Muitas vezes tenho que escutar as mesmas histórias sobre o quanto “evoluiu” a telefonia no Brasil após as privatizações e devido a elas tudo foi possível. Enfim, é uma longa conversa que estou realmente farto de escutar e em geral as pessoas que fazem estas argumentações apenas repetem, como papagaios amestrados, o que a grande mídia alardeia despudoradamente.
Elencarei as conversas mais tradicionais e os fatos verdadeiros logo em seguida, para que fiquem claras as razões de como e porque as mudanças ocorreram. E nem todas as mudanças foram boas e nenhuma delas ocorreu sem um aumento de custo brutal para a população.
Em minha visão de Estado, discordo do Estado controlando tudo na vida do cidadão, prestando serviços desnecessários como supérfluos. Porém, o básico deve ser fornecido pelo governo e, no que tange a cobrança, ela deve ser feita, porém sempre visando a manutenção da estrutura, como eram as estatais do passado. Porém como todos sabemos, o atendimento das estatais estava muito aquém das necessidades da população devido a diversos problemas estruturais que poderiam ser resolvidos aplicando uma política de gestão eficiente (vide a Petrobrás). E é exatamente nesse ponto que a prosopopéia flácida das privatizações ganhou força!
Vamos aos mitos.
Mito número 1 – Antes da privatização a população não tinha acesso em larga escala a telefonia devido a baixa disponibilidade de linhas e a privatização acabou com isso.
De fato havia um déficit colossal entre a necessidade das linhas e a oferta. Quem não se lembra das imensas listas de espera? Pois é, porém o mito não reside aí e sim que foi a privatização quem aumentou a oferta!
Essa é a coisa que para quem é do ramo de tecnologia como eu não gosta de escutar. Qualquer um que conheça a Lei de Moore, que é uma profecia tecnológica dita nos anos 70 feita pelo fundador da Intel Gordon Moore que diz que a cada ano e meio o poder de processamento dos equipamentos digitais duplica, entenderá que o processo de massificação das linhas a custos módicos ocorridas nos anos 90 tem mais a ver com a evolução tecnológica do que com a doação de nossas estatais.
Para se ter ideia, um enlace E1 comporta até 32 linhas digitais no mesmo par de fios que outrora passava uma única linha. Uma central de comutação telefônica digital tem o tamanho e o TCO (Total Coast of Ownership) até 10 vezes menor que as obsoletas centrais de relês. Por aí deu pra ver a verdadeira expansão da oferta como ocorreu e com custos mais baixos e não foram as privadas (sem trocadilhos) quem fizeram o investimento como veremos no próximo mito.
Enfim, ficou evidente aqui que o que aumentou a oferta foi o avanço tecnológico e não a troca de mãos da telefonia como todos gostam de apregoar.
É muito apreciado pelo público pró-privatismo dizer com toda pompa possível: “Antes da privatização celular era artigo de luxo”. Sempre acabo, com minha ironia de ir na ferida, questionar a esses defensores da privataria como que no tempo de Dom Pedro ele não usava carro?
Usar anacronismos é uma tática que confunde certamente os mais incautos.
Mito número 2 – As companhias privadas investiram rios de dinheiro na modernização da telefonia.
Mito puro! Desde 1995 até 1997 a TELESP passava por um profundo processo de digitalização de suas CPA (centrais telefônicas) e que o Estado bancava tudo ainda. Eu trabalhava praticamente o tempo todo em contato com esse pessoal e vi a coisa acontecer debaixo de meus olhos.
A central telefônica da Vila Rezende, moderníssima por sinal na época, foi instalada em tempos áureos de modernização da telefonia que o país todo passava. Quem se lembra dos antigos pulsos dos telefones? Nas linhas 421 (hoje 3421) os telefones já usavam discagem por tom! Era o progresso andando a passos largos. Logo depois veio a digitalização das linhas 3422 e que seguiu-se modernizando durante os anos seguintes.
Porém, o grosso do dinheiro foi investido antes da conversa de privatização e em 97 comecei a escutar que nossa Telesp seria doada para um grupo europeu. O resultado nós conhecemos hoje. Várias vezes campeã de reclamações do PROCON por aqui.
Mito número 3 – Não compramos mais hoje linhas telefônicas e qualquer um pode ter.
