Coluna do Evandro: O Sacrossanto Tráfego.

Posted on 11 de novembro de 2013 por

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transito

“E se acabou no chão feito um pacote flácido

Agonizou no meio do passeio público

Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”

Chico Buarque – Construção

 

A sétima parada LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis), ocorreu no domingo, dia 10/11/2013 e durante toda a semana fora possível ler, em blogs e em jornais, notícias e comentários sobre as ruas interditadas e quais os “prejuízos” para população. Todo movimento social, popular e de rua tem como objetivo visibilidade, não há sentido trabalhar sem demonstrar resultados para a população.

Fui voluntário por muitos anos na ONG CASVI (Centro de Apoio e Solidariedade à Vida) e vi as conquistas, de perto, no que tange a população LGBTT no momento em que a primeira, e conseguintemente as demais, paradas foram às ruas, é de suma importância para qualquer movimento “atrapalhar o tráfego”, isso porque traz para o movimento legitimidade e para a população uma prestação de contas de quem somos e o que queremos.

Não existe luta sem perdas, algumas bem valiosas é verdade, tem gente que dá a vida em prol de lutas! Toda luta requer algum tipo de prejuízo e quando vamos às ruas, causamos interferência a terceiros (paramos o trânsito, intervimos no silêncio, na rotina, na programação da TV, no cenário urbano, etc.), e recebemos como reações tanto resultados positivos como negativos.

Além da interferência urbana/social, temos o conflito: As pessoas preferem ignorar alguns problemas sociais a discuti-los, ou será que ninguém nunca desviou de um mendigo na calçada sem sequer olhar para ele? Ou será que nunca fechamos o vidro dos nossos carros ao percebermos um pedinte? Essa sempre é a solução mais fácil, desde criança, cobrimos o rosto para não vermos o Bicho Papão.

Quando um movimento social vai às ruas ele interfere no que há de mais importante: Na indiferença das pessoas! O assunto vira pauta, mesmo que a força, mesmo que pessoas sejam contra a sua existência de tal movimento social.

Entre todas as críticas, a mais comum são as intervenções nas vias de tráfego.

E daí vem à pergunta que não quer calar: Aonde vamos com tanta pressa?

Semanas atrás, ao atravessar na faixa de pedestre (o semáforo no vermelho) em frente à Motocana, uma mulher passou tão rápida e com tanta velocidade que eu senti minha alma sendo roubada pelo atrito do vento. Por um segundo achei que tinha sido atropelado!

Esse referido semáforo tem seis segundos de tempo no vermelho, e por alguma razão essa senhora achou que perder seis segundos do seu tempo valeria colocar a vida de um pedestre em risco. Não morri, é claro, quem lhes escreve não é um espírito, mas esse tipo de morte ocorre todos os dias, todas as horas.

A interferência no movimento linear do trânsito é considerada um sacrilégio, uma aberração!

Estamos falando de vidas, estamos falando de lutas por igualdades sociais, estamos falando de visibilidades de causas, por que o trânsito é algo que precisamos poupar?

Creio que o Sacrossanto trânsito deve ser respeitado, mas a vida ainda vale mais do que o tempo de quem espera. Aqui cabe o questionamento: Aonde queremos chegar com tanta pressa? Aonde chegaremos com tanta urgência?

Não sei vocês, mas nunca entendi porque os ponteiros dos velocímetros chegam a 300 Km/h se nos centros urbanos não podemos ultrapassar os 80 km/h.

Evandro Mangueira é escritor e autor do livro Arcanjo Gabriel