
A travesti Abelha foi morta dentro da pensão que gerenciava em Piracicaba (Foto: Thomaz Fernandes/G1)
Pretendia escrever sobre identidade de gênero, no momento em que li a notícia: “Travesti de 60 anos que alugava casa a prostitutas é morta em Piracicaba” no G1 – Piracicaba.
E o que era pra ser um texto informativo, talvez ganhe força de indignação, sei que uma notícia dessas está cercada de outros fatores que não só a homofobia, ou nesse caso, transfobia. Entendo que a prostituição e o envolvimento com drogas são fatores que colocam a classe das pessoas que vivem da prostituição em um nível de risco maior que as demais pessoas, independente do gênero, identidade de gênero ou orientação sexual, essas pessoas são mais vulneráveis a esse tipo de crime.
Em agosto do ano passado, a travesti Larissa, que trabalhava com Abelha, foi morta em Piracicaba, também com três tiros, esse caso ganhou real notoriedade pela beleza da travesti e o estado em que se deu a sua morte.
Esses são casos de destaques, mas a realidade é ainda bem mais cruel e os números de crimes semelhantes são assustadores.
Não pretendo aqui fomentar a discussão sobre a vida promíscua ou os riscos inerentes a profissional do sexo, e nem levantar dados sobre crimes que ocorrem a elas pelo fato de serem travestis ou por se prostituírem. O que trarei aqui é a questão mais elementar, quais as condições que levam uma pessoa a prostituição? Quais os motivos que levam uma menina ou um menino a se aventurar em um mundo obscuro, perigoso e sem certeza de lucro ou de voltar com vida ou saúde para casa (alguns não têm casas, foram expulsos de seus lares, habitam lugares que cheiram a creolina, semelhante à casa que Abelha mantinha). Quais oportunidades a educação? Quais as oportunidades de empregos? Quais as oportunidades de convívios sociais e por fim, quais as oportunidades de afetividade que essas meninas e esses meninos que se prostituem tiveram? Esse sim é fator de homofobia. Explico:
A aparência de quem vive a transcendência do gênero é sem dúvida algo que choca a sociedade, no início, pegando o caso da mulher transexual, o menino começa usando pequenos acessórios femininos e termina por modificar cirurgicamente e através de hormônios a aparecia, na maioria dos casos, já na fase adulta. Esse processo que passa por diversas fases é o que mais causa transtorno na vida do indivíduo transexual, por uma rejeição social somada aos conflitos internos e emocionais que o indivíduo sofre.
Na escola, e já muito cedo, o indivíduo sofre com o que é percebido pelos coleguinhas de sala, professores e pais de outros alunos, como comportamento inadequado. A criança, que já tem tendências a se identificar com o gênero oposto, começa a utilizar recursos de maquiagem, cabelos e unhas, e ao serem rejeitas, criticadas, zombadas (o que hoje em dia é comumente conhecido por “bullying”), percebendo não fazer parte daquele grupo social à maioria das transexuais e travestis abandona a escola, o que definirá sua condição profissional para o resto da vida.
Entre os aqueles que vivem a transexualidade masculina (pessoas que nasceram do sexo feminino, mas se sentem e se percebem como do sexo masculino) esse problema demora a aparecer, uma vez que socialmente as mulheres têm mais liberdade na forma de como usar roupas e cabelos.
Já na fase adulta e transformada parcial ou em sua totalidade, no que viria a ser a adequação do gênero, esse individuo transexual não consegue um emprego que o sustente e sane suas necessidades mais básicas e lhe proporcione dignidade, isso devido à baixa formação acadêmica que já lhe foi castrado, direito garantido na constituição à educação, mais também a falta de oportunidade dado em ambientes profissionais. Questiono a você, leitor, quando foi à última vez que viu uma travesti ou uma transexual trabalhando em algum estabelecimento? Atendendo em uma loja de sapatos, ou em uma padaria? Estou citando as funções mais básicas da sociedade, para não questionar ambientes administrativos, onde o zelo pela beleza e padrões é quase uma ditadura, lembro-me de uma época onde os currículos deveriam acompanhar foto do(a) candidato(a).
