
Fonte da imagem: http://agazetadigital.blogspot.com.br/2012/12/o-nome-dos-filhos.html
No vidro do carro simples à minha frente, um adesivo daqueles que tem um desenho de bebê, avisa que “Mary Kelli” está a bordo. Tenho visto muito destes nomes atualmente. Deivids, Kathyllyns e, claro, muitos Maiquels e Dayannes e suas inúmeras variações ortográficas, todas nada brasileiras e na esmagadora maioria das vezes, erradas também na língua que se pretende ser a original do nome. Eu entendo que nomear um filho é sempre algo muito simbólico, muito subjetivo. Que às vezes significa uma homenagem a alguém que conhecemos ou à um artista, um atleta que apreciamos. Também entendo que em alguns casos os pais simplesmente gostam da sonoridade dos nomes que escolhem. Temos ainda o fato da globalização desigual, que inunda nossa televisão e nossas rádios com músicas, filmes e programas principalmente americanos, o que por sua vez serve de inspiração para o nome de muitas crianças. No fundo, também entendo e aceito que seja uma questão de gosto e minha apreciação não vem ao caso.
Porém, suspeito que além de todos os fatores que citei acima, existe também outro motivo pelo qual tantos nomes “exóticos” são dados aos filhos. Ocorre que a rigor, não somos muito de valorizar nosso próprio país e cultura e assim, aquilo que é nosso (excetuando talvez o desempenho no futebol e algumas belezas naturais) não é lá algo que impressione a nós mesmos enquanto um povo. E isto é uma característica que vem desde a época colonial, quando não podíamos mesmo ter outra auto-imagem uma vez que a metrópole fazia questão de sublinhar nossa “inferioridade” para manter seu domínio. Mesmo quando passamos a ser uma nação “independente”, continuamos sob a influência política e econômica européia, trocando o domínio direto português pelo domínio indireto da Inglaterra. Nestas condições, nos acostumamos a desprezar nossa própria condição de povo e a nossa cultura e daí a supervalorização do que é externo, estrangeiro, inclusive nos nomes e sobrenomes. Já ouvi muitas vezes, por exemplo, que meu sobrenome é “chique”. Mas, o que significa Amstalden? Nada além de “junto do Stalden”, que por sua vez é um lugarejo montanhoso na Suíça. Oras, se minha família fosse “chique”, não teria que ter migrado para o Brasil, mas teve que fazê-lo movido pela pobreza. E isto não nos faz diferentes dos pobres que aqui estavam, embora muita gente (inclusive alguns de minha própria família) pense que éramos algum tipo de nobreza. Claro que não éramos. Viemos e alguns prosperaram, outros nem tanto. Alguns são gente de caráter, outros, bem, nem tanto… Enfim, somos uma família como outra qualquer, com coisas boas e más. Assim não há porque valorizar um nome de origem estrangeira e desprezar outros, mais comuns no Brasil. Muito menos dar a seus filhos nomes estranhos em busca desta mesma distinção imaginária.
Minha análise, porém, não significa que sou um “nacionalista” e ufanista. Não acredito que o Brasil seja o melhor país do mundo ou superior a outros. O fato é que não acredito que nenhum povo ou país seja perfeito ou ideal. Tampouco acredito que um seja superior ao outro. Todos têm características boas e ruins ao mesmo tempo. Um povo pode ser mais rico, mais organizado e até mais eficiente, em alguns aspectos, do que outros, mas o paraíso não existe entre as nações desta Terra e, muitas vezes “boas características” como a riqueza, são obtidas às custas da exploração de outros povos e nações. Aliás, os organizados alemães cometeram as atrocidades do Holocausto de maneira muito ordenada. Os eficientes ingleses, moveram (dentre muitas outras) uma bem sucedida campanha militar para vender ópio para a China e os honestos americanos tomaram boa parte do território mexicano além de massacrar seus índios da mesma maneira que nós.
Na verdade, acredito que se há alguma coisa se muito positivo no ser humano em geral, é a capacidade de mudar, de se desenvolver não só economicamente, mas também eticamente e filosoficamente. E daí vem a questão. Se um país não é capaz de se valorizar minimamente, mas sempre se espelha no que lhe é externo, não vai encontrar seus próprios pontos positivos e desenvolvê-los. É uma postura que impede o equilíbrio e a visão clara de nós mesmos. A mudança, o equilíbrio e o desenvolvimento geral que cito, são possibilidades concretas e começam, creio eu, com atitudes pequenas, como perceber se o nome que estamos escolhendo para nossos filhos deve-se a um gosto real, uma homenagem ou a uma negação de nossa identidade.
Evandro Mangueira
18 de dezembro de 2013
Nunca entendi o porquê dos nomes americanizados, sejam em lojas, sejam em utensílios, sejam em pessoas (ou animais). Eu sou nacionalista, embora o Brasil tenha defeitos, é um país maravilhoso e é escrito com S. Defendo a mudança da língua e a reparação da sonoridade com a escrita, mas por hora, será com S, que amo o Brasil.
