…para as 29 árvores da rotatória da Avenida Vollet Sachs com Piracicamirim que tombarão para dar passagem ao protagonista do “desenvolvimento” de Piracicaba desses últimos anos: o automóvel. Dentro dele o prefeito e sua corte. Acompanhando a carreata vão vereadores, deputados, magistrados, sindicalistas, jornalistas, religiosos, empresários que bancam campanhas; interesseiros e simpatizantes da década de 50.
Dever do poder público é garantir mobilidade de pessoas não de carros. Congestionamento é problema de quem gosta de automóvel. Na cidade, transporte particular não é direito, é concessão. Direito é transporte público, que se fosse priorizado não precisaríamos destruir tanto o meio ambiente e nem desperdiçar dinheiro em obras para carros. Desde quando trocar oxigênio de árvores por veneno de carros é evolução? Investir no particular é incentivar os acidentes, a desigualdade, o individualismo; a morte da natureza e das pessoas além de atravancar a mobilidade dos coletivos e dos atendimentos de urgência e emergência.
Nesse sentido, reportagem da Folha de São Paulo (03.06.12) relata o drama do paulistano que, para ir ao trabalho, joga fora 17 dias de vida por ano dentro de ônibus. “Chego em casa cansada. Não consigo ficar com os meus filhos”. (Sueli Dias da Silva, 44 anos, executiva, mãe de dois filhos).
Congestionamento de 300 quilômetros São Paulo chega a ter. O ônibus precisa disputar espaço com o automóvel, que cada dia entope mais as ruas para levar uma ou duas pessoas. Especialistas defendem expansão dos corredores de ônibus. O prefeito Kassab prometeu 66 km, mas não fez nenhum. “Os benefícios da ampliação da marginal Tietê, que custou quase 2 bilhões, não duraram um ano. Nos períodos de pico os congestionamentos voltaram. Se não priorizarmos o transporte coletivo, o transporte individual irá tomar todo o espaço que dermos, e não será suficiente” (Horácio Augusto Figueira, mestre em engenharia de transporte pela USP. Folha, 10.03.12).
E Piracicaba segue o mesmo caminho equivocado. De quantos urbanistas e especialistas em tráfego o município dispõe em seu corpo técnico? Arquitetos fazem prédios, não sabem criar cidades. Em questão de mobilidade urbana parece que nossos administradores olham para trás. Se não, perceberam que investir no automóvel dá mais visibilidade já que agrada uma população sem responsabilidade coletiva. Por cima expandem sempre mais o perímetro urbano deixando o centro desabitado, sendo que o conceito de ‘cidade compacta’ ganha reforço entre urbanistas. (Folha 01.04.12).
“O primeiro artigo de todas as constituições, inclusive a brasileira, diz que todos são iguais perante a lei. Se isso é verdade, um ônibus com cem passageiros tem direito a cem vezes mais espaço nas ruas que um carro com uma pessoa”. (Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá e consultor de trânsito. Folha 24.06.12).
Deveriam ser responsabilizados gestores públicos que gastam mais com quem não deixa o carro nem para ir à padaria da esquina que com os usuários dos coletivos. Dizem que nas cidades da Europa carro é para emergência ou passeio, não para trabalhar. “Numa cidade avançada, ricos usam transporte público. Pode parecer que fazer estradas melhora o trânsito, mas isso não é verdade. Você conhece uma única cidade no mundo que tenha resolvido o problema fazendo vias maiores? Não há”. (Enrique Peñalosa, idem). Mas, o caipiracicabano acha que andar de ônibus, bonde, bicicleta ou a pé é coisa de pobre.
Por aqui temos um transporte coletivo sucateado, insuficiente e caro. Os terminais são deprimentes, mal cuidados e inóspitos. Neles os políticos só entram no tempo das eleições para iludir um povo que, feito boiada, caminha todos os dias para o abatedouro.
Antônio Carlos Danelon é Assistente Social
totodanelon@ig.com.br
Ninfa Sampronha Barreiros
13 de julho de 2012
Muito bem colocada a matéria no blog e como Cartas ao Leitor no JP. A População desconhece que por conta das obras realizadas na cidade uma quantidade sem precedente de corte de árvores vêm se realizando e com isso iremos “torrar” nos próximos cinco anos se algo não for feito. Engraçado que há tantas ONGs que trabalham com isso, mas deve ser no papel somente!
andregorga
13 de julho de 2012
O piracicabano – o brasileiro em geral – está na contramão das atitudes ecologicamente corretas. Além do transporte coletivo estar relegado a segundo plano, o objeto do desejo é um veículo cada vez maior e mais potente o que demanda mais material, maior custo de produção, maior impacto ambiental e mais poliuição que um veículo pequeno, além de ocupar mais espaço nas ruas.
Quanto ao texto, só posso aplaudir… Parabéns, Danelon, pela clareza com que expõe os fatos.
carlabetta
13 de julho de 2012
Então… e como é que a gente faz para conscientizar a POPULAÇÃO? O artigo descreve bem o que nos acontece, mas o que mais falta é mobilização popular! Apelar para os políticos? Inútil!! Transporte público é meta ideal por todas razões já explanadas no artigo!
andregorga
13 de julho de 2012
Carla, na minha opinião, quem precisa se conscientizar são os governantes e não a população. Não adianta deixar o carro em casa, pois se o transporte coletivo da cidade oferece itinerários alheios à sua necessidade e em horários esparsos, você não conseguirá chegar onde necessita no horário desejado.
Resta à população usar o que o governo municipal coloca à sua disposição, através das empresas autorizadas a explorar o transporte público na cidade.
Morei em Campinas por 4 anos e sempre utilizei o transporte público… Lá funcionava bem para mim. Já aqui em Piracicaba, se vou a pé da minha casa a determinados locais (mesmo a kilometros de distância) chego mais rápido do que se ficasse esperado no ponto de ônibus e depois mais um tempo no terminal de integração, para a troca de linha.
angelica o raffaelli
13 de julho de 2012
Sou piracicabana – moro em Piracicaba atualmente, arquiteta, e tendo morado mais de 20 anos em São Paulo posso dizer que tenho a experiência de viver nessas duas cidades.Em São Paulo usava e sou a favor do transporte coletivo principalmente para se ir ao trabalho.Mas de volta a nossa cidade passei a usar só o carro pois não conseguiria fazer metade das coisas que faço utilizando o transporte público daqui.Piracicaba privilegia o uso do carro e não é por acaso que vemos o aumento das motos pelas ruas da cidade.Falta vontade política e planejamento adequado para viabilizar e aumentar o uso do transporte coletivo.Francamente acho que com o crescimento da nossa cidade até de carro será difícil de circular.Estou aguardando para ver o que vão fazer na região da nova Ponte do Mirante…
Anônimo
13 de julho de 2012
Perfeito o raciocínio. Piracicaba está na contramão da sustentabilidade, e o pior, de carro!
Derly C. Amaral
15 de julho de 2012
Concordo plenamente com seu raciocínio, menos com a parte em que diz: “Arquitetos fazem prédios, não sabem criar cidades.”. Sou arquiteto paulistano, morando em Piracicaba há algum tempo. Nossa titulação é em Arquitetura e Urbanismo, pois ambos caminham de mãos dadas para o equilibrado crescimento das cidades. Piracicaba não tem arquitetura e muito menos urbanismo. Veja o exemplo de Curitiba, onde o prefeito arquiteto e urbanista Jaime Lerner preocupou-se com o planejamento urbano da cidade. O que está faltando aqui é a vontade de fazer uma cidade para todos e deixar de lado os interesse pessoais dos nossos governantes. Nossa cidade possui um instituto de planejamento que serve apenas para servir de base eleitoral para o partido a quem serve. Enfim, enquanto continuar assim, seremos reféns dos que “mandam”.
blogdoamstalden
15 de julho de 2012
Derly. Nossa cidade, assim como a maioria hoje, penso eu, faz o seu “planejamento” não para agradar as “bases eleitorais”, mas interesses econômicos específicos, dentre os quais os das empreiteiras e construtoras. Vc. ouviu falar no processo de “destombamento” que tivemos recentemente? Pois é… se ouviu é um dos poucos. Também houve uma “flexibilização” nas zonas em que se pode construir prédios, inclusive perto do rio. A quem interessa isso??? O que vai acontecer com mais prédios no centro além de um aumento do fluxo de trânsito? No entanto as empreiteiras e os proprietários de imóveis tombados e “destombados” estão rindo a toa. Uma bela casa na Rua do Rosário foi “destombada” e depois, literalmente “tombada”… a trator… Um Abraço e obrigado por participar. Envie uma contribuição em forma de artigo se quiser.
Luis Fernando Amstalden
Antonio Carlos Danelon
16 de julho de 2012
Embora leigo no assunto, mas preocupado com o bem da cidade que amo, me sinto realizado e satisfeito por ter contribuído para o debate de tema tão importante. Mais inda pelo incentivo que recebi de vocês e muito mais por servir de estopim para manifestações de tanta gente inteligente, questionadora, desacomodada e interessada no bem da coletividade. Isso faz renascer a esperança. As eleições estão aí. Pelo fruto se conhece a árvore. Agora é nossa vez. Queremos o coletivo ou o individual? A vida ou a morte? Crescimento ou desenvolvimento? Natureza ou carro particular, já que os dois não se dão no mesmo espaço. Para incrementar o debate apresento algumas notícias da imprensa local e estadual sobre o assunto.
1. Trânsito em Piracicaba mata uma pessoa a cada três dias. Imprudência causa 91% dos acidentes. “A construção de picotes e viadutos por parte do poder público é um incentivo cada vez maior ao uso do carro. Para amenizar o tráfego nas ruas a saída seria um investimento maior em políticas de transporte público. Agnaldo Cesar Pedroso, especialista em trânsito. JP 26.07.11.
1. Frota gigantesca. Recorde em todo o país. São cerca de 240 mil veículos. Para cada três pessoas há dois carros. O secretário municipal de Transito e Transportes de Piracicaba afirma que transporte coletivo é a saída para o problema. A Gazeta, 28.07.11.
2. “Em minha perspectiva, o pedestre é o mais importante. Caminhar é a atividade mais importante na cidade. Tanto pelo lado cultural quanto pela sustentabilidade. Os carros estão em primeiro lugar há 50 anos. Agora é a vez do pedestre”. Alexandros Washburn, diretor de desenho urbano da Prefeitura de Nova York, Folha 29.08.11.
3. Pusemos nossas cidades a serviço dos carros, e deu no que deu – elas ficaram efetivamente hostis. Ruy Castro, Folha 09.09.11.
4. Região de Campinas, onde Piracicaba está inserida, tem o ar mais poluído com material articulado que a própria capital paulista. Mais poluição no Brasil só em Cubatão e no Rio de Janeiro. O principal motivo é a grande quantidade de veículos em circulação. Segundo Edson Tomaz, professor da Faculdade de Engenharia Química da UNICAMP, a quantidade de partículas emitidas pelos veículos é maior que a indústria. É muita poeira, muita fumaça. Tem que tirar carro das ruas. JP 28.09.11.
5. Trânsito deixa 200 feridos por mês na cidade – ao menos 6 por dia. Balanço da SSP aponta para 1.803 vítimas e 37 mortes entre janeiro e setembro deste ano provocadas especialmente pela imprudência dos motoristas. Um técnico de telefonia foi atropelado 3 vezes consecutivas na rodovia Fausto Santomauro. Depois do 1º que não prestou socorro os outros não conseguiram parar. Ele morreu. JP 28.10.11.
4. Com investimento maciço em transporte público, a prefeitura de Seul pôde punir o uso excessivo de transporte particular. Demoliu o minhocão, ressuscitou o rio canalizado e passou a cobrar pedágio em dois túneis centrais.. Folha 06.11.11.
5. “São agradados, (os motoristas) no geral, com pontes, viadutos, alargamento de ruas e avenidas, levados à ilusão de que a circulação vai melhorar. As obres rendem votos (e, quem sabe, ajuda em caixas de campanha), mas não soluções”. Gilberto Dimenstein.
6. “Bilhões de reais que poderiam melhorar imediatamente o transporte Público são gastos em túneis, novas pistas e avenidas que em pouco tempo estarão entupidas”. Oded Grajew, empresário.
7. O número de mortes no trânsito de Piracicaba duplicou no primeiro trimestre deste ano em comparação com 2011. Em 2011 forram 46 mortes JP 02.05.12. SUS repassa R$ 1,7 milhões para atendimento de vítimas de acidentes de trânsito em Piracicaba. O montante, porém não cobriu todas as despesas dos hospitais com os atendimentos. No final de abril Piracicaba alcançou a frota de 250 mil veículos licenciados. O número de carros aumentou 60% nos últimos dez anos e o de motos, maior causadora de acidentes 102%. Os acidentes de trânsito são a principal causa de atendimentos no COT. Afastamentos, aposentadorias, placas, parafusos; um gasto abusivo do sistema público de saúde. JP 02.05.12.
Derly C. Amaral
8 de dezembro de 2012
Obrigado Luis. Desculpe-me mas somente agora pude ler seu comentário. Não sabia do processo de “destombamento”, e curiosamente no início do ano passado, encantado por alguns casarões do centro da cidade estava fazendo um levantamento particular destas edificações pensando em transformá-los em maquetes digitais 3d para disponibilizar no google maps, divulgando assim para todo o mundo, mas não deu tempo pois o “trator borracha” resolveu apagá-los da cidade. Só restaram as memórias. Agora sobre a flexibilização, fiquei sabendo sim. Inclusive temo pela pracinha da Rua Luiz de Queiros atrás da Boyes, fábrica esta que recebeu a flexibilização do zoneamento com o aumento do coeficiente de aproveitamento e da taxa de ocupação, e que certamente terá um adensamento desproporcional para aquela área. Um abraço, grato pelo convite e pensarei sim no futuro em contribuir com um artigo.
blogdoamstalden
10 de dezembro de 2012
Pois é Derly, eu tenho vontade de chorar quando penso em algumas das casas. Este é o capitalismo. Tudo é mercadoria. Patrimônio histórico e cultural não existe. E Monte Alegre vai na mesma linha, você vai ver. Também temo pela praça. Moro perto e tem vários lugares aqui “flexibilizados”. Tomara que você decida escrever. Vou ficar muito feliz. Abraço.
Eloah Margoni
16 de julho de 2012
Arrasou amigão Totó! Arrasou!! Abraços da Eloah