Não negarei a possibilidade de que alguns profissionais do sexo tenham entrado nessa vida “fácil”, por escolha, mas não creio que essa seja a regra. Primeiro que deitar-se com estranhos e alimentar os mais diversos fetiches por troca de dinheiro, de pouco dinheiro, correndo os perigos da noite em esquinas de guetos, dividindo espaço com todo tipo de pessoa e que possuem os mais diversos juízos de valores, não me parece ser uma vida realmente fácil.
Essas meninas aprendem cedo a lidar com a violência, a apanhar nas ruas por quem faz cumprir as leis, mas também por quem as desobedecem sem menor receio de punição. Já no início de suas existências descobrem o que é viver da noite, dos crimes, das drogas, dos abusos, das piadas.
Morei muito tempo no centro de Piracicaba, e ao passar pelas ruas deparava-me com algumas profissionais do sexo e não sei quantas vezes presenciei jogarem latinhas de cervejas dos carros, sem falar as agressões verbais, em alguns momentos vi serem tratadas semelhantes aos cachorros sarnentos com quem dividiam espaço (e olha que dos cachorros também sinto uma dor no peito, ao ver suas condições).
É, essa vida não merece o título de fácil. Imagino Berenice conhecida como Abelha, ou Beia, que sobreviveu a esse mundo por sessenta anos, antes de ser executada com três tiros, ser uma vitoriosa. Não que sua vida tenha sido um exemplo, ou que tenha cometido, ou não, diversas coisas erradas, ou moralmente inaceitáveis, mas por ter vivido na pele por longos sessenta anos toda a rejeição social e que provavelmente até pós-morte sofrerá essa rejeição.
Por fim trago um último questionamento, os homens que desfrutam dos serviços das travestis, quem são eles? Seriam os mesmo que jogam as latinhas, ou ainda, seriam os que levam seus filhos e esposas ao zoológico?
Antes de condenarmos uma travesti, pensemos na conduta social como um todo e principalmente na responsabilidade que nos cabe nessa história.
Evandro Mangueira, Nascido em 1979 na cidade de Cajazeiras, que tem por título “A cidade que ensinou a Paraíba a ler.” Atualmente mora em Piracicaba-SP, cidade que adotou como sendo sua também. Tem por formação Gestão Financeira, mas encontra-se nas letras tanto quanto se encontra nos números.
Autor do livro: Arcanjo Gabriel
Carla Betta
10 de abril de 2013
Bem escrito, bem colocado, bem argumentado. Faço a mim a s mesmas indagações e observo os mesmos comportamentos.
Fui professora de pré-escola e havia um menino, menino mesmo, pré-escolar, cuja preferência eram as bonecas e dizia em bom tom que gostava de brincar com as meninas. Era afeminado.
E é isto o que me intriga: por que ser uma caricatura de mulher ou uma caricatura de homem? É só isto o que não considero natural e me é estranho.
Não tenho resposta alguma, nenhuma opinião definida, mas o que terá acontecido ao menino sobre o qual comentei? Terá continuado a se comportar naturalmente afeminado? Ou estará com trejeitos caricatos de uma mulher?
Por que algumas homossexuais femininas se parecem mais com rudes machistas que com os próprios homens com os quais convivemos?
Antonio Sebastião Hilario
10 de abril de 2013
concordo plenamente com as colocações principalmente aonde diz sobre os homens que desfrutam dos serviços das travestis que durante o dia se fazem de santos.
Evandro Mangueira
10 de abril de 2013
Uma Observação: Ao que me consta a Larissa era cabeleireira, a informação de que ela trabalhava na casa da Abelha, saiu no G1 na mesma nota que falava da morte da Abelha. E somente por isso coloquei essa informação.
