Coluna do Evandro. Félix: o vilão.

Posted on 12 de agosto de 2013 por

9



felix

Quarta-feira dia 07/08, na Escola Estadual Professora Juracy Neves de Mello Ferracciú, no bairro Noiva da Colina – Piracicaba, uma professora compara um aluno com o personagem Felix, homossexual vivido por Mateus Solano em “Amor à Vida”.

E isso virou notícia!

 

http://g1.globo.com/sp/piracicaba-regiao/noticia/2013/08/professora-chama-aluno-de-felix-da-novela-e-mae-faz-bo-em-piracicaba.html

 

Segundo o G1, a mãe disse que amaria o filho mesmo se ele fosse homossexual, a professora e órgãos competentes disseram que não passou de uma brincadeira. O site também informou que após a comparação os demais alunos fizeram piadas e riram e o menino envolvido chorou!

Não defenderei a professora, nem a condenarei por homofobia, pois a reflexão que cabe aqui é outra:

Porque tal comparação foi ofensiva? Quais os valores que carregamos para que ao sermos comparado com um homossexual seja tão devastador?

No decorrer de minha vida fui, e ainda sou, comparado diariamente com heterossexuais, sem falar nas afirmações que ouço sobre minha suposta “heterossexualidade” e isso nunca me ofendeu, em alguns momentos incomoda pelo fato de que pessoas ficam surpresas com a verdade e eu tenho que explicar diversas coisas, mas não ofende. E porque o inverso é tão constrangedor? Tão usado para chacotas e difamações?

A homossexualidade está diretamente associada ao feminino, e é esse o grande motivador para o termo ser tão pejorativo: Um homem nascido com a dádiva de um pênis, jamais deveria desonrá-lo! “Tornar-se” gay é acima de qualquer coisa abandonar a masculinidade tão valorizada em nossa sociedade, é deixar o papel de macho um pouco de lado.

A masculinidade é intocável (embora muitos gays sejam másculos).

A homofobia na verdade é uma vertente do machismo, prova disso que a lesbiandade é aceita nas relações heterossexuais com muita naturalidade, nos filmes pornôs heterossexuais é quase cena obrigatória. Muitos homens enxergam como fetiche duas mulheres fazendo sexo, mas o oposto não é aceito. Basta uma única suspeita recair sobre um rapaz acerca de sua orientação sexual que já é motivo para as moças não o namorarem, e é exatamente por isso que a bissexualidade é tão escondida e camuflada. (em minha modesta opinião a bissexualidade é tão presente na sociedade quanto o feijão e o arroz).

Mas vamos aos fatos:

A professora errou, é claro, uma vez que ela como educadora ainda tem poder de formação de opinião e controle da sala. No decorrer de minha vida acadêmica já presenciei deslizes desse profissional que poderia destruir a vida de alguém. Não faz muito tempo, ouvi um professor ao ler a chamada e se deparar com um nome diferente, questionar: “Os pais dessa menina tinha merda na cabeça na hora de escolher esse nome?”. Coisas desse tipo são comuns, mas piadas com relação à homossexualidade são diárias!

Mesmo errando, acredito que esse profissional não detém toda a culpa, pois é clara a falta de preparo para lidar com as diversidades dentro da sala de aula, é notório o despreparo. Se fossemos culpar alguém sobraria para muitos uma fatia desse bolo.

A mãe que “amaria” o filho em qualquer condição defendeu a masculinidade do menino, ao fim da reportagem, dizendo: “Ele até já tem namoradinhas”. Uma clara afirmação machista, uma vez que homens podem, e devem, ter namoradinhas, no plural. O pegador.

E por fim, os colegas aproveitaram a imaturidade do menino que não conseguiu lidar com a situação para constrangê-lo ainda mais, típica manobra de transferir a atenção. Grupos são formados pelas semelhanças, mas as pessoas são diferentes entre si, para se manter em um grupo é preciso que as semelhanças sejam evidenciadas e isso ocorre quando alguém surge com uma diferença muito clara e diante esse fenômeno os membros do grupo se juntam para excluir o “diferente”, em uma reação que sugere: quanto mais diferente for alguém do restante do grupo, mais semelhante são os que sobram.

A sociedade se compõe dessa forma e creio que as mudanças são lentas e demoradas para esperamos outros resultados.

O rapaz sofreu Bullyng, e também homofobia, mas a minha reflexão é sobre a raiz do problema: o machismo, ele é a fonte de todo preconceito e discriminação.

A superioridade masculina imposta é o que causa tanto dano as pessoas. É comum ouvir frases como “vira homem” “que menino delicado”, como se o oposto ao homem (mulher) fosse algo ruim ou ainda como se a delicadeza não fosse virtude.

Precisamos combater a homofobia, isso é fato, mas ao combatermos o machismo a homofobia deixa de existir naturalmente.

Episódios como esse servem para nos apresentar um quadro da realidade da educação, não podemos esquecer que estamos formando cidadãos, pessoas que irão compor todos os cargos e papeis sociais existentes, eles serão o futuro e passarão para frente o conceito de certo e errado que adquiriram na infância.

Se eu fosse comparado hoje com o Felix, daria risada, mas aos 11 anos… Lembro-me da minha época de escola, um pouco mais novo do que esse rapaz, em uma festa de aniversário, onde o aniversariante não desejava minha presença, tomei um chute no peito e fui chamado de “viadinho”, naquela época minha atitude foi muito semelhante à desse menino, mas eu nunca contei em casa, chorei escondido e guardei calado.

Aprendi muito cedo que era melhor calar, porque o oposto seria apanhar, somente no colegial, após ter sido chamado por diversos xingamentos, é que aprendi a lidar com a situação e me defender.

O Jean Wyllys diz algo muito interessante, ele diz que uma criança negra quando sofre preconceito ela volta para casa e é acolhida pelos semelhantes e recebe todo apoio moral, mas quando uma criança homossexual é agredida, muitas vezes ela volta para um lar que não a compreende ou com o agravante de novas agressões dentro de casa.

A escola pode ser um lugar muito cruel, a família pode ser um porto nada seguro e para piorar a sociedade pode rir na sua cara.

Evandro Mangueira, Nascido em 1979 na cidade de Cajazeiras, que tem por título “A cidade que ensinou a Paraíba a ler.” Atualmente mora em Piracicaba-SP, cidade que adotou como sendo sua também. Tem por formação Gestão Financeira, mas encontra-se nas letras tanto quanto se encontra nos números.

Autor do livro: Arcanjo Gabriel

 evandro café