Tempo, tempo, tempo, tempo… … … Por Carla Betta

Posted on 29 de maio de 2013 por

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armandinho não adianta

Oração Ao Tempo. Caetano Veloso

Gosto de me considerar uma pessoa não-nostálgica, que não diz: “No meu tempo…” e que ama o passado naquilo que ele tem de lúdico e naquilo que o faz necessário para a compreensão do presente. Escrevo em uma fanpage, denominada “Diário de Bordo_Reminiscências” apenas por ter percebido que tantos episódios relatados aos meus filhos, lhes eram absolutamente não-conhecidos! Mas, encaro o novo e o moderno com curiosidade e alegria, antes até de aquilatar se é bom ou não.

Vi a casa de meu bisavô e uma casa nossa em Santa Rita do Passa Quatro serem derrubadas e construírem outras em seus lugares – por que não? Na mesma praça da casa de meu bisavô, reformaram uma igreja bonitinha e reconstruíram-na horrorosamente. Nem tudo que é novo é melhor.

Sou da geração que assistiu à queima de soutiens (mas não queimei nenhum, apenas deixei de usá-los) e agora observo a moda impositiva do silicone nos seios.

Comemorei a Lei que desobrigou as mulheres a acrescentarem os sobrenomes do recém-marido aos seus e observo moças, bem mais jovens do que eu, fazendo questão de mudarem seus nomes: estariam mudando de identidade também?

Em 1964, completaria cinco anos, então, não vivi maio, assim como o Luis Fernando Amstalden (referência ao seu post: “Saudades de maio que não vivi”), eu não participei deste momento tão revolucionário, mas ele ecoou nas minhas rebeldias, em meus questionamentos, em minhas atitudes. E na de muitas gerações.

No primário, atual Ensino Fundamental I, levantávamos da carteira quando entrava o/a professor/a, na visita do/a diretor/a em classe e só nos sentávamos quando nos era permitido.

Na revolução dos costumes, até há pouco tempo atrás, não sabia se chamava meus pais e tios de senhor/a ou você. Fiquei com senhor/senhora. Pedia a bênção a meus avôs e deixei de fazê-lo. Como tenho saudades disto! Como tenho saudades deles!

Hoje em dia, alunos e pais têm comportamentos tão violentos e tanta autoridade foi tirada dos professores, que o prestígio e até certo “glamour-intelectual” não existe mais. Quase ninguém mais quer lecionar! (Fato noticiado com alarme).

Aprendi em alguma aula que o processo de mudança passa pela tese, antítese e síntese. Mas… não está muito “anti” esta antítese? Por que a síntese demora tanto a chegar? Isto é, quando retornaremos ao bom-senso?

A cada ano que passava eu, além de observar, senti “na pele”, pois meus filhos estudaram em escola pública, o declínio da qualidade da educação e o descaso dos governos para com esta necessidade, eu me perguntava: Qual a consequência? Onde isto irá parar? Em crescente caos, em estudantes que chegam às universidades sem saberem sequer pensar!

Por mais que a tecnologia se desenvolva, pesquisar, descobrir novos conhecimentos requer saber anterior, estudos, capacidade de concentração e persistência diante dos fracassos.

Sonhávamos com relações familiares mais democráticas, que não nos ressentíssemos tanto com os nossos pais e pulamos uma parte do caminho para relações saudáveis e de repente liberdade se transformou em falta de respeito para com os outros e comodismo para com o trilhar da própria vida.

“Primeiro levaram os negros, Mas não me importei com isso. Eu não era negro. Em seguida levaram alguns operários, Mas não me importei com isso. Eu também não era operário. Depois prenderam os miseráveis, Mas não me importei com isso, porque eu não sou miserável. Agora estão me levando. Mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém, ninguém se importa comigo.”

Bertolt Brecht

“O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética… O que me preocupa é o silêncio dos bons.”

Martin Luther King

 

Nós nos silenciamos, deixamos o barco correr ao sabor da maré na euforia do estado democrático e das liberdades conquistadas, paramos de escandalizar e nos conformamos_ até quando?

 

“Ah! Desgraçados!
Um irmão é maltratado e vocês olham para o outro lado?
Grita de dor o ferido e vocês ficam calados?
A violência faz a ronda e escolhe a vítima,
e vocês dizem: “a mim ela está poupando, vamos fingir que não estamos olhando”.
Mas que cidade?
Que espécie de gente é essa?
Quando campeia em uma cidade a injustiça,
é necessário que alguém se levante.
Não havendo quem se levante,
é preferível que em um grande incêndio,
toda cidade desapareça,
antes que a noite desça.”

Bertolt Brecht

 

O tempo urge! Para que possamos reverter este quadro que nos assola, esta pintura que nos sufoca, é preciso comover os corações e as mãos. Antes que a noite desça.

O que nos fez calar? Como bem argumentou Antonio Camarda no post do Luis Amstalden, os jovens foram robotizados com conhecimento de causa, isto é, pelo “status quo”, usando as ferramentas da propaganda, do conhecimento de teorias psicológicas e do poder para neutralizar o “poder jovem”. (Sem ser uma referência a Carlos Drummond de Andrade e sua crônica homonima) Mas, não somos detentores destes mesmos saberes? Por que cruzamos palidamente nossos braços?

Nascida com o nome Carla Ramos Bettarello, adota o Betta e assume-se como Carla Betta, pela invenção de um amigo. Mais tarde, descobre que seu pai era conhecido assim em seu tempo de faculdade. Mãe coruja assumida de um casal maravilhoso e lindo de filhos. Conta e se encanta com as histórias: objeto de estudo e prática artística.