WILLIAN
12 de abril de 2013
NOSSA VOCE NÃO SABE O QUI FALA CARA JUGA AS PESSOAS SEM A CONHECER A CASA DA ABELHA NÃO CHEIRAVA CREOLINA E SIM ESSENCIA DO CAMPO PARA DISFARÇAR O ODOR DOS QUARTO DAS GAROTAS QUE NÃO LIMPAVA O QUARTO ELA ERA UMA PESSOA MARAVILHOSA VOCE NÃO TEM O DIREITO DE FALA MAU DA ABELHA
Evandro
13 de abril de 2013
Willian, não falei mal da abelha, pelo contrário, na verdade a reconheci como vitoriosa. De fato não tenho direito de falar de quem não conheço, embora eu a tenha conhecido em certa ocasião e aparentemente era uma boa pessoa.Já ouvi diversos depoimentos falando de sua generosidade. Acredito que a palavra que o tenha ofendido seja a “creolina”, o que quis dizer era que habitam lugares semelhantes a casa da Abelha. Mas convenhamos, muitas pessoas que se prostituem são subordinadas a viverem em lugares sujos sem a menor higiene. Agradeço a sua colaboração, e peço, encarecidamente para reler o texto e observar a parte em que falei que considerava a sua vivência em um mundo tão distorcido de valores, uma vitória.
Anônimo
20 de abril de 2013
foi tarde bicha loca
blogdoamstalden
20 de abril de 2013
Você, além da sua covardia por não colocar seu nome, ainda demonstra a homofobia. Vou manter o post porque é didático. Seja “homem” e assine o que escreveu.
Anônimo
20 de abril de 2013
foi queimar com o capeta estorquia os viado na rua coisa brava morreu tarde
blogdoamstalden
20 de abril de 2013
Eu devia apagar o post… mas vou deixar só para demonstrar sua covardia em não colocar seu nome.
Carla Betta
22 de abril de 2013
Voltei a ler este texto do Evandro por nenhuma razão específica e me deparo com estes comentários sem nível algum deste -Anônimo- e discordo, Amstalden, este post deveria ser retirado pela ignorância e linguajar chulo_ não por discordar do texto e nem por emitir uma opinião, apesar de covardemente. Mas, pelo desnível desses comentários sem argumentação. Desde pequenos, meu filhos aprenderam que “porque sim” e “porque não” são argumentações burras e, quando articulavam suas razões havia de ser com lucidez argumentativa, ainda que dentro de seus parâmetros infantis. O sr. Anônimo está abaixo do infantil, que triste!
Evandro
4 de maio de 2013
Carla, Não sei se é didático ou não manter os comentários do “anônimo”. Acho na verdade que ele (ou ela) conhece a respeito do pedágio cobrado por quem vivia nas ruas. Eu mesmo, não sei se é verdade essa cobrança de pedágios, mas como não duvido de nada nessa vida, tomo por verdade. Acho lastimável, pessoas recorrerem ao anonimato para expressar suas verdades, de forma tão pejorativa, mas creio que isso também é culpa de uma questão social mais ampla. Ele (ELa) tem o direito de não gostar da Abelha, pra falar a verdade a crítica nem foi ao meu texto, foi a forma de vida que a Abelha levava. Mesmo não concordando com o senhor Anônimo, acho que ele (ela) é mais uma vítima do sistema. Tamanha agressividade nas palavras, tanto ódio expressado, é reflexo de um movimento que vem ocorrendo muito mais sério e amplo, que são as falas enérgicas de fundamentalistas que atuam na TV aberta e cada dia mais no poder público. É contra essa gente, que tem conhecimento e dissemina o ódio a minorias, alavancando um ódio em massa (Pessoas de fácil manipulação, devido a carência acadêmica e de informação). Para mim, o(a) anônimo é tanto vítima do sistema como a Abelha.
Evandro Mangueira
3 de maio de 2013
Enfim, o texto é para ser lido por quem concorda, discorda. Acredito da transformação, o que lê, mesmo descordando termina por assimilar algo.
