Quem não se recorda do intempestivo, mas carismático, Enéas Carneiro (Prona). Quando disputou as eleições presidenciais em 1989, o matemático inventou um estilo de campanha. Com poucos segundos no Horário Eleitoral Gratuito, dizia muito, numa voz rouca quase ininteligível, e terminava com o que viria a se tornar um clássico do marketing político, “meu nome é Enéas”. De piada, em 1989, quatro anos mais tarde, Enéas surpreendeu, ficou à frente de políticos como os ex-governadores Leonel Brizola (PDT) e Orestes Quércia (PMDB).
Além de fenômeno midiático, Enéas também trouxe ao cenário político-eleitoral brasileiro o tipo de figura controversa. Ao mesmo tempo em que defendia a nacionalização do minério brasileiro – em contraposição à privatização da Vale do Rio Doce – era ferrenho opositor do aborto e do casamento entre pessoas de mesmo sexo. Não era fácil engolir o fundador do Prona (partido que, fundido ao PL, tornou-se o atual Partido da República, o PR), mas acontece que Enéas criou, depois da abertura democrática, uma política baseada em nicho de discurso.
O nicho de Enéas foi instaurado no Congresso Nacional, em 2002, quando, candidato a deputado federal, obteve 1,5 milhão de votos e, amparado no sistema de proporcionalidade de formação do legislativo brasileiro, levou com ele outros cinco deputados, formando uma bancada de seis parlamentares. Falecido em 2007, este acreano que chegou a sugerir a fabricação da bomba atômica e do aumento do efetivo militar deixou história (mais para o mal do que para o bem).
Mas qual o motivo de trazer à baila a memória de Enéas Carneiro? A partir deste histórico, é possível entender os limites destes nichos ideológicos, como, neste domingo (12), demonstrou ser a segunda manifestação, em menos de dois meses, pedindo o Impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) e, ainda muito evidente mesmo baseado em ilegalidade, a intervenção militar no País.
O aspecto mais evidente de que esta manifestação é voltada a um nicho político, e não se trata de algo substancialmente capaz de envolver a complexidade de diferenças e interesses brasileiros, está na louvação em torno do discurso fácil e estreito do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). O parlamentar carioca deita em berços esplendidos entre os extremistas. E, como o PSDB tem observado ser impossível assumir a frente desta movimentação, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso já sugere que o partido “se desligue” dos organizadores.
A tendência, demonstrada neste domingo (12), é de que o discurso perca força, primeiro, porque não tem qualidade política, nem tem direcionamento; e, em segundo lugar, no plano institucional, não passará de alguns “novos Enéas” que tentam captar pequenos grupelhos em torno de ideias dispersas e sem pé, nem cabeça. O tucanato já começa a perceber que não é o representante de quem vai nestas manifestações, embora a maioria tenha votado em Aécio Neves (PSDB). Está cada vez mais evidente, portanto, que o extremismo tem pernas curtas.
Pode ser doído aos manifestantes mais afoitos, mas o tal “fora-o-que-está-aí” não funciona, não cria debate político, a não ser um bando de aloprados (estes, sim!) repetindo palavras de ordem apenas em torno da figura da presidente, poupando o Congresso Nacional e a classe política em si, que deita e rola na aprovação de leis como a 4330, que libera a terceirização e derruba direitos trabalhistas. A brincadeira fascista chegou no limite neste domingo (12) e, agora, a tendência é tornar o que deve ser: apenas uma piada política que só uma dúzia acha graça.
Erich Vallim Vicente, 33, jornalista, editor-chefe de A Tribuna Piracicabana. Texto originalmente publicado em www.tribunatp.com.br.
graça ribeiro
16 de abril de 2015
Tava indo tudo bem, até chegar na PL 4330 e ESQUECER o ajuste fiscal que se faz somente a custa da classe trabalhadora. Conviver com aloprados faz parte do jogo democrático. Aguardo um pronunciamento da presidente Dilma, CONTRA a PL 4330, nos mesmos moldes da Maioridade Penal, e mais ainda, espero que a presidente Dilma vete integralmente a PL 4330, quando chegar para a sanção presidencial. Senão, desconfiarei muito desse atual discurso da esquerda, afinal, como bem lembrou o presidente da CUT, nem os militares ousaram mexer tão profundamente nas leis trabalhistas.
Anônimo
16 de abril de 2015
Graça, não esqueci o ajuste fiscal, apenas utilizei o PL 4330 como exemplo de que o Congresso Nacional tem, hoje, uma pauta que não leva em conta a complexidade da realidade brasileira. O meu objetivo foi demonstrar que estes discursos muito radicas, que não procuram criar convergência, têm pernas curtas. Eles fazem barulho, mas são incapazes de criar um caldo maior na atual conjuntura política. Obrigado pelo comentário. Abraço! (Ass.: Erich.)
Daisy Costa
16 de abril de 2015
Assm Seja, Erich! Fico perplexa ao ver mídias perdendo audiência, cujo ‘discurso’ ainda é forte entre os aloprados… Os jovens facebookianos/zapzap seguem páginas torpes, como ‘endireita brasil’, ‘revoltados on line’, ‘Álvaro Dias’, OCC entre outros… vejo com preocupação a falta de argumentos e o o discurso raso. Mídias e ‘pesquisas’ encomendadas ajudam no caldo fascista. Valeu por nos trazer um alento com sua reflexão, Erich.
