Qual é o pente que te penteia?

Posted on 14 de abril de 2014 por

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Nega do cabelo duro, qual é o pente que te penteia? Qual é o pente que te penteia?

Composição: David Nasser / Rubens Soares

 

Em uma sociedade de cabelos esticados, existe algo que não é artificial?

Nem o nosso cheiro é nosso, tudo em nós é artificial. A cor do cabelo, o modelo da roupa, o comportamento! É tanta artificialidade que o natural passou a ser rejeitado por completo, as relações, também, tornaram-se artificiais.

Os homens vivem, hoje, uma realidade antes inerente as mulheres: os pêlos foram abolidos, os cabelos milimetricamente “bagunçados”, as roupas escolhidas de acordo com os adornos, o corpo escultural, enquanto as academias abarrotadas de gente.

 

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Uma obsessão pelo perfeito, pelo adquirido a base de sofrimento e dinheiro, acompanhado de uma rejeição das origens e de uma clara separação no reino entre os animais racionais e os demais seres.

A vaidade é sem dúvida o pecado mais existente na face da Terra, todos têm vaidade, seja pelo intelecto, pela capacidade de raciocínio ou pela beleza (natural ou adquirida). A forma playmobil de ser é uma regra criada por um mercado cruel, que enlata todos em um movimento obrigatório de perfeição e semelhança uns com os outros.

Mas qual é o pente que te penteia?

No artigo “periferia” (clique aqui para ler) ressalta que a cultura vem das periferias, favelas e comunidades pobres. Foi assim com as tatuagens, com os estilos de cabelos, roupas, estilo musical entre outros. A primeira vez que a palavra metrossexual apareceu na TV aberta, referia-se a um jogador de futebol que teve sua origem nas favelas, esse esporte é quase que totalmente voltado às comunidades mais pobres. Dos anos 90 para cá, cresceu, vertiginosamente, o número de homens metrossexuais, vaidosos e exigentes. Seriam as comunidades carentes mais vulneráveis? Ou seriam agentes transformadores? Duas perguntas sem respostas claras, mas o mercado descobriu o potencial dessas classes sociais, e os jovens de classes mais baixas passaram a consumir tanto quanto os seus créditos e salários podem pagar, tornando-se uma classe vaidosa. Uma cultura antes reservada às mulheres e que aos poucos os gays adotaram e por fim as periferias.

Esse movimento logo chegou a níveis globais, nos últimos anos tivemos como símbolo sexual personalidades com feições femininas, corpos desenhados em academias, cabelos sempre arrumados e roupas de marcas famosas,  como Justin Bieber (eleito em diversas revistas do ramo, como Billboard e Glam’Mag) provando a aceitação da nova geração pelo estilo que mais parece um cruzamento de um Bad boy com a boneca Suzi: sobrancelhas bem delineadas, e cuecas aparecendo.

As cuecas foram as ultimas a ganharem força, é claro que corpos definidos precisam ser expostos e sem o uso de camisetas, as cuecas ganharam marcas, ganharam preço agregado. Existem cuecas “populares” que custam 300 reais, e suas estampas no elástico são, talvez, a única marca possível de ser mostrada quando se anda quase nu.

Os pêlos caíram em desuso pela mesma razão, eles escondiam os músculos, mas em pouco tempo os magros estavam sem eles também.  A rede farmacêutica logo passou a vender produtos e acessórios para eliminá-los e centenas de clínicas de estética masculina são abertas todos os dias.

O que era um movimento solitário criou força e hoje é quase obrigatório. Em busca da vaidade e aceitação existem homens que criticam, severamente, outros homens que não se depilam.

A barba pode ser usada, desde que bem baixa e desenhada!

E quando menos se espera, lá estão os homens demorando de duas a três horas para se arrumarem antes de um evento qualquer, essa não era a principal crítica contra as mulheres?

Mas qual é mesmo o pente que te penteia?

Qual a razão de tudo isso? Mero modismo?

A artificialidade é uma resistência, quanto mais artificial mais é garantia de que se possuí dinheiro, de que se é diferente dos demais humanos e diferente também dos demais animais.

A ucraniana Valeria Lukyanova, conhecida como “mulher Barbie”, no início do mês declarou que a mistura racial tem deixado as pessoas mais feias e que por isso as pessoas procuram fazer cirurgias plásticas, que a culpa das pessoas nascerem cada vez mais feias era a miscigenação. Basta olhar quem é Valeria Lukyanova no Google para se dimensionar até aonde alguém chegaria por “perfeição” e vaidade, Michael Jackson até sem nariz ficou, essa ucraniana segue os passos do rei do pop.

A vaidade é perigosa porque escraviza. As mulheres, a custos colossais, deixam para um passado, uma vida regrada e cheia de obrigações ao passo que os homens adotam esse estilo de vida, escravidão por beleza e juventude. Não importa ser saudável, apenas importa parecer saudável. As academias estão repletas de homens “bombados” a base de muito hormônio, colocando em risco a própria vida, mas isso não importa, o que importa é parecer forte, saudável e jovem.

Aos poucos as mulheres perdem a vaidade escravicionista, e os homens agora que começaram por buscá-la.

É lenta a mudança no universo feminino, aos poucos vemos mulheres se libertando de certas amarras, mas a crescente no universo masculino traz para uma geração obrigações e deveres com a vaidade que está longe de atingir o pico para depois declinar.

Todos os fenômenos sociais crescem até atingir um máximo e depois o desgaste e necessidade de mudança levanta uma onda que transforma tudo, e passa a cair livremente.

O caminho que esse movimento toma é incerto e poderá ser passageiro, mas a vaidade vendida aos homens é a nova moda consumista. A demanda foi criada e agora se precisa manter a todo custo o aceleramento das vendas da beleza eterna e enlatada, para que a roda gigante de consumo mantenha-se em níveis frenéticos.

E aí é a pergunta inicial, qual é o pente que te penteia?

Quais as suas vontades, suas necessidades, seus prazeres?

Qual o pente que te penteia, quais as coisas que te agradam, quais os valores que te regem?

Até aonde chegaremos por vaidade.