Enquanto eu anotava uma ou duas linhas no caderno, o professor lança a seguinte afirmativa:
“A Paraíba é um lugar lindo, cheio de gente hospitaleira, mas lá não existe mulher bonita.”
Só para constar, a pessoa da foto desse artigo é minha sobrinha Dayane Mangueira, assim como eu, nascida no sertão nordestino em uma cidade chamada Cajazeiras, localizada na Paraíba.
São muitas as mulheres bonitas daquela região, são muitas as mulheres guerreiras, são muitas as “muié masculina, sim sinhô!”
Para os paulistas, talvez sejamos todos retirantes, e retirante é aquele povo castigado pelo sol, de mãos calejadas e poucos dentes, é aquela gente que fala ôxente, é a emprega que serve o jantar, a lavadeira que engoma as calças, é o porteiro que recepciona o carteiro, é o frentista que abastece o carro, é a puta (se for muito jovem) que sacia o desejo, e somente esses.
Ah! Mas essa gente que fala ôxente é um povo valente, que luta contra o descaso dos governos, contra a seca que maltrata o solo e as vidas, contra a fome e a falta de estrutura. Somos castigados pelo sol, mas o sorriso permanece; Somos castigados pela fome, mas compartilhamos o que nos sobra; Somos esquecidos por um Estado, mas abraçamos a todos que nos visitam.
“Eitha” gente “trabaiadeira” é esse povo do Nordeste! Quantos tijolos foram assentados? Quantas casas têm o suor do Nordeste?
“Tá vendo aquele edifício, moço? Ajudei a levantar, pus a massa fiz cimento, ajudei a rebocar”, já cantava Zé Ramalho.
Mas, somos um povo de cabeça chata, de sotaque carregado, de pele queimada e bem longe dos padrões europeus de beleza, somos um povo que arranca toco e leva água na cabeça. Mas, definitivamente, somos um povo lindo, não só pela beleza que alguns expressam fisicamente como é o caso de minha sobrinha e de tantas outras pessoas (e mulheres), não só essa beleza, mas, a beleza de sorrir mesmo diante tanta fome e miséria, mesmo diante tanto descaso dos governantes.
Luiz Gonzaga que chama de princesa a mulher que arranca Pau-perreira, chama de bodoque a mulher que sendo sua princesa é também sua ferramenta, seu braço direito:
“Eita pau pereira que em princesa já roncou. Eita Paraíba muié, macho sim sinhô”
E Gonzaga que estava certo, pois a beleza sendo efêmera está fadada a acabar e o que sobra é a princesa que existe em cada mulher, mesmo sendo castigada pelo sol.
Em uma linda música, Maria Bethânia canta a história da mulher do sertão, que com a lata na cabeça não deixa de ser linda:
“Já se pode ver ao longe a senhora com a lata na cabeça, equilibrando a lata vesga mais do que o corpo dita, que faz o equilíbrio cego, a lata não mostra, o corpo que entorta pra lata ficar reta. Pra cada braço uma força, de força não geme uma nota.
A lata só cerca, não leva a água na estrada morta. E a força nunca seca pra vida que é tão pouca.”
É desse povo forte, é dessa gente brava, que nascem guerreiras e guerreiros, que lutam e sobrevivem em um país que não lhes respeitam, em uma nação que explora seu suor e sua miséria, valendo-se da desgraça e da fome. É essa gente sofrida e queimada do sol que constrói os impérios dessa nação! Podem nos chamar de cabeças chatas, nos acusarem de não sabermos as normas cultas, podem dizer que nosso sotaque é carregado, mas não ousem dizer que nossa gente é feia, se tem uma beleza nessa terra, encontra-se no olhar singelo, meigo e acolhedor de um povo que mesmo quando tem tão pouco a oferecer, não nega!
Maria Bethânia – A Força Que Não Seca
Luiz Gonzaga – Paraíba
Carla Betta
9 de junho de 2014
Vixiii!!! Preciso me conter para “não chutar o balde” (ou a lata d’água), porque me dá uma “réiva” dessa imposição de um padrão de beleza! UM??!! Por que UM?!! Se somos tantos, tão diversos, tantas etnias!! E em nosso páis, então?!! Tem alguma lógica eleger UM modelo com tantos moldes diferentes? Alemães, italianos, judeus, japoneses, índios, negros, nordestinos, nortistas, sulistas, centristas….!!! Affff!!!….
Observação: eita sobrinha linda, sô!!!
Evandro Mangueira
9 de junho de 2014
Também acho ela linda. As vezes o que ouço contra o povo Nordestino é tão injusto, mas tento não chutar a lata d’água.