Vivemos em um tempo de mudanças. O novo é cool, mas fica com sabor de coisa velha no dia seguinte, como pão francês. O mercado fonográfico, em especial do gênero pop, se tornou um terreno imprevisível. A ordem é fazer uso do elemento surpresa, porém dentro dessa imprevisibilidade, uns prosperam, outros fracassam.
Miley Cyrus é um exemplo disso. Quem não se chocou ao ver a princesinha do pop retomar a carreira musical após um hiato de três anos, com sua língua de fora e o famigerado twerk? Como fizera Madonna nos anos 80, Miley fez uso das polêmicas como meio para se promover. Essa inspiração da cantora se evidencia pelas semelhanças de seu visual com o da Rainha do Pop em seu início de carreira – comparem, também, a arte de capa do álbum “Bangerz” com a do primeiro disco de Madonna. Não foi por acaso que as dividiram o mesmo palco recentemente, em um show acústico. Elas têm muitos pontos em comum, e o principal é a capacidade de se reinventar.
Christina Aguilera não teve a mesma sorte em seu retorno com o álbum Lotus. Com um repertório metade lírico e metade eletrônico, não fica difícil imaginar por que o público não se identificou com sua nova fase, e sobraram críticas ao estilo gagaísta com que a diva se apresentou no vídeo de “Not Myself Tonight”, além de a mídia não poupá-la a respeito dos quilinhos a mais. Essa ditadura do corpo perfeito soa meio ultrapassada, num mercado que consagrou grandes vozes como Adele, que com seu timbre poderoso abafou as vozes de quem ousou mencioná-la como uma mulher fora dos padrões.
A lista de artistas pop que tentaram se reinventar é extensa, e os resultados nem sempre são fáceis de compreender. Britney Spears retornou com o que, segundo ela própria, seria um álbum mais pessoal. O que se viu, no entanto, foi uma sonoridade eletrônica, com vocais quase irreconhecíveis modificados por autotune, graças à produção questionável de Will.i.am. Ariana Grande teve mais sorte em seu segundo álbum, e apostou na receita pop do momento: arranjos orgânicos, tempero r&b e parcerias. Deu certo em “Problem” e “Bang Bang”. Já Nicki Minaj surpreendeu após anunciar que abandonaria o visual espalhafatoso e cor-de-rosa, para iniciar sua nova fase fazendo uma ode a seu próprio corpo – em especial às nádegas. Lamentável que o lirismo de “Pills N Potions” tenha sido um alarme falso.
O que vemos são cantoras que deixaram sua marca na música pop, mas que, ao tentar inovar para se manterem em evidência, acabaram por anular a própria identidade. Deu certo – por enquanto – para poucas como Nicki e Miley, mas a grande maioria não sobreviverá nesse mercado. E há uma artista que sabe disso como ninguém: Lady Gaga. Se um dia ela fora considerada a nova Rainha do Pop, hoje experimenta o sabor amargo do ostracismo, com shows de baixa vendagem e músicas de trabalho malsucedidas nas paradas. Ela foi vítima do próprio veneno: ao impor para si mesma a obrigação de se reinventar o tempo todo, e dar um significado a cada vídeo, roupa ou gesto, ela acabou por se perder no próprio conceito. O último álbum, “ARTPOP”, prometia ser extremamente conceitual mas, no fim, teve pouco de arte, e um fraco apelo para o agitado mercado pop.
Uma situação análoga acontece há tempos no cenário político do nosso país. Partidos e seus candidatos tentam se reinventar para chegar à vitória na corrida eleitoral. Assim como na música pop, a maioria deles se perdeu dos próprios ideais.
Já faz um tempo que o PT não é um Partido dos trabalhadores, embora tenha o carinho de divulgar indicadores que mascaram a real situação do desemprego no país. Bem ao contrário do que sugeria sua ideologia, sua forma de governar se baseia no assistencialismo, que torna o cidadão dependente do próprio poder público, através de suas famigeradas Bolsas.
O PSDB não defende a Social Democracia que sua sigla ostenta, visto que um dos fundamentos da democracia é assegurar ao povo o poder de influenciar nas decisões do governo, coisa que tal partido não demonstra. Basta recordarmos os ouvidos surdos do prefeito de Piracicaba e governador de São Paulo diante das vozes que gritavam nas ruas no ano passado. Foi com muito custo que nosso ilustres representantes se abriram a uma negociação.