Carla Betta
16 de abril de 2015
Que os deuses o ouçam! Que se extingam esses dinossauros: cabeça grande, cérebro ineficiente. Parece que pensa, mas não é bem assim. Saem rosnando e derrubando tudo, sem rumo e sem objetivo. Em um desses vídeos que circulam no facebook, uma senhora, indignada, perguntava em voz alta quem substituiria a Dilma em caso de impeachment e os manifestantes só sabiam xingar, aos berros; cercaram a senhora que precisou ser escoltada pela polícia para não ser atacada fisicamente e ela apenas repetia a sua pergunta…
Gleison
16 de abril de 2015
Preparem-se para ver o japinha e outros organizadores do evento concorrendo a cargos em eleições futuras. 2018 está mais próximo do que imaginam….
Anônimo
16 de abril de 2015
Sim, concordo contigo, Gleison. Mas é bom lembrar que uma pesquisa feita na manifestação de domingo (12) apontou que apenas 6% das pessoas que estavam na avenida Paulista foram lá levadas por estas organizações (MBL, Revoltados On-Line e Afins). Abraço!
Josias Arantes
16 de abril de 2015
Não adianta, nenhum jornalista, nem em 2015, vai fazer uma matéria que o médico, físico e matemático Dr. Enéas merece.
Anônimo
16 de abril de 2015
Josias, o meu objetivo, em citar o Dr. Enéas, foi para usá-lo como referência de discurso. A minha intenção não foi entrar no mérito das propostas do ex-deputado. Qual a visão que você tem sobre ele? Brinde-nos com uma aula sobre o assunto. Abraço!
Augusto Sousa
16 de abril de 2015
Há tempo se discute dois tipos de pensadores ou formadores de opinião, os autônomos e os autômatos.
Os autônomos são aqueles que recebem a informação, analisam, ponderam e formam suas próprias opiniões. Até as defendem com argumentos e posições embasadas e amparadas em suas convicções.
Já os autômatos recebem a opinião, em geral de quem acreditam ou creditam méritos, a as assumem. A partir desse momento em que assumem tais opiniões as defendem, as levam ao extremo da verdade absoluta e até criticam quem as contesta. Nesse sentido ou nesse contexto aparecem os chavões clássicos de uma esquerda inconsciente e “manifestativa”.
Agora quando os resultados dessa crença cega, desse automatismo sem crítica, aparecem, desclassificando as linhas de pensamento adotadas, se encontram desamparados, abandonados. Não podem aceitar que tudo não passou de uma ilusão, de um amor não correspondido. E tentam a todo custo reverter a realidade, empurrar a culpa a outros segmentos. E cada vez mais chavões clássicos vão aparecendo e nublando a realidade, que o mundo já encampou, mas ainda por aqui, há certa resistência a admitir.
Antonio Carlos- Totó
17 de abril de 2015
“Se a crise se instalar com a força que se espera e os mais pobres saírem às ruas, é possível que a turma deste domingo corra para seus apartamentos. E chame a polícia”. Luis Fernando Vianna. Folha 13.04.15.
Douglas Moreno
7 de novembro de 2017
“(mais para o mal do que para o bem)” ??????
O Dr. Enéas foi o maior presidente que o Brasil não teve! Perdoe-me, Enéas foi um gênio desprezado por um país de analfabetos políticos, que elegeram um presidente louco, semi-analfabeto. Sou um jovem de 22 anos, conheci o Dr. Enéas a pouco tempo, a cada vídeo que assisto do Enéas eu aprendo algo novo, aprendo a respeitar o próximo. Eu estava desmotivado para estudar e o Enéas reacendeu essa chama dentro de mim.
Sobre o legado do Dr. Enéas: A ex-mulher ressaltou que Enéas deixa um legado de honestidade, patriotismo e generosidade. “Além de uma inteligência limpa e um caráter inigualável.”
Sobre a outra questão, será mesmo que o tal ”Nicho político extremista” têm pernas curtas? Jair Bolsonaro já está tecnicamente empatado com o Lula na corrida presidencial para 2018. Sinto lhe informar, mas o senhor foi infeliz nesse artigo.
Para finalizar, deixo aqui um comentário de reflexão sobre o Dr. Enéas.
E pensar que esse grande homem, além desse conhecimento monstruoso (teórico e prático) sobre tudo que envolve a política e ética, era totalmente humilde. Esse é aquele tipo que faz falta mesmo, que luta contra a massa. Um Gênio que ao ser confrontado por lideres políticos, diretores de revistas, diretores de TV, na maioria das vezes todos juntos contra ele (e política nem era o maior conhecimento desse homem) deixava todos sem palavras….. calou com conhecimento quem achava que conhecia. Depois de tudo ainda existe pessoas que só reconhecem a face de um louco com barba com uma frase simples “Meu nome é Enéas” Precisamos mesmo questionar para onde estamos indo. (Rodrigo Octaviano)
Forte abraço.