A cidade e os coqueiros. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 23 de julho de 2014 por

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árvores de piracicaba

A prefeitura de Piracicaba cortou várias árvores da cidade nos últimos meses, inclusive do Cemitério da Saudade e uma linda seringueira do Largo do Pescador. Segundo os responsáveis, as árvores estavam doentes e apresentavam risco de queda, o que poria a população em perigo. Pode ser. Eu não sou agrônomo nem biólogo e assim não posso opinar. Mas algumas coisas me entristecem em relação a estas derrubadas. Em primeiro lugar, por que as árvores estavam doentes? Não existe nenhum tipo de prevenção ou tratamento? Se existe, por que a prefeitura não os faz? Falta dinheiro ou prioridade? Quer me parecer que estas árvores simplesmente são ignoradas até que surja um problema. E daí a solução é simples, corta-se.

Em segundo lugar, me espanta o fato das árvores terem sido substituídas por coqueiros e palmeiras. De novo admito meu pouco conhecimento na área, mas parece-me que coqueiros não são exatamente a melhor opção para arborização urbana, salvo casos específicos, já que fazem pouca sombra e com poucas folhas e sem galhos, não dão abrigo a muitos pássaros. No largo do Pescador, por exemplo, toda a sombra da antiga seringueira será reposta como, se um coqueiro traz um diâmetro minúsculo de área de sombra? Ou será que a prefeitura nunca ouviu falar que árvores e matas urbanas reduzem a temperatura nas cidades? Se não ouviu falar, deveria, até porque a ESALQ já produziu pelo menos uma tese científica comprovando isto. E deveria ainda porque temos enfrentado alta nas temperaturas. O período de 2013/2014 foi um dos mais quentes da História, se não o mais quente. Claro que árvores somente não vão resolver este problema, mas são parte da solução. Será que alguém da prefeitura duvida ou tem outra proposta? Os coqueiros são a proposta? Se forem, penso que são uma proposta pobre, mais enquadrada na racionalidade da monocultura do que da diversidade biológica, tão necessária para um desenvolvimento sustentável.

Bem, talvez a prefeitura não tenha tido outras mudas para replantar, ou talvez ainda não tenha um plano de arborização e/ou preservação de árvores. Mas, se não tem uma nem outra, então como planeja ambientalmente a cidade? Aliás, planeja? Estamos agora com a vazão dos rios muito baixa, e o que foi feito antes desta estiagem para se evitar a falta de água? Será, ainda, que o poder público municipal não sabia que iríamos enfrentar déficit de água? De novo, se não sabia, demonstra um descaso perigoso para com a questão ambiental, além de uma enorme ignorância científica.

Diante do que tenho visto, nos últimos anos, em relação ao planejamento da cidade e as direções tomadas pelo poder público para o desenvolvimento, fico com a impressão de que a busca de um desenvolvimento sustentável é apenas uma propaganda política, tanto em Piracicaba quanto, talvez, em todo o Brasil. No fundo o que se busca ainda é o lucro rápido representado por modelos de desenvolvimento tradicionais, como a atração de montadoras de automóveis, desregulamentação de áreas urbanas e rurais preservadas e outras medidas que favorecem a especulação imobiliária. Este modelo, no entanto, não é sustentável e nem será. Ao contrário, ele beneficia poucos grupos por algum tempo, mas no final trará prejuízo para todos. Desenvolvimento sustentável ainda é uma busca, é fato, mas uma busca que parece não ter chegado a Piracicaba, pelo menos não da parte do poder público que privilegiou, como eu disse, o adensamento urbano, o uso de automóveis particulares, a construção de obras de custo duvidoso e as excelentes condições para empresas transnacionais se instalarem na cidade. Parece-me que, do ponto de vista da Prefeitura, coqueiros são maravilhosos: são baratos, não requerem poda e, caso doentes, mais fáceis de cortar. Coqueiros e palmeiras lembram-me desertos e terra ruim. Fiquei com a impressão de que, diante dos problemas e desafios ambientais modernos, a prefeitura opta por antecipar um futuro ruim, polvilhando a paisagem com coqueiros e palmeiras, numa antecipação de um grande deserto.

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