Vez em quanto vejo a avenida perto de casa tomada por jovens e adolescentes. Começa maneiro e vai engrossando a ponto de mudar o fluxo do trânsito. Motoqueiros empinam suas motos raspando a bunda no chão, talvez por ser mais pesada que o cérebro. Meninas soltando hormônios pelos poros exibem o corpo dentro de roupas mínimas. O som martela os ouvidos; copos e garrafas pelo chão.
Chega a polícia, e como pombos o bando é disperso para se juntar no mesmo ou noutro dia ou noutro lugar. Pela imprensa vejo acontecendo a mesma coisa noutros bairros e cidades. Em São Paulo, além do famigerado pancadão, ‘rolezinho’ nos shoppings é a onda. Combinados através das redes sociais os jovens correm pelas galerias apavorando consumidores e fazendo lojas baixarem as portas. Num desses eventos havia perto de seis mil. Nada é roubado ou depredado e ninguém é agredido; só zuação. Em dezembro passado foram quatro manifestações desse tipo. Como sempre, a polícia chega para coroar o evento; detêm alguns e botam os demais pra correr.
As letras agressivas do Rap e do funk tocadas a todo volume; corpos expostos, bebidas, drogas, porre, violência, arrastões, mortes no trânsito, gravidez precoce, aumento do número dos que nem estudam e nem trabalham… “Jovens que nasceram nas periferias nas duas últimas décadas estão bradando suas demandas políticas em porta-malas de carros financiados… Como diz o rap: “Se quer guerra, terá/Se quer paz, quero em dobro”. Quanto mais tentar silenciar esses meninos à força, ao invés de escutar o que têm dito, mais barulho eles vão fazer. Ainda há escolha”. (Gabriel de Santis Feltran, professor de sociologia da UFSCAR. Folha 23.12.13).
Juventude é tempo de desafios, aventura, riscos, descobertas, avanços e revezes. E o que temos para ela? A Escola, por exemplo – grosso modo falando – não a atrai porque é quadrada, parada no tempo, rodeada de grades e dirigida por gente caducada no tempo e no espaço; um de cada cinco, aliás, escolhida por políticos. Ali nada se cria tudo se copia. Que jovem aguenta ficar horas ‘parafusado’ na cadeira? O que conta agora é a classificação no ENEM, ENAD, IDESP, etc. Que fizeram dos laboratórios, das feiras de ciências, das aulas de música, do esporte, da arte e do desfio de passar de ano? Português e Matemática são prioridades, e mesmo assim o Brasil está na rabeira em relação a outros países. No 4º ano do meu tempo sabia mais que os do 9º de hoje, e minha mochila não pesava cinco quilos como as de agora.
Em vez de fiscalizar os excessos e punir exploradores, restringiram o direito e até proibiram o adolescente de trabalhar. Vendendo saúde e disposto a ganhar seu próprio dinheiro, sente-se parasita dos pais, que por sua vez não conseguem suprir suas necessidades. Para alguns o tráfico surge como alternativa até que a polícia – ela de novo – acabe com o barato ou sejam sugados pelo buraco negro do vício. Existem os cursos profissionalizantes. Porém, a maioria é programada para ajustar o jovem às necessidades das empresas e não para que descubra aptidões próprias e assim sinta prazer em trabalhar e se realize como ser humano. Por isso sobram vagas.
Cinema, teatro, festas, shows, dança, atividades esportivas, recreativas e sociais, nada disso é para eles. Nem mesmo à boa leitura têm acesso. Bibliotecas nem bancas de revistas há nos bairros. Neste país, livros são mais caros que cerveja, cigarro e droga. Uma pena, porque “Em mãos que carregam livros não cabem armas” (Gloria Ayres).
“Um jovem custa muito pouco, um pouco de muito amor”, dizia padre Zezinho. Eles são generosos, pacíficos, justos, leais, criativos e sonhadores por natureza. Se deles estão lotadas as cadeias é por culpa nossa, pois somos uma sociedade hipócrita e cruel.
“A juventude busca um coração que compreenda antes que uma luz que ilumina”. (João XXIII).
Antônio Carlos Danelon, o Totó, é Assistente Social. totodanelon@ig.com.br
Carla Betta
17 de janeiro de 2014
Belíssima reflexão!!!
terezinha
17 de janeiro de 2014
Concordo com você.Em Londrina acontece o mesmo.Total descontrole.
Valéria Pisauro
17 de janeiro de 2014
Que lindo! Adorei. Parabéns!
Marco
20 de janeiro de 2014
Vejo a juventude da paróquia em que estou perfeitamente emoldurada na sua reflexão. Me angustio ao ver os adolescentes no esquema do tráfico; sentados pelas ruas enrolando seus baseados; empinando suas motos com meninas na garupa com meio fio de roupa; outros chamando atenção pelo volume do funk no som de seus carros; outros ainda com o olhar perdido para o mundo e para a cidade. Toda nossa preocupação vai no sentido de prevenir esta moçada do perigo que correm quando se deixam de pensar por si mesmas. Facilmente são engolidas por quem apresenta um discurso convincente.
E na Missa, na Igreja a ausência deles porque essa coisa de Deus e fé, exige pensar e mudar o comportamento. Deixa isso para depois! Aí só a presença de pessoas (maioria mulheres) de meia idade a idade madura em que rezam para poder dar conta de suportar o sofrimento ao verem seus filhos e netos neste ambiente de “ostentação” e dos que estão atrás das grades. E como se não bastasse isso, rezam também para poder enfrentar seus maridos pendurados nos balcões dos bares, “enchendo a cara” , no único local, em que eles são fortes.
Como perguntou outro dia o Papa Francisco: ” O que está acontecendo com a humanidade?”
Totó
22 de janeiro de 2014
Carla, Terezinha, Valéria e Marcos. Obrigado por lerem e comentarem. Creio que estamos no fim de uma época. E os jovens estão dizendo isso. Tanto que nada do que prezamos lhes toca. Precisamos questionar nossos conceitos sobre Deus, família, religiosidade, dinheiro, amizade, tudo enfim. Uma nova época desponta. Cada geração que chega retoma valores fundamentais como justiça, fraternidade, igualdade, sinceridade, etc e outros novos para que a Humanidade evolua e melhore cada vez mais. Porém, grosso modo falando, a geração que está procura enquadrá-la de todas as formas porque se acomodou no seu modo de ver a vida. Abramos os ouvidos e nos deixemos invadir pela esperança. Uma força incrível nos impele para o bem.
Marlene
22 de janeiro de 2014
É isso Totó….precisamos nos reinventar…..