Vae Victis*. Por Luis Fernando Amstalden

Major Marco Antônio Perez. Fonteinternet

O presidente do clube da aeronáutica, Marco Antônio Carballo Perez, declarou hoje, dia 28/03/19, em encontro de presidentes de clubes militares, que os protestos contra a comemoração pro ordenada por Bolsonaro pelo aniversário do golpe de 1964, é “mimimi”. E, dentre outras declarações dele e de seus colegas de outros clubes, ainda afirmou que: “Só nesse país é que os vencidos estão contando a História à 34 anos”, afirmando então que, ao contrário do que costuma acontecer, a História ser narrada pelos “vencedores” não ocorre no Brasil, já que eles, militares, é que “venceram” durante o período em que foram ditadores no.
Existem outros pontos execráveis tanto eticamente quanto historicamente na fala dele e de seus colegas. Mas, vou ater-me aqui aa questão de quem teria “vencido” no episódio da ditadura e o que significa, no final, o fato da história ser contada por vencedores.
Se o Sr Perez fosse um homem culto, o que não parece ser, saberia que a narração dos fatos e versões históricas feitas pelos vencedores, é algo combatido pelos historiadores desde o século XX. E isso exatamente porque a versão “vencedora” é geralmente incompleta, parcial ou francamente mentirosa, quando não as três coisas juntas. É por isso que desde o século XX até agora, os historiadores sérios e dignos de respeito acadêmico, procuram a verdade dos fatos nos indícios e/ou narrativas dos “vencidos”, sejam eles escravos, ovos dominados ou classes dominadas. Buscam o que um historiador sério e mesmo um estudante ou interessado em História sérios buscam: a maior proximidade da verdade que for possível.
Logo, se no Brasil a História da ditadura não está sendo contada pelos que se jugam vencedores, ótimo. Temos uma História mais séria e precisa, afinal.
E essa qualidade de nossos historiadores recentes demonstra outro fato que o Sr. Perez e seus “companheiros de pijamas”**, desconhecem ou negam: vocês não são os vencedores do processo de ditadura, são os perdedores…
Sim, vocês perderam…
Perderam porque embora tenham ficado trinta anos no poder ilegitimamente, estuprando a constituição, matando e torturando pessoas independente de seus atos ou culpas, ocultando sua própria corrupção e desatinos censurando a imprensa, vocês foram obrigados a entregar o poder aos civis. Foram obrigados dada a sua incompetência que deixou-nos uma dívida externa imensa, inflação e desigualdade social. É isso mesmo, vocês não entregaram o poder por benevolência ou porque quiseram a democracia, como disse o despreparado atualmente na presidência, vocês entregaram porque não podiam mais governar e gerir a situação que criaram, tanto em termos econômicos e sociais quanto em termos de anseio por liberdade por parte da população.
Entregaram também porque milhões de pessoas foram às ruas exigindo o poder. Claro, o fizeram com uma manobrinha de bastidores bastante suja, negando as eleições diretas e colocando dois ex-aliados no poder, Tancredo e Sarney, que os mantiveram impunes de seus crimes.
Ah, sim, no seu período o Brasil cresceu… Reconheço isso. Mas cresceu com dinheiro de dívidas que não pagaram. Cresceu com obras faraônicas cujos preços e possíveis desvios, jamais foram totalmente conhecidos. Cresceu mantendo a desigualdade, a dependência em relação a países centrais. Cresceu de forma insustentável e continuamos a ser o que éramos, um país sem cidadania e mantido por uma elite política e econômica perversa.
Então onde está a sua “vitória”? Apenas no sangue dos mortos e torturados? Na humilhação dos que foram calados e oprimidos?
Vocês perderam. Não mudaram o país e nem nos livraram do comunismo, como gostam de dizer, até porque João Goulart não era comunista e a URSS nunca iria tomar o partido de grupos de esquerda no Brasil, um território de influência americana dividida com os soviéticos desde o final da II guerra mundial.
Vocês perderam porque nenhum país sério, nenhum historiador sério, nenhuma obra acadêmica séria reconhece seu governo como não tendo sido outra coisa se não uma ditadura execrável. E vocês ficarão na história e na ciência como isso, como ditadores.
Sim, é verdade que muitas pessoas do povo ainda pensam que sua ditadura foi boa, ou até mesmo que não foi uma ditadura. Mas a opinião destes, que ainda são muitos, é geralmente calcada na ignorância e na falta de capacidade de reflexão que vocês cultivaram tão bem, com sua disciplina militar nas escolas.
E, de qualquer modo, a aprovação do gado que vai para o matadouro com disciplina, não é relevante, é triste.
Para encerrar, devo dizer que vocês perderam porque sua última tentativa de se auto-resgatarem vem através do governo de um capitão que vocês mesmos obrigaram a se reformar e que agora mostra sua total incompetência e desrespeito em um governo caótico.
Ele é sua expressão final de derrota.
Vae Victis… Ai dos vncidos que comemorarão sua própria derrota no domingo que vem…
* A expressão “vae victis” é atribuída ao chefe gaulês Breno que teria, ao derrotar os romanos, aumentado o valor do resgate em ouro exigido dos vencidos, atirando sua pesada espada na balança onde se pesava o metal precioso a ser-lhe pago pelos romanos. Significa também que o preço pago por quem perde será alto.
** General de pijamas é um termo que nomeia militares aposentados que,em casa, de pijamas, sem nada a fazer, insistem em dar seus palpites no comando das forças armadas ou, aqui pior, no governo.