Ao professor Amstalden, creio que exista um recurso nas configurações, onde a pessoa só poderá comentar se estiver logado, saindo do anonimato, acho que seria no mínimo respeitoso, se as pessoas fossem obrigadas a se identificarem. (Mesmo com o recurso Fake)
blogdoamstalden
4 de maio de 2013
Evandro, sinceramente eu não sei se existe este recurso. Vou ver. Eu sou muito analfabeto nos recursos digitais. Em tempo, este “anônimo” publicou outros comentários que eu retirei, daí ele desistiu. Quanto ao comentário que deixei, penso que ele “ilustra” um pouco o quão complicada é a questão do preconceito. Talvez eu não tenha feito bem em mantê-lo, mas achei que era ilustrativo. Imagine o que se diz por aí, a viva voz, sobre a questão? Mas talvez eu deva retirar mesmo. Vocês estão com a palavra. Abs.
Evandro Mangueira
3 de maio de 2013
discordando*
WILLIAN DASAOLE
3 de maio de 2014
A SIM APOS MUITO TEMPO TORNEI A VER SEU BLOG, NA ÉPOCA ESTAVA TRANSTORNADO COM A MORTE DA ABELHA. VALEU PELO RECADO EU GOSTAVA MUITO DELA UMA PESSOA QUE ME FAZ MUITA FALTA. ABRAÇOS AMIGÃO DESCULPA PELO MAU INTENDIDO.
Evandro Mangueira
24 de junho de 2014
Willian fico feliz que tenha voltado ao blog!
Anônimo
25 de janeiro de 2015
Valeu obrigado estou sempre espiando! Bom final de semana.
Valdecir Domanski
2 de março de 2023
Bom, do ponto de vista criacionista, nunca existiu o terceiro ou quarto sexo, mesma coisa dependência química, na maioria das vezes ninguém está lá porque quer, e sim por uma série de fatores sociais, emôcionais, hormônais etc, oque falta talvez seja acolhimento destas pessoas já no fim da vida, pois quanto a entrarem ou não o estado nunca conseguirá regular, cabe sim a cada família estruturada ou não educar os filhos com valôres, e não lhe dar uma misêra cartilha onde ele pôdera escolher sua opção sexual, oque no meu ver é como um tiro de misericórdia, pois se nasce homem ou mulher, “não indefinido”, note que todos os homens que usam o serviço destes profissionáis ou não, o fazem por lazer e quase nunca por interesse em formar família, já que anatômicamente não o podem tanto a mulher como homem em papéis inversos, oque querem impor também é que tais casais adotem, e é nessa fase que tal patôlogia se agrava, como uma criança crescerá em um lar chamando de mamãe mamãe ou papai papai ? fato já comprovado já que esses mesmos casais que cita como “vitimas”, acabam por abusar e erótizar essas crianças precocemente, cabe ao poder público também oferecer auxílio psicosocial a individuos que queiram fazer o caminho inverso. Quanto a oportunidades, sempre existirá a concorrência , se uma pessoa tiver “QI”, elevado, não importa sua condição social ou de gênero se ela quiser sair de lá ela sai, quanto a aceitar ou não conviver é relativo, já que todos estamos sujeitos as mesmas leis como sociedade organizada e que visando esse mesmo eleitorado o atual governo se beneficia disso não por amor, mas oportunismo, penso que oque resta para essa classe é conviver com as consequência de suas escôlhas sejam elas boas ou más, pois não adianta remover cirrurgicamente o órgão ou mesmo querer implantá-lo em mulher, ou mesmo querer fazer a união em altar pedindo bençãos divinas, fato é que não poderão impor se a padres e pastores pra aceitarem, pra isso teriam que ivalidar a bíblia sagrada, na qual sempre houve e sempre haverá condenação a tais práticas por um Deus que presa por moral. Caso contrário é sempre mais fácil aceitar o darwinismo e procurar o tal elo perdido que nos liguem ao macaco sendo que estes obedecem mais as leis divinas do que o próprio homem..