Na década de 1950, grandes empresas anunciaram com orgulho a “revolução verde”. Um “pacote” de sementes, adubos, agrotóxicos e máquinas agrícolas que iria, segundo eles, mudar a agricultura e eliminar a fome no mundo. Com o aval e com financiamentos de governos dos países ricos, milhões de agricultores, principalmente em regiões mais pobres, migraram para a “nova agricultura” para “alimentar o mundo”. De fato a produção aumentou, mas, como mostraram inúmeros estudos e relatórios posteriores, outros problemas surgiram, tais como o envenenamento do meio ambiente, aumento da resistência de pragas, surgimento de outras espécies predadoras das plantas, contaminação humana e animal e concentração de renda nas mãos de grandes agricultores, com a expulsão de pequenos produtores, extinção de sementes nativas e o controle do patrimônio genético de produtos por grandes corporações, dentre outros. A fome continuou porque ela não é uma questão tecnológica apenas, e sim uma questão de como se distribui a produção. O lucro das empresas também aumentou e muito, e este parece não ter dito “efeitos colaterais”.
Com a tecnologia transgênica parece ocorrer um processo similar. Desde que a alteração da estrutura genética dos seres vivos se tornou possível, não faltam os que profetizam uma era de ouro, sem fome, com abundância de produtos e com remédios e outros gêneros baratos. Esta tem sido a principal argumentação utilizada para a liberação de produtos transgênicos, dos quais já consumimos milho, soja e outros. O problema é que, da mesma forma que as técnicas da revolução verde, as variedades transgênicas também podem ter efeitos “colaterais” bem complicados. Um dos principais, para não tomar espaço demais aqui, é o fato de que não sabemos o que pode ocorrer no meio ambiente a partir do momento em que se introduz genes alterados em laboratórios ou inseridos de um ser ao outro por meios artificiais. A vida levou milhões de anos para compor sua formação genética e isso através de um processo de seleção natural no qual os “erros”, os genes que não eram eficientes ou não se relacionavam adequadamente com o meio, foram eliminados. A tecnologia transgênica tem pouco mais de trinta anos e muitas espécies vegetais ou animais transgênicas, são estudadas a vinte, dez anos. É muito pouco para se avaliar a reação futura destes genes na natureza e em relação ao homem.
Estudos como o de Jeffrey Smith (Roleta Genética) demonstram que vegetais geneticamente alterados podem causar doenças e até superbactérias, capazes de resistir aos tratamentos agora disponíveis. Também não sabemos ainda todas as modificações que sementes, pólen e esporos alterados podem causar em espécies na natureza e no equilíbrio ecológico. Ou seja, a tecnologia transgênica, embora apregoada por muitos como revolucionária, tem efeitos que desconhecemos. E se desconhecemos podem ser bons, neutros ou muito ruins. Aí reside o problema. Se não temos segurança (e de fato penso que não temos) dos efeitos a longo prazo desta tecnologia, o que deveria ser aplicado é o chamado “princípio do acautelamento”: continuar a pesquisa mas não disseminar os novos genes. Para as empresas, no entanto, não é assim que funciona. Elas investiram por dez anos ou mais e precisam gerar lucro com os investimentos. O tempo do balanço contábil é um, mas o da natureza é outro. Dez anos de investimentos é muito tempo para uma corporação, mas pouco para a segurança do meio ambiente. Assim os estudos são considerados satisfatórios e os produtos liberados em acordos com o Estado. E nós consumimos os genes alterados.
Em Piracicaba, no próximo dia 30, mosquitos aedes aegypti transgênicos serão liberados experimentalmente para diminuir a população dos normais e combater a dengue. A tecnologia custará, no futuro, milhões de reais a serem pagos à empresa dona do mosquito. Estes milhões gastos podem até diminuir a infestação de dengue, mas os efeitos disso a longo prazo são, como eu disse, imprevisíveis. A questão parece não ter solução, mas tem. Em Santa Bárbara do Oeste, cidade vizinha à nossa, um sistema de armadilhas para monitoramento dos mosquitos na cidade e a tomada de medidas, diminuiu em 78,4% os casos de dengue na cidade. A técnica transgênica a ser aplicada aqui pode até melhorar este índice. Mas a que custos econômicos e ambientais? Qual técnica escolher? Se você for um cidadão contribuinte, a das armadilhas de monitoramento parece mais adequada. Mas se você pertencer à uma empresa de biotecnologia interessada em vender, os transgênicos são melhores…
Eloah Margoni
29 de abril de 2015
Perfeito, Amstalden! E todos os seus pertinentes comentários desaguam num mesmo ponto: a ciência nunca é neutra. Serve aos grandes lucros de alguns, em detrimento do meio ambiente e até da saúde pública que diz proteger. E os gestores são perfeitamente coniventes com tudo isso.
Renato Panhoca
30 de abril de 2015
Santa Bárbara exportando tecnologia!!!!
Evandro Mangueira
30 de abril de 2015
Estamos vivendo tempos sombrios meu caro amigo. Estão legislando para as grandes empresas, um retrocesso atrás do outro! Medo desse futuro, que sonhei ser mais igualitário e humano.