Coluna da Carla: Universo Incomensurável – parte I – Os contadores de histórias

Posted on 10 de dezembro de 2013 por

5



carla 3

Eu iria escrever sobre o Natal… mas, senti profunda melancolia e fui me enrolando, me enredando em auto-desculpas…. embora, o prisma sobre o qual eu pretendia abordar este tema me pareça de extrema importância, confesso que não estou dando conta do sentimento que me invade!

Última semana de novembro e aflita por ainda não ter redigido minha coluna, decidi escolher outro assunto, ufa!, que alívio!!

Quando era pequena, como quase todo mundo, eu tinha duas avós. Uma, excelente cozinheira, amor de minha vida, cuja dificuldade em abraçar, apertar, beijar me levou a uma estratégia: quando minha avozinha sentava para assistir TV: “Vó, tem piolho na minha cabeça” E eu ajoelhava-me a seus pés, deitava a cabeça em seu colo e ela fingia que matava imaginários insetos; assim, eu recebia carícias e cafunés. Até a idade adulta me vali deste artifício, na verdade, até ela adoecer e ser eu a procurar piolhos em sua cabeça grisalha, de ralos cabelos, que sequer me reconhecia… Doce lembrança! Quanto amor havia nesta mulher forte e mandona, quanto amor sentia por ela, os quais só fui perceber após sua partida para o plano espiritual.

A outra, havia sido costureira e após ser abandonada pelo marido, criou seis filhos balançando os pés no pedal da máquina de costura. Naqueles tempos de escassos brinquedos e raras novidades, eu era uma das únicas a ter belíssimas roupas de boneca, feitas por esta minha avó. Eu e a primaiada, claro! Para minha avozinha, o faz-de-conta era realidade e me admiro, hoje, de sua capacidade em viver e criar fantasias junto conosco, suas netas. Areia = comidinha; sofá virado e revirado + lençol = cabaninha; pedras e pedaços de tijolos = fogão; folhinhas = tempero; lençol = fantasma e tantas outras fórmulas para o brincar e o imaginar! Como ela conseguia essa façanha de brincar igualzinho a uma criança! Adorava contar histórias e depois, nós vivíamos as narrativas. Note bem: nós não interpretávamos, nem fingíamos, vivíamos as histórias e dávamos continuidade a elas, conforme a brincadeira ia se desenrolando.

Em 2010, já há muitos anos afastada do convívio de minhas avós, que por ora cozinham, costuram e contam histórias para os espíritos nos céus, fiz o curso de formação de contadores de histórias, ministrado pela famosa contadora Carmelina de Toledo Piza em parceria com a arteterapeuta Ana Chris Martins. Meio século de existência, 15 anos atuando como evangelizadora em algumas Casas Espíritas, sendo elogiada pelo meu prazer em contar as mais diversas histórias e não apenas as parábolas de Cristo, estimulada por uma amiga (Obrigada, Rosa Parisi, quantos agradecimentos lhe devo!) me inscrevi no curso acima mencionado. E descobri a contadora de histórias em mim! E redescobri minha avozinha, que ressuscita e me acompanha em cada história que conto!

Trilhando o caminho do aperfeiçoamento, quantas pessoas conheci! De tantos cursos e encontros participei, mas deixando de lado a teoria e a reflexão neste momento, nesta época tão próxima ao Natal, eu ousarei falar de sentimentos, de paisagem, de áurea. Do Universo Incomensurável.

Se não estiver equivocada foi a este Universo que Giuliano se referiu na mesa do I Encontro de Contadores de Histórias de São Paulo. Mundo que foge ao pensamento racional, cartesiano, mas pertence à lógica, sim, como não? (Ainda escreverei mais sobre este Universo e sua intrínseca e peculiar lógica). 

Nele residem as nuances, as andanças, os sabores das histórias e seus narradores. Vizinhos à generosidade, ao companheirismo, à coragem, à valentia, aos perfumes, aos aromas, à amizade, à criatividade, à alegria, ao bom-humor. Passeando, encontrei partilha e compartilhamento, elogios, entusiasmo! Pássaros cantam, borboletas voam pelos ares e estômagos, não há frio nem quente nem morno que não brote das peles e dos pelos.

Moram os artistas das histórias também no mundo real e humanos que somos (ouso me incluir) perecemos dos defeitos de nossa espécie, mas –neste aqui e agora- converso sobre outras faces mais profundas que em cima/em baixo/ao lado e que dizem respeito às narrativas que curam, que encantam, que revolucionam, que embelezam e que nos transformam em seres melhores do que somos. Que revelam alguém que canta ao santo e afirma: “Licença, pois não estamos sós”. Estamos povoados. 

Neste Universo Incomensurável dos narradores orais, que se traduziu por poucos dias no I Encontro de Contadores de Histórias de São Paulo nos vi mais angelicais humanos do que apressados-cotidianos humanos que costumamos ser. Na atmosfera do Encontro incomensuráveis sentimentos e sensações, braços invisíveis que nos envolvem, nos acolhem e nos levam a viajar pelo melhor dos mundos, pela centelha divina que nos pertence e da qual fazemos parte. Sim, somos, puramente somos, ALEGRIA e AMOR!

 

Enfim, não deixa de ser uma mensagem de Natal, sobre o CRISTO que nos habita!

 
 

Nascida com o nome Carla Ramos Bettarello, adota o Betta e assume-se como Carla Betta, pela invenção de um amigo. Mais tarde, descobre que seu pai era conhecido assim em seu tempo de faculdade. Mãe coruja assumida de um casal maravilhoso e lindo de filhos. Conta e se encanta com as histórias: objeto de estudo e prática artística.

Posted in: Coluna da Carla