Celso Bisson
18 de dezembro de 2013
nomes que nos são outorgados (não temos opções de scolha), refletem um momento, uma homenagem a alguem, ou alguenS, como Joseane, ou mesmo a gostosa ignorância do casal que pode refletir um momento futebolístico (qts Neimares nascerão se o Brasil for campeão?), novelesco, político, etc. Até aí tudo bem. Ridículo é quando somos macacos imitamos estrangeirismos em nomes comerciais. Exemplo patético: 30% off de decontos”, (deveria ter guardado o anúncio). Nem bons imitadores de macaquitos somos…
Kaique Rossini
18 de dezembro de 2013
Boa tarde professor, não sei se já leu um texto do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro que está no livro “A inconstância da alma selvagem” chamado “o mármore e a murta”. Nele há uma perspectiva muito interessante acerca de como a cultura Tupinambá se relacionava com os portugueses, se pensarmos a formação da cultura brasileira a lá GIlberto Freire, com a participação de índios, negros e europeus. Fala de como os indigenas eram ensinados à rezar, a seguir os ensinamentos Jesuitas e com a mesma facilidade que aparentavem aderir àqueles simbolos, os abandonavam logo em seguida…. É um texto bastante profundo e este autor é um dos antropologos brasileiros mais reconhecidos da atualidade.
blogdoamstalden
18 de dezembro de 2013
Não li, Kaique, mas está anotado. Obrigado pela dica. abs.
Marcos Teruo Ouchi
18 de dezembro de 2013
Mas afinal, o que é nosso? Culturalmente falando, o que podemos chamar de “brasileiro” legítimo? Talvez a cultura indígena? Particularmente aprecio a “cultura universal” onde se me identifico com os valores do oriente médio posso assumi-los independentemente do posicionamento geográfico que escolho para viver. Ops, olha só, isso acontece no Brasil!
blogdoamstalden
18 de dezembro de 2013
Marcos. De fato vc. tem razão. O que é o Brasil? Um amálgama. E isto pode ser muito bom se nos valorizarmos mais. A cultura cresce, melhora em contato com outras e daí um aspecto da riqueza brasileira. Mas será que valorizamos mesmo isto ou criamos distinções externas e internas? Em relação aos nomes, temos uma variedade imensa de nomes de origem estrangeira. Vladimir, Tatiana, Talita (russos) Nádia, Soraya (árabes) e por aí vai. O problema é quando fica concentrado em uma cultura (EUA ou Europa) e grafado de forma a criar uma imagem de distinção, de sofisticação estrangeira (ex: Dayaneh quando poderia ser Diana…), então penso que há uma negação da cultura local e uma busca por uma valorização que teria uma distinção de importância com os nomes mais comuns, do tipo Maria, João, etc. Obrigado pelo seu comentário. Abs.
Marcos Teruo Ouchi
19 de dezembro de 2013
Sim, com certeza há essa concentração nos nomes americanizados mas isso encontra raízes mais profundas e é natural. Durante o poderio Romano houve também uma disseminação de nomes latinos. Porém, assim como ocorre com a língua, os nomes, que são componentes dela, sofrem mudanças ao longo do tempo. Mesmo os nomes ditos “brasileiros” como Sebastião são, na verdade, variações ou evoluções do nome “Sebastianus”, um nome romano antigo. Maria, tão comum e que tem origem européia, é uma variação do grego Μαρια que vem do hebreu מִרְיָם. Caso algum brasileiro der a seu filho o nome de JOSEPH estará na verdade seguindo seu raciocínio e retornando às verdadeiras origens do nome JOSÉ.
Eduardo Stella
18 de dezembro de 2013
Nossa conversa de sábado rendeu ein … 🙂
Ficou bom o artigo …
blogdoamstalden
18 de dezembro de 2013
É assim que eles nascem. Obrigado e abração.
Valéria Pisauro
18 de dezembro de 2013
Minha filha chama-se Angie, adoro essa música dos Rolling Stones…
Alexandre Diniz
19 de dezembro de 2013
O que aconteceu com o nome Virgulino? Ou Sebastião? Remetem ao nordeste brasileiro. Pessoas fortes, cabra-macho. Guereiros… esquecidos 😦
Outro dia conheci um vendedor chamado Heidegger. Porém ele não conhecia nada do filósofo. Aliás, creio que nem mesmo seus pais sabiam que Heidegger é o sobrenome de Martin.
Você já assistiu ao filme “O nome do bebê (Fr. 2013)”? Um dos personagens é criticado por colocar o nome do seu filho de Adolfo. Vale a discussão.
Carla Betta
22 de dezembro de 2013
Não sei… Penso que há mais mistérios ainda não desvendados; que esta é uma explicação simples demais para esta necessidade de não só nomear como grafar estranhamente… Passa pela não valorização do que é nacional, do parecer “chique”, mas… não é só isto.
Daiana
23 de dezembro de 2013
O meu nem teve influência, né? rs A minha sorte é que não tem uma grafia difícil como o exemplo colocado – Dayanne. Mas pouquíssimas pessoas me chamam de Daiana e sim de Daiane. Fica bem claro que essa questão de nome é muito influenciada mesmo por quem está na mídia. Hoje em dia, não se vê mais colocarem o nome de Daiana ou Daiane.
Algum tempo atrás escutei um advogado falando que a pessoa dos 18 aos 19 anos tem o direito de trocar de nome, caso este a prejudique. Acho que isso deveria ser amplamente divulgado. Com a história de se colocar nomes “americanizados” com grafias difíceis pode sim atrapalhar a vida de uma pessoa.
Povo Deslumbrado
27 de janeiro de 2014
Republicou isso em Povo Deslumbrado.