano que faz parte do Mahabharata, a colossal obra épica, filosófica e religiosa hindu. Fascinado, estudou a cultura da Índia e o sânscrito, além de estender suas leituras para outras obras tradicionais. Chegou a conclusão que a extensão dos clássicos (só o Mahabharata em cinco mil páginas…) e seu formato em poema, dificultavam o acesso ao público ocidental moderno.

Dedicou então, anos de sua vida a ler os originais e “recontar” primeiro o Ramayana, depois o Mahabharata, em forma de prosa e de maneira mais dinâmica, sem tantas digressões e detalhes secundários. Em 1970, depois de publicar as duas obras, trabalhava numa versão do Harivamsa (outro clássico) quando faleceu aos trinta e sete anos. Parece uma missão “cármica” cumprida, não?

E o resultado da missão são dois livros maravilhosos, de leitura fluída e “saborosa”. O Mahabharata está esgotado no Brasil, mas o Ramayana ainda está disponível. Neste último, conta-se a epopeia do deus Rama e sua luta contra os demônios Rakshasas, chefiados pelo Rei Ravana que derrotara todos os deuses e deusas e dominava a terra. Rama tem sua esposa, Sita, raptada por Ravana e, ajudado por Hanuman, o rei dos macacos e por Jambavam, o rei dos ursos, luta para derrotar os Rakshasas e recuperar sua amada.

Além da narrativa do conflito, já em si muito agradável, o livro traz princípios filosóficos, éticos e religiosos indianos que, na verdade, são comuns a todas as culturas. No fundo, nossas dúvidas e anseios são universais: qual nosso papel no mundo? Qual o sentido da vida e da luta? Como nos portamos nesta vida? No Ramayana encontramos todas estas perguntas e algumas “respostas” (ou podemos dizer propostas?) dentro do universo cultural indiano. Quem quer entender um pouco mais deste universo, pensar um pouco mais nas questões existenciais ou só ter momentos de puro prazer com uma obra fantástica, deve experimentar esta.  Eu não me canso de reler e é difícil dizer qual trecho gosto mais. Aquele em que é descrita a luta de Rama e Indrajit, um dos generais demônios é um joia de poesia e psicologia, assim como o trecho que relata o diálogo entre Ravana e Yama (a morte). Deixo a título de exemplo, o preâmbulo (resumido) da edição que tenho:

Oh! Homem, sou o demônio guerreiro Indrajit, difícil de ver. Luto invisivelmente, escondido da tua vista por encantamento. Ataco por trás dos ventos selvagens do mau pensamento; apago muitas luzes desguardadas. Eu te conheço, e as boas obras realizadas em tua vida serão o teu único escudo quando precisares morrer e passar sozinho por mim a caminho do outro mundo(…) Dilata o coração. Renuncia à cólera. Acredita-me, teus poucos dias estão contados; faze agora mesmo uma escolha rápida e não penses em outra! Vem, aclara o coração e, prestes, caminha comigo para o seio de Brama, enquanto é tempo. “

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