Tomo como exemplo, também, o PMDB. O partido tem um histórico singular na política brasileira, mas nada restou da época em que ele realmente se engajava no Movimento Democrático. Lamentavelmente, o único movimento que vimos nas últimas décadas foi o das alianças: o partido já apoiou Fernando Henrique e Lula. O que demonstra que sua principal ideologia talvez seja o fisiologismo.
Como declarou um candidato ao governo paulista recentemente, temos um número muito grande de siglas no país, mas pouca ou quase nenhuma ideologia. Tanto nos partidos políticos – e seus filiados – quanto na música, falta personalidade. O curioso é que o Horário Político obrigatório na TV tem mais de ARTPOP que o disco de Lady Gaga. De Clark Crente a Battman (assim mesmo, com dois “t”), a corrida eleitoral se transformou num universo artístico e criativo. O imenso sucesso da língua de Miley Cyrus e das nádegas de Nicki Minaj, não me incomodam tanto quanto a vitória de um palhaço (ou mais) nas eleições.
A música pop vive em constantes mudanças, e com frequência vemos surgir novos nomes na liderança desse mercado. O mesmo deveria acontecer com a nossa política. Não está na hora de revermos os nossos conceitos, e darmos uma cara nova ao governo? Permitam-me o uso de uma expressão um tanto desgastada pelo tempo, mas seria uma boa ideia, nestas eleições, se todos nós resolvêssemos “trocar o disco”.
MAXX ZENDAG
Nascido em Piracicaba há trinta e um anos, amador na arte da escrita, artes gráficas e fotografia.
Autor do livro “A Águia Dos Ventos: O Leão Do Mirante”. Produziu a arte de cartazes para campanhas da Prefeitura de Piracicaba. Suas fotografias ganharam a exposição temática “É Uma Límgua Portugueza, Concertesa”, mostra paralela do Salão Internacional de Humor de Piracicaba em 2010. Selecionado para a edição de 2014 do Salão.
Site: http://maxxzendag.wix.com/portal
Blog: http://maxxzendag.tumblr.com
Facebook: www.facebook.com/maxxzendag
“É Uma Límgua Portugueza, Concertesa” no Facebook: www.facebook.com/limguaportugueza
fabiocasemiro
17 de setembro de 2014
Rapaz…. o texto que acabei de mandar aí pro Blog (coluna Crônicas de Telópoli) fala de música (rock)/política e trata do POP…..
Juro que não tinha lido seu texto…. Parece até uma resposta (e pode ser), mas não foi escrito com essa intenção!!!
Leia depois lá…. (acho que sai semana próxima)
Gostei do texto…. cultura pop e cultura política são mesmo assuntos siameses….
Mas discordo do que vc disse das bolsas. Não acho que são assistencialismo, não. Mas de qualquer modo, vc deve considerar que as Bolsas do gov federal (ainda que vc não concorde com a prática) são as grandes medidas que conferem ao governo do PT o título de “esquerda”.
A bolsa família e a campanha de combate à fome são programas que espelham claramente o posicionamento ideológico das pessoas de esquerda.
(poderíamos até fazer uma comparação com o lema leninista “Paz, Pão e Terra”)…
Parabéns pelo texto….
Abraços,
Fábio H.
Maxx Zendag
19 de setembro de 2014
Agradeço aos elogios, caro Fábio.
De fato, há um interessante paralelo entre cultura pop e política, e foi pensando assim que desenvolvi a ideia para essa coluna.
Já debati muitas vezes, nesse espaço, a questão do bolsa-família. Embora ela ajude a minimizar a problemática da pobreza, é inegável que seja um mecanismo para tornar o cidadão dependente do governo, além de ser uma eficiente máquina de propaganda eleitoral. Claro que realmente se trata de um programa típico de um partido de esquerda. Aí vem uma questão puramente pessoal: acredito que os extremos não sejam boas opções para o país, ou seja, tanto as ideologias de esquerda quanto às de direita têm pontos positivos e negativos. Acredito que uma via intermediária seja a solução, agregando parte das duas ideologias.
Estarei no aguardo da publicação de seu texto.
Um abraço!