Recentemente o Secretário de Desenvolvimento Econômico de uma grande cidade, deu entrevista falando sobre a revitalização e requalificação do centro de Campinas e, no bojo dessa entrevista, fez uma consideração muito feliz em que dizia algo do tipo “por que o programa Minha Casa, Minha Vida tem que ser na preferia, por que não no centro?”
Esse consideração é muito feliz porque vai de encontro a uma filosofia que eu, quando era Secretário de Habitação e Presidente da COHAB/ Campinas e o então Secretário de Planejamento de Campinas Ulysses Semeghini tentamos implantar: revitalização e requalificação do centro com uso de projetos habitacionais, porém entendo que o Projeto Minha Casa, Minha Vida, nos moldes atuais não seja o mais adequado.
Quando se fala do PMCMV ( Programa Minha Casa, Minha Vida) o que vem imediatamente é o projeto destinado a chamada faixa 1 da população, a mais carente do Brasil, que tem renda média familiar de até R$ 1.600,00. O faixa 2, por sua modelação, não me parece ser o que o secretário se referia, até porque seus projetos são originários da iniciativa privada.
Nesse ponto, para responder a pergunta do secretário, se faz necessário um esclarecimento sobreo funcionamento do PMCMV, de uma firma bem simplista: O governo federal, através da CAIXA ( operadora originária e mais antiga do PMCMV) e agora mais recentemente do Banco do Brasil, “paga” para as construtoras, em média, R$ 57.000,00 ( cinquenta e sete mil reais) por unidade habitacional de aproximadamente 40 metros quadrados ( sala, cozinha, banheiro e dois quartos) sendo que, nessa conta entra o valor do terreno e da infra estrutura interna.
Ou seja a soma do valor do terreno mais a infra estrutura interna dividido pelo numero de unidades tem que dar R$ 57.000,00.
Via de regra as empreiteras/construtoras afirmam que para a “conta fechar” é necessário um terreno a bom preço e uma quantidade mínima de unidades que compense a montagem de um canteiro de obras.
Quando eu era Secretária de Habitação se falava que o número mínimo de unidade para valer a pena era 700.
Aí surge o problema, terrenos grandes a preço baixo só se obtém nas periferias que, via de regra, já são locais com infraestrutura e equipamentos públicos deficientes.
O governo federal, tentou minorar o problema com a Portaria do Ministério das Cidades 168/13 que destinava um valor adicional para que as empresas de construção civil fizessem equipamentos públicos e infraestrutura adicional mas isso resolvia o problema apenas em parte: o dos municípios que não tinham verba para contrução, mas o problema do custeio desses equipamentos ( por ex: um posto de saúde depois de pronto, precisa ser equipado e tem um custo mensal com o funcionalismo que o opera).
O governo estadual, também tentou minorar o problema com o programa “Casa Paulista” que previa um aporte financeiro para “fechar as contas”, esse aporte ajudava a achar um terreno menos periférico e diminuir o número de unidades, mas também não chegou a fazer milagres.
A cidade de Campinas, apenas para que se tenha uma idéia, entregou seus três primeiros empreendimentos do PMCMV com uma média de 2.000 (duas mil unidades) cada um: são três pequenas cidades.
Daí porque esse empreendimentos são na periferia.
Em vista desse e de muitos outros problemas, surgiu a idéia de empreender unidades habitacionais populares no centro, mas não necessariamente PMCMV.
Os centros, entre as inúmeras vantagens, normalmente são áreas já estruturadas e com equipamentos públicos e mesmo que esse equipamentos não estejam localizados na área central a malha de transporte público normalmente é bem servida, o que compensa uma eventual distância.
Além da questão da infra estrutura, já que se mencionou transporte, tem a questão da mobilidade urbana: o centro oferece muitas possibilidades de emprego durante o dia, sem a necessidade de deslocamento para que lá morasse.
Também evitaria que muitas pessoas tivessem que se deslocar de sua casa para o centro e, de uma rodoviária central ao seu emprego aliviando a malha urbana.
A circulação das pessoas durante as vinte e quatro horas do dia no centro e sua convivência ajudam na questão de segurança e conservação.
Ocorre, porém, que o centro – por já estar estruturado não contempla grandes áreas que permitam uma grande produção habitacional, grandes canteiros de obras e grandes vazios urbanos com terrenos baratos, mas sim prédios abandonados, normalmente destinados à atividades estranhas a habitação ( normalmente comerciais) e terrenos pequenos.
Mesmo tendo uma modalidade de retrofit os valores por unidade habitacional do PMCMV se mostram insuficientes para adaptar a grande maioria dos prédios para o uso habitacional dentro da legislação moderna.
Sendo assim, um projeto habitacional que se adequado para os centros das grandes cidades, inclusive Campinas, teriam de passar por moldagens outras que não exatamente a do PMCMV.
O desafio é financeiro, os custos dos projetos habitacionais são altos e nem todos entes públicos conseguem fazer frente a eles.
A cidade de São Paulo, por exemplo, através da COHAB São Paulo, desenvolveu um programa extremamente simples e pontual: identificou prédios abandonados no centro, selecionou os que apresentavam as melhores condições de adaptação ao uso habitacional e vem, com recursos próprios reformando-os para atender ao habitação popular.
Adicionalmente, São Paulo terá de enfrentar um novo desafio que é a adequação, para padrões de habitabilidade, de prédios abandonados e com ocupações já consolidadas. Uma demanda que o Ministério Público vem exigindo das autoridades do executivo municipal.
Até a última notícia que tive, ao contrário do PMCMV que garante a propriedade ao beneficiário ao final de dez anos, o projeto da prefeitura de São Paulo estava mais ligado a um aluguel social.
O Governo do Estado de São Paulo, por sua vez, preferiu uma bem elaborada Operação Urbana, que vem sendo conduzida em sistema de parceria público-privada para revitalizar áreas muito maiores.
A cidade de Campinas, onde moro, precisa ainda formatar sua revitalização, mas de uma forma ou de outra, entendo que não seja possível – do ponto de vista urbanístico – qualquer tipo de plano de revitalização e requalificação do centro que não contemple moradias populares em seu bojo.
Ricardo Augusto Chiminazzo é Advogado e foi Secretário de Habitação de Campinas, além de presidente da COHAB daquela cidade.
Posted on 22 de julho de 2014 por blogdoamstalden
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