O que é a intervenção militar no Rio de Janeiro? Perguntas e respostas. Por Luis Fernando Amstalden

Posted on 16 de fevereiro de 2018 por

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Hoje, dia 16 de fevereiro de 2018, Michel Temer decretou a intervenção militar no Estado do Rio de Janeiro.

Mas o que isso significa?

Que as forças armadas agora governam o Estado do Rio de Janeiro?

Veja abaixo algumas perguntas e respostas para esse fato.

1) É um golpe militar? Não, golpe é a quebra da constituição. Não foi o caso. Aliás, nem o termo  intervenção militar que está sendo usado nas redes sociais é correto. O termo correto é “intervenção federal”. Veja a diferença no vídeo abaixo.

2) A intervenção é legal? Resposta: sim, ela obedece a constituição, artigo 84, inciso X que dá ao presidente o direito de decretar esta intervenção.

3) O governador do rio está deposto? Resposta: Não, ele continua comandando o Estado em todas as esferas que NÃO estejam ligadas à Segurança Pública. Esta esfera é que está sob intervenção, sendo o interventor nomeado o Gal. Walter Souza Braga Netto. Este interventor deverá planejar e executar ações para resolver a crise de segurança no RJ, seja fazendo operações de busca, apreensão patrulhamento, captura de criminosos, revistas e coordenando o trabalho do Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Civil, Polícia Militar, Polícia Federal e demais órgãos ligados à segurança. Estas forças devem agora se remeter ao interventor, não ao governador. O interventor, por sua vez, não age só, mas responde diretamente ao presidente. 3) Já está em vigor? Sim, mas depende da aprovação do Congresso. Caso este se recuse a intervenção deve ser suspensa.

4) Os direitos constitucionais do cidadão estão suspensos? Não. Todos os direitos estão garantidos, mas, eventualmente o interventor pode determinar a proibição de manifestações, aglomerações públicas ou até restringir a circulação em determinadas áreas, mas isso tudo com aprovação do presidente, por tempo determinado e dependerá do plano de ação que o interventor organizar.

5) Haverá cerco e invasão de favelas? Podem haver ambas. Embora a invasão seja uma operação de alto risco e, se tudo for bem coordenado, deve ser algo muito pontual e planejado. (o que significa que se tem gente esperando que se metralhe a favela, estão enganados, o interventor não pode fazer isso)

6) A crise de segurança vai ser solucionada? Não, ela pode ser controlada por algum tempo e a segurança pode melhorar bastante em algumas áreas. Porém a crise no Rio é muito profunda, envolvendo a necessária reorganização de órgãos públicos, a criação de empregos, o combate a corrupção policial e inclusão social.

6) O crime organizado vai ser desmantelado? Não, o crime organizado tem esse nome porque é organizado. E se baseia em uma rentável indústria de tráfico de drogas, extorsão, venda de serviços clandestinos, como internet, TV a cabo, água e monopólio de gás além do controle territorial. Essa “indústria” gera fortunas que tem alto poder de corrupção, aquisição de armas e influência. E também acaba por ser a fonte de sustento direta e indireta de milhares de pessoas. As organizações criminosas podem até se enfraquecer ou recuar um pouco mas sem alternativas de geração de renda para a população com a criação de empregos, sem a presença do Estado fornecendo serviços básicos de saúde de qualidade, sem a real ocupação dos morros pelo Estado, que significa que o governo prover cidadãos e não o tráfico, o mais provável é que, quando a intervenção terminar, o problema volte a crescer. Ressalto, no entanto, que como as milícias que atuam no Rio são uma forma de crime organizado e tem grande presença dos policiais, a intervenção, em tese, teria meios de investigar e prender muitos destes membros, dado que pertencem aos órgãos que agora estão sob o controle do interventor. Seria um golpe grande contra parte do crime organizado, mas dependerá da vontade política e da coragem da intervenção.

7) Mas os chefes de outras facções não vão ser presos? Alguns sim, mas é provável que nesse mesmo momento muitas lideranças já tenham se mudado de local, inclusive de estado, já que a intervenção ainda não realizou grandes ações.

8) Mas o fluxo de armas e drogas não vai diminuir? Sim, isso se o controle das rotas for bem feito, o que requer não só barreiras, mas operações de inteligência. Mas repito que isso durante o período da intervenção e se depois outras medidas não forem tomadas, o fluxo de armas e drogas volta a crescer.

9) Vai haver aumento dos conflitos? A tendência é de que não. O crime organizado não é burro. Ele confronta de acordo com a situação e não confronta forças maiores. Desde 1992 quando forças armadas ocuparam a cidade na época do Rio 92 – grande congresso ambiental mundial – passando pelas Copa e pelas Olimpíadas, sabemos que os confrontos diminuem. Porém, dependendo das ações que  forem planejadas e e já que o tempo é relativamente longo (a intervenção deve durar a´te o final de dezembro) podem haver alguns conflitos mais intensos. Os conflitos ENTRE facções, por exemplo devem diminuir por enquanto.

10) A intervenção é boa ou ruim? Nem uma coisa nem outra. Não deveria ter chegado a esse ponto e pode sim, se não for bem feita, gerar grandes problemas. Mas também pode amenizar a situação ainda que por algum tempo, o que não é pouco, e abrir novos caminhos para a questão da segurança lá, mas esse último efeito somente se houver um esforço maior no sentido de solucionar a crise social.

Veja abaixo a íntegra do texto da intervenção federal e depois o vídeo em que explico a diferença entre golpe militar e intervenção.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso X, da Constituição,

DECRETA:

Art. 1º Fica decretada intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro até 31 de dezembro de 2018.

§ 1º A intervenção de que trata o caput se limita à área de segurança pública, conforme o disposto no Capítulo III do Título V da Constituição e no Título V da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.

§ 2º O objetivo da intervenção é pôr termo a grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de Janeiro.

Art. 2º Fica nomeado para o cargo de Interventor o General de Exército Walter Souza Braga Netto.

Parágrafo único. O cargo de Interventor é de natureza militar.

Art. 3º As atribuições do Interventor são aquelas previstas no art. 145 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro necessárias às ações de segurança pública, previstas no Título V da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.

§ 1º O Interventor fica subordinado ao Presidente da República e não está sujeito às normas estaduais que conflitarem com as medidas necessárias à execução da intervenção.

§ 2º O Interventor poderá requisitar, se necessário, os recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos do Estado do Rio de Janeiro afetos ao objeto e necessários à consecução do objetivo da intervenção.

§ 3º O Interventor poderá requisitar a quaisquer órgãos, civis e militares, da administração pública federal, os meios necessários para consecução do objetivo da intervenção.

§ 4º As atribuições previstas no art. 145 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro que não tiverem relação direta ou indireta com a segurança pública permanecerão sob a titularidade do Governador do Estado do Rio de Janeiro.

§ 5º O Interventor, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, exercerá o controle operacional de todos os órgãos estaduais de segurança pública previstos no art. 144 da Constituição e no Título V da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.

Art. 4º Poderão ser requisitados, durante o período da intervenção, os bens, serviços e servidores afetos às áreas da Secretaria de Estado de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado do Rio de Janeiro e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro, para emprego nas ações de segurança pública determinadas pelo Interventor.

Art. 5º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, de de 2018; 197º da Independência e 130º da República.