De todas as datas históricas, às vezes nos esquecemos dessa. Por Gabriela Feliciano

Posted on 28 de novembro de 2013 por

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Mês da Consciência Negra

(Neste Blog tenho o prazer e a honra de publicar textos excelentes de outras pessoas. Mas o que me enche de orgulho é publicar textos de jovens estudantes, como este, de Gabriela Feliciano. Gabriela prepara-se para cursar medicina e, se depender de sua sensibilidade e lucidez, será uma médica maravilhosa. Amstalden)

Vamos falar sobre consciência negra. Em primeiro lugar, os assuntos recorrentes nas redes sociais me chamaram atenção para o descaso das pessoas. No dia das crianças, várias fotos de crianças e desenhos animados. No dia da Nossa Senhora de Aparecida, várias mensagens de “Que a Nossa Senhora esteja com você!”. Na virada de ano, várias mensagens de positividade. No dia dos namorados, várias fotos de buquês de flores e ursinhos de pelúcia. No dia da consciência negra, quase nada. Em segundo lugar, vamos apelar para o bom e velho dicionário. De acordo com o “Dicionário Aurélio online”, um dos significados de “Consciência” é “A percepção mais ou menos clara dos fenômenos que nos informam a respeito da nossa própria existência”. Logo, podemos dizer que “Consciência negra” diz respeito ao reconhecimento dos fenômenos e das implicações que levam uma pessoa a se entender como negro. E se entender como negro não tem nada a ver com se encaixar naqueles padrões clichês: o jogador de futebol, o lutador de boxe, o cantor, o dançarino de break dance, o sambista, o boêmio, o trabalhador braçal, o favelado, o presidiário. Se entender como negro é entender porque esses padrões ainda existem, valorizar a cultura negra, sentir orgulho da raça, cobrar a plenitude dos direitos e buscar incessantemente a “utópica” justiça social.

Por mais que o ideal seja que os seres humanos se reconheçam como iguais, a democracia racial não existe. Um homem e uma mulher negra no Brasil não são apenas pessoas, são pessoas negras; a raça é sempre um pré-requisito, um cartão de visita. Um jovem negro que concorre com um jovem branco pra um bom emprego não é contratado, mesmo que seja mais qualificado. Ou seja, as relações sociais são imersas num preconceito disfarçado que marca o negro como um ferro quente. Embora a escravidão tenha acabado há mais de um século, ainda sentimos o açoite e as correntes, e é com lágrimas nos olhos que admito isso.

Muitas pessoas acham que o racismo não persiste, ou por pura ingenuidade, ou por falta de percepção e experiência de vida, ou por se negarem a enxergar o óbvio. Porém, ele se manifesta através de várias formas: Um negro que acha que não deve estudar porque se considera menos capaz que os brancos e porque seu destino é ser pobre e marginalizado como todos os seus familiares sempre foram e são; Um grupo de pessoas que muda de calçada por medo de ser assaltado pelo negro que vem vindo; Um policial que revista e surra o menino negro que passa por um bairro nobre; Uma mulher negra que é abandonada grávida pelo namorado, pois ele não pode assumir compromisso com uma negra; Uma criança negra que é alvo de piadas na escola porque tem cabelo “ruim”. O racismo se manifesta também através do Estado brasileiro, o qual sempre foi omisso e condizente com as disparidades entre negros e brancos. O racismo se manifesta através de você, leitor que acha que tudo o que eu disse até agora é exagero e vitimização.

O dia da consciência negra deve ser lembrado e celebrado por toda a população brasileira, não apenas pelos negros, pois o sucesso de um ideal depende de amplo apoio. O dia de hoje representa a máxima expressão de um sentimento que eu compartilho todos os dias com o mundo: a alegria de ser quem eu sou, uma mulher negra brasileira que “Possui a estranha mania/ De ter fé na vida”, como compôs Milton Nascimento em “Maria, Maria”.

Salve, salve, negros de todo o Brasil!

Gabriela Feliciano é estudante.