Saudades de Maio que não Vivi. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 15 de maio de 2013 por

6



maio-68-contre-la-repression

Em maio de 1968, a juventude mundial  vivia uma contradição. Por um lado tinha cada vez mais acesso a informações e a própria cultura. Na Europa e nos EUA, o ensino público de qualidade no segundo grau (hoje ensino médio no Brasil) e nas universidades públicas, incitava os alunos à reflexão e, portanto, à crítica. Por outro lado, tanto suas vidas quotidianas quanto a vida política mundial estavam “engessadas”.

A sociedade esperava desta geração pós guerra o enquadramento, o conformismo. Esperava que eles se formassem, arrumassem um emprego nas empresas multinacionais (no ocidente) ou em uma fábrica estatal ou nos partidos comunistas (nos países socialistas), se casassem, tivessem filhos e não contestassem as autoridades estabelecidas tanto no ocidente quanto no oriente. Mais ainda, esperava que eles fossem à guerra sem questionar, em nome do patriotismo, e morressem pelos interesses geopolíticos de seus países.

Mas a reflexão, o livre pensamento, o acesso às informações moldaram outra situação. Moldaram jovens capazes de duvidar, questionar e sonhar com outro mundo, outra forma de viver, longe do controle político dos estados e das empresas.

Em Paris, um conjunto de medidas do General De Gaulle que alterava a política educacional foi o estopim. Os estudantes entraram em greve e daí passaram às manifestações nas ruas e ao enfrentamento com a política. Na França os operários apoiaram os estudantes e entraram também em greve, mas o movimento se espalhou mais. Na Alemanha, Holanda, Bélgica, Portugal, Tchecoslováquia, Estados Unidos, México, Brasil e até no Japão, revoltas estudantis explodiram e tomaram as ruas. Em cada país o movimento assumia tons próprios, como o combate à ditadura no Brasil, a exigência da saída das tropas americanas do Japão e da Alemanha nestes países, o pacifismo e os direitos de índios e negros nos EUA. Em meio a tudo, algumas posições eram mais ou menos comuns, tais como o desejo de liberdade sexual, a busca de uma democracia plena, o questionamento do autoritarismo.

Artistas, músicos, atores, intelectuais se engajaram e, até os Beatles compuseram “Revolution”, cuja a guitarra no início parece uma sirene chamando os jovens para a luta.

Dentro de grupos diversos em países diferentes, outros temas foram fortalecidos, tais como o feminismo, e o ambientalismo. Em busca de novas formas de pensar, as religiões e filosofias orientais foram popularizadas e até o uso de drogas chegou a ser visto como uma maneira de “libertar a mente” de velhos padrões de pensamento.

Em maio de 1968, os estudantes acertaram e também erraram muito. Alguns foram mortos e outros escolheram o caminho da luta armada e acabaram por matar. Mas seja como for, errando ou não, os jovens de 68 ousaram existir e sonhar com um mundo diferente.

E hoje?

Hoje o socialismo desapareceu e o capitalismo,  que “transforma tudo em mercadoria”, parece ter domesticado a maioria  dos jovens.  Aparentemente eles ainda são rebeldes, mas sua “rebeldia”  não passa de dirigir sem habilitação, beber, brigar na rua, depredar patrimônio público, não estudar e adotar uma estética eternamente infantil, composta de bonés pequenos demais para suas cabeças e calças que caem pela cintura. Não por coincidência, estes “itens de moda rebelde” são amplamente divulgados pela propaganda e vendidos nos shoppings. Os jovens continuam parecendo rebeldes,  mas são dóceis quando se trata de questionar o mundo em que vivem, os governos que os controlam e as empresas que direcionam suas vidas através do consumo.

Alguns são exceção, é verdade, mas a regra da maioria é esta docilidade no que diz respeito ao coletivo.

Em 1968 os jovens iam para as ruas protestar. Hoje a maioria vai aos shoppings consumir. Tenho saudades deste maio de 68 que não vivi. Mas tenho esperança de que uma nova juventude, mais consciente e crítica, volte a existir.

jovens-no-shopping1

Posted in: Artigos, Vídeo