quando somos feitos reféns do comum, somos feitos pensar fora do comum…insustentabilidade da mediocridade impassível! Por Gyorgy Henyei Neto

Posted on 14 de agosto de 2012 por

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Estava ele, um jovem, esperando algo. Não que algo acontecesse, apenas esperando algo.
Um ônibus, uma carona, um conhecido pra acenar e mão e fingir estar feliz em vê-lo, um amigo pra conversar e ficar menos solitário naquela estação monótona e sombria, mesmo sendo três horas de uma tarde clara, quente e estranhamente calma.
Esperava enquanto outras pessoas esperavam ou se faziam esperar. Observava o movimento constante das formigas em forma de gente que saem dos trens e vão todos em filas desordenadas e desorientadas as vezes em direção ao ponto de ônibus e taxis. No mesmo lugar onde ele estava. e ele estava lá faz certo tempo já. por isso observava e já conseguia estabelecer um certo padrão nas pessoas: esta moça tem jeito de que vai pegar o ônibus para o centro, esse senhor vai pegar o taxi, aquela criança correndo está fugindo de sua mãe que está colocando as malas dentro do porta-malas. depois de um tempo acertava quase todas.
Como fazia calor. pensou nisso depois de mais um tempo de espera. fazia calor e nada de chegar quem ou o que ele espera. outro trem para na estação. e lá vai ele de novo impor seus métodos antropológicos para desvendar os movimentos linearmente confusos, constantemente incertos da massa de gente, cada um diferente do outro e ao mesmo tempo, assustadoramente idênticos a qualquer um.
São iguais a mim, pensou agora. são mesmo, em certa análise superficial e em certo meio ambiente. mas não agora. agora ele é o observador, ele é quem analisa e propoe que são diferentes dele. ou que ele é diferente deles. uma coisa é certa, ele é diferente pois ainda espera. E esperando, analisa. E analisando, constitui um processo de pensamento que sobrepõe uma formulação comum do que há em volta. Uma luz irrompe de algum lugar. Não está mais em lugar nenhum. Parecia mais uma luz das metáforas da lâmpada quando se tem uma idéia ou uma divagação digna de se gritar “eureka”! Podia ser, mas era o reflexo do sol amarelo, quase branco, ofuscante, que batia no retrovisor de uma moto. Uma moto que, por algum motivo havia parado. e por algum motivo, que seja o mesmo, o dono da moto lhe falou:
-Suba na moto.
-Como assim? eu estou esperando alguém. não preciso de carona.
-Suba na moto rápido. Está vendo o que está pra acontecer?
-Não, não estou vendo nada. O que está havendo?
-Não há tempo. Você está ainda no devaneio de uma produção fictícia formada por construções eletroneurais que fornecem estímulos falsos para seus sensores. Agora suba!
-Mas eu…
-Você verá, eu prometo. você já viu enquanto dormia. Você quase viu de novo hoje, logo antes de eu parar. Você viu mas não enxergou.
-O que eu vi?
-Se você acredita em alguma coisa que eu estou dizendo…não, se você acredita em alguma coisa que você viu em sonho, se você acha que aquilo que é o real, se você acha que existe mais entre o céu e a terra do que pode compreender sua vã filosofia…
-É Shakespeare.
-Pois ele viu. E acreditou. Agora se você também acredita, eu posso mostrar, mas sua crença deve vir antes.
-Quem é você?
-Você está esperando alguém, você estava analisando as pessoas, você chegou a cogitar sua diferença em relação a elas. Você quer compreender.
-Quero. mas…
-Você vai compreender. Agora suba!
Ele subiu e não disse mais uma palavra por um bom tempo. Era realmente diferente das outras pessoas. Ele analisava, cogitava, pensava, existia. A massa não. A massa passa, movimenta, cresce, diminui, mas a massa não tem um cérebro. Tem vários que são coagidos.
Saíram da estação. Ninguém reparou. Dois minutos depois outro trem parou.

Gyorgy Henyei Neto

Mestrando em Ciências da Religião – PUC-SP

gyorgyneto@gmail.com