Esse é provavelmente o mito mais difícil das pessoas enxergarem talvez porque a maior parte da população se lembra do absurdo que era antigamente. Havia investimento em linhas telefônicas para aluguel pois ter uma linha era algo muito caro para se comprar. Custava mais de Us$ 1.000,00 para ter uma linha em casa e a grande maior parte da população não possui essa quantia guardada debaixo do colchão. Era mais fácil alugar uma linha do que comprar e esperar ela ser instalada.
Porém, o que nunca é questionado é que na verdade hoje você paga eternamente pela sua linha e paga muito mais que antigamente. Após a privatização, o custo da telefonia subiu mais de 400% (quatrocentos porcento) em alguns poucos anos e também instituiu-se a taxa obrigatória.
Oras, qual foi a mágica da massificação das linhas? Financiamento altamente lucrativo para os banqueiros. Você pagava pela linha, porém em suaves parcelas da taxa mínima de pouco mais de R$ 30,00. Com essa taxa, você usando ou não, estava pagando e antes não era assim. Em 8 anos pagando essa taxa, você já pagou com sobra o antigo investimento inicial de Us$ 1.000,00 de outrora com a diferença que continuará pagando e paga até hoje.
Então o aumento astronômico das tarifas somado com a “taxa mínima” mascarou aquela coisa de pagar uma fortuna pra ter uma linha. O que houve foi um financiamento das linhas e que na prática resultou num aumento muito grande para o consumidor.
Mito número 4 – A privataria acabou com o monopólio.
Aqui tangimos em uma questão muito delicada que é a falácia do fim do monopólio. Na verdade trocou-se o ruim monopólio público pelo monopólio privado. O governo de Fernando Henrique garantiu 5 anos (que acabaram na prática se tornando 10 anos) de monopólio para as empresas que ele doou as antigas estatais.
Oras, se ele tirou o monopólio da estatal e jogou para seus amigos privados, então não houve fim do monopólio, houve a troca de mãos.
Mito número 5 – A qualidade hoje é infinitamente superior e tem muito mais recursos
Outro mote da campanha da privatização é: Hoje a qualidade das linhas é muito melhor que em outrora.
Este mito está intimamente ligado ao primeiro e só pergunto a você, caro leitor, por que o velho fusca não tem os mesmos recursos de um carro de mesma faixa de mercado dele só que atual? Ou ainda, por que a TV de hoje pega muito melhor, muito mais bonita, gasta menos e dá muito menos problema?
Por acaso as montadoras de carros e fábricas de TV eram estatais antigamente? Pensem nisso antes de levar a sério e adiante o mito número 5!
Mesmo assim, com o avanço tecnológico capitaneado pela evolução digital (aquela de que a cada 18 meses o poder dos chips dobram), não devemos nunca esquecer que as companhias de telefonia no Brasil estão sempre entre as piores do mundo e é a segunda mais cara do mundo!
Além das críticas
Até agora, se vossa teve paciência de ler esse texto aqui, gostaria de propor alguns exercícios que vão além das críticas e que são sugestões para melhorar e baratear os serviços públicos.
Não sou contra a iniciativa privada explorar os serviços públicos, mas sou veementemente contra ela explorar sozinha tais beneficies a população.
A volta do sistema Telebrás – incluindo uma companhia federal e as demais estaduais – apenas para fornecer os serviços básicos e sem objetivo de buscar o lucro seria o primeiro passo para alimentar a concorrência.
Assim como assistimos no caso dos bancos e seus juros estratosféricos, vamos assistir as companhias privadas aprimorando seu atendimento e tentando conseguir melhores tarifas e produtos melhores que o básico oferecido pelas estatais. Aí todo mundo sai lucrando: população e companhias e é esse o ideal.
Só peço ao leitor para que reflita sobre estes mitos que trouxe aqui e compare com os fatos. Que seja isento de suas paixões políticas-ideológicas e tentem analisar os fatos pelo aspecto lógico. Também peço para que pesquisem as informações aqui trazidas de forma crítica.
Eduardo Stella é desenvolvedor de sistemas e trabalha com tecnologia há
20 anos.
João Humberto Venturini
9 de agosto de 2012
Perfeita essa análise, pois é embasada tecnicamente para derrubar a falácia da privataria das Teles. Vale lembrar q essa privataria foi p/ atender interesses privados e não o interesse público. Um dos maiores beneficiários dessa privataria foi ninguém menos do q Daniel Dantas, o qual enriqueceu tanto q até hj tem uma bancada no congresso em sua defesa. No governo FHC ele deitou e rolou tanto q o próprio FHC o descreve como “brilhante”.
Esse texto deveria ser publicado nos jornais aqui de Piracicaba.
Parabéns Eduardo!
celso bisson
10 de agosto de 2012
a farsa da privatização perfeita começa aparecer…
Rafa Renneberg
17 de outubro de 2012
Muito Bom, obrigado por compartilhar essas informações importantes, irei divulgar !
Anônimo
5 de dezembro de 2012
uhauahuahuah, PTista burro. Só rindo mesmo.
Anônimo
6 de dezembro de 2012
Hoje estive na câmara de vereadores de Piracicaba e vemos que o próprio SEMAE está passando por algo semelhante.
Antonio Carlos Hoff
16 de dezembro de 2013
Uma analise completamente desvirtuada da realidade e da verdade. Você nunca usou telefonia na época em que se pagava 3.000,00 para se ter uma linha que demorava um ano para instalar. Você nunca teve uma tele-entrega e precisou os serviços para consertarem os teus telefones. Você nunca precisou ir no centro na CRT(isto em 1983) para ligar para uma cidade do interior. Desde quando os serviços são mais caros hoje. Isto é tão irreal que não é nem preciso falar em custo de impulsos, isto sem imaginarmos o que representava as possibilidade de se obter linha. Tive empresa cujo custo maior era telefonia, além da dor de cabeça. E sei o que representa hoje a agilidade da telefonia celular. Pela tua hipótese quem arcou com custos deste sistema foi jesus cristo. É óbvio que existem problemas mas se imaginarmos que hoje temos centenas de vezes de pessoas com acesso e com condições de ligação, é um desproposito a sua tese. Agora se analise é do ponto de vista dos funcionários das teles privatizadas ou do de uma avaliação partidária você esta com a razão.
Eduardo Stella
16 de dezembro de 2013
Prezado Senhor Antonio,
Tudo o que disseste já está bem explicado no texto. Pediria o obséquio de lê-lo atenciosamente e analisar todas as poderações e se desejar, desconstruir o texto através de argumentos. O que coloquei são fatos e não é uma tese.
PS: Se se refere ao custo da ligação interurbana, realmente essa era mais cara. Mas a local hoje é muito maior.
Anônimo
17 de dezembro de 2013
Eduardo Stella
De novo esse papo?
E de novo uma teoria da “Lei de Moore”?
Conselho: faça um stand up comedy. Os inteligentes acharão graça nas
Suas piadas.
Daisy Costa
17 de dezembro de 2013
Eduardo, como sempre, mentes brilhantes contribuem com a sociedade. que necessita de esclarecimentos coerentes e eu, que vivi as duas realidades, agora entendo o ‘porquê’ de muitas situações… Vejo que realmente, vc tem toda a razão! Parabéns e obrigada por partilhar seu conhecimento!
Eduardo Stella
18 de dezembro de 2013
Olá Daisy,
Agradeça mas não vejo nada de brilhantismo nessa visão, apenas é fruto de observações e análises vistas do prisma da “lonjura” da cegueira ideológica. São os fatos! Na verdade, trocaram o monopólio público pelo privado, o que causou apenas o aumento do preço e disponibilidade de oferta, porém com detrimento da qualidade.
Voltando a analogia proposta, essas comparações de “qualidade” que fazem … que antigamente não tinha celular e nem Internet são completamente descabidas. É a mesma coisa que comparar um Ford Fusion 2014 com o velho Ford T … e ainda reclamar que o velho modelo 1929 ele não tinha MP3 ou Bluetooth …
Eduardo Stella
27 de dezembro de 2013
Contrato tem que se cumprir … não importa que parte não ache interessante … e agora?
http://www.redebrasilatual.com.br/mundo/2013/12/governo-argentino-cogita-estatizar-servico-apos-novos-cortes-de-luz-499.html
Fabio
25 de junho de 2020
Muito bom.
Esse artigo fala da evolução da tecnologia, inclusive das linhas fixas já que na telefonia celular até os mais burros podem entender que se trata de uma tecnologia que só se popularizou no mundo todo